Ementa para citação:

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO PERCEBIDO POR FORÇA DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA POSTERIORMENTE REVOGADA. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO 1.401.560. APLICAÇÃO MODERADA DO ENTENDIMENTO FIRMADO NO STJ.

1. O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.401.560, efetuado em regime de recurso repetitivo, compreendeu possível a repetição de valores recebidos do erário no influxo dos efeitos de antecipação de tutela posteriormente revogada, em face da precariedade da decisão judicial que a justifica, ainda que se trate de verba alimentar e esteja caracterizada a boa-fé subjetiva. A desnecessidade de devolução de valores somente estaria autorizada no caso de recebimento com boa-fé objetiva, pela presunção de pagamento em caráter definitivo.

2. Recomendável a aplicação moderada do entendimento firmado no STJ, na medida em que a devolução indiscriminada de valores percebidos provisoriamente, sem um juízo de proporcionalidade, afetará o direito constitucional de ação e a própria credibilidade do Poder Judiciário, uma vez que não se teria mais a segurança jurídica legitimamente esperada das suas decisões.

3. A devolução de valores em face de antecipação de tutela posteriormente revogada só deve ser autorizada nas hipóteses em que ela for concedida durante a instrução processual, mas não for ratificada em sentença, por se mostrar razoável afastar a boa-fé objetiva do jurisdicionado, na medida em que os requisitos para a sua concessão foram analisados de forma precária.

4. Concedida em sentença ou em acórdão a antecipação dos efeitos da tutela, inviável a restituição, eis que o direito foi reconhecido em cognição exauriente, com exame das provas produzidas no processo, o que caracteriza a boa-fé objetiva do segurado.

5. Percepção de benefício previdenciário em razão de antecipação dos efeitos da tutela, posteriormente revogada em face da sentença de improcedência, já transitada em julgado, o que possibilita a repetição de valores.

(TRF4, APELREEX 5004803-13.2011.404.7111, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Osni Cardoso Filho, juntado aos autos em 07/01/2016)


INTEIRO TEOR

APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5004803-13.2011.4.04.7111/RS

RELATOR:JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
REL. ACÓRDÃO:Juiz Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE:CLEDIA KOENIG
ADVOGADO:LIA LUCIANA JOST
APELANTE:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
APELADO:OS MESMOS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO PERCEBIDO POR FORÇA DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA POSTERIORMENTE REVOGADA. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO 1.401.560. APLICAÇÃO MODERADA DO ENTENDIMENTO FIRMADO NO STJ.

1. O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.401.560, efetuado em regime de recurso repetitivo, compreendeu possível a repetição de valores recebidos do erário no influxo dos efeitos de antecipação de tutela posteriormente revogada, em face da precariedade da decisão judicial que a justifica, ainda que se trate de verba alimentar e esteja caracterizada a boa-fé subjetiva. A desnecessidade de devolução de valores somente estaria autorizada no caso de recebimento com boa-fé objetiva, pela presunção de pagamento em caráter definitivo.

2. Recomendável a aplicação moderada do entendimento firmado no STJ, na medida em que a devolução indiscriminada de valores percebidos provisoriamente, sem um juízo de proporcionalidade, afetará o direito constitucional de ação e a própria credibilidade do Poder Judiciário, uma vez que não se teria mais a segurança jurídica legitimamente esperada das suas decisões.

3. A devolução de valores em face de antecipação de tutela posteriormente revogada só deve ser autorizada nas hipóteses em que ela for concedida durante a instrução processual, mas não for ratificada em sentença, por se mostrar razoável afastar a boa-fé objetiva do jurisdicionado, na medida em que os requisitos para a sua concessão foram analisados de forma precária.

4. Concedida em sentença ou em acórdão a antecipação dos efeitos da tutela, inviável a restituição, eis que o direito foi reconhecido em cognição exauriente, com exame das provas produzidas no processo, o que caracteriza a boa-fé objetiva do segurado.

5. Percepção de benefício previdenciário em razão de antecipação dos efeitos da tutela, posteriormente revogada em face da sentença de improcedência, já transitada em julgado, o que possibilita a repetição de valores.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por maioria, dar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, prejudicado o recurso da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre (RS), 16 de dezembro de 2015.

Juiz Federal OSNI CARDOSO FILHO

Relator para Acórdão


Documento eletrônico assinado por Juiz Federal OSNI CARDOSO FILHO, Relator para Acórdão, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8059868v10 e, se solicitado, do código CRC FB7D45D7.
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Signatário (a): Osni Cardoso Filho
Data e Hora: 18/12/2015 14:58

APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5004803-13.2011.4.04.7111/RS

RELATOR:JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE:CLEDIA KOENIG
ADVOGADO:LIA LUCIANA JOST
APELANTE:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
APELADO:OS MESMOS

RELATÓRIO

Cuida-se de Ação Ordinária ajuizada por CLEDIA KOENIG contra o INSTITUTO NACIONAL DE SEGURO SOCIAL – INSS, objetivando em sede de liminar que o réu se abstenha de inscrevê-la em dívida ativa e/ou desconte valores de seu benefício previdenciário. No mérito, requereu o cancelamento da cobrança dos valores percebidos por força de decisão judicial. Para tanto, sustentou que recebeu os valores de boa-fé e alegou a irrepetibilidade de prestações alimentícias. Postulou a devolução em dobro do valor indevidamente cobrado e a condenação do INSS em danos morais. Requereu o benefício da AJG. Juntou documentos.

O pedido liminar foi deferido (evento 03). Na mesma ocasião também foi deferido o benefício da AJG.

O INSS interpôs Agrado de Instrumento (evento 09).

Em contestação (evento 10) o INSS alegou que o procedimento de cobrança dos valores recebidos pelo Autor é legítimo, pois foram recebidos por força de decisão antecipatória, de natureza precária e reversível. Revogada a decisão, pela improcedência da ação, deve a parte devolver os valores percebidos nos termos do art. 115, II, da lei nº 8.213/91 e do artigo 179 do decreto 3.048/99. Requereu a improcedência do pedido. Juntou o processo administrativo e cópia do procedimento de cobrança amigável efetuado pela Autarquia.

A sentença assim decidiu:

3. Dispositivo.

 

Ante o exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos veiculados por CLEDIA KOENIG em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, extinguindo o feito com resolução de mérito, nos termos do art. 269, inciso I, do Código de Processo Civil, para:

 

a) Declarar a inexigibilidade dos valores recebidos pela Autora, a título de auxílio-doença acidentário, no período de 20.07.2005 a 20.06.2008;

 

b) Determinar ao INSS que se abstenha de inscrevê-la em dívida ativa bem como se abstenha de efetuar qualquer consignação referente a estes valores em atual ou futuro benefício previdenciário percebido pela Autora, face da inexigibilidade descrita no item ‘a’;

 

Considerando a sucumbência recíproca, condeno cada parte a pagar os honorários da parte adversa, que vão arbitrados em 05% (cinco por cento) sobre o valor da causa devidamente atualizado, consoante o artigo 20, § 4º, do Código de Processo Civil, ficando reciprocamente compensada entre as partes, nos termos do artigo 21, também do Código de Processo Civil. Não é óbice à compensação o fato de a Autora ser beneficiária da assistência judiciária gratuita, visto que a compensação não implicará desembolso de valores.

 

Custas ‘ex lege’.

 

Sentença sujeita a reexame necessário

(…)

Apelou o INSS defendendo, em síntese, a legitimidade da cobrança, contrariedade ao art. 475-O do CPC, ofensa ao art. 115 da Le 8.213/91 e 876 do CC. Renova a alegação de legalidade da cobrança de valores deferidos em sede de antecipação de tutela posteriormente revogada.

A Autora apela requerendo a reforma da sentença quanto aos danos materiais e morais. Requer AJG.

É o Relatório.

Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

Relator


Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7846838v5 e, se solicitado, do código CRC D2F0B200.
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Signatário (a): João Batista Pinto Silveira
Data e Hora: 09/10/2015 15:04

APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5004803-13.2011.4.04.7111/RS

RELATOR:JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE:CLEDIA KOENIG
ADVOGADO:LIA LUCIANA JOST
APELANTE:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
APELADO:OS MESMOS

VOTO

Acerca do tema, venho sustentando a idéia da não devolução de valores recebidos, quando não demonstrada a má-fé.

A Terceira Seção desta Corte já havia sedimentado o entendimento de serem irrepetíveis as parcelas indevidas de benefícios previdenciários recebidas de boa-fé, em face do seu caráter eminentemente alimentar, como se pode extrair dos seguintes precedentes: AR n. 1998.04.01.086994-6, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. de 23-04-2010; AR n. 2000.04.01.012087-8, Rel. Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus; AR n. 2006.04.00.031006-4, Rel. Des. Federal João Batista Pinto da Silveira; AR n. 2003.04.01.026468-2, Rel. Des. Federal Celso Kipper; AR n. 2003.04.01.015357-4, Rel. Des. Federal Luiz Alberto D”Azevedo Aurvalle e AR n. 2003.04.01.027831-0, Rel. Des. Federal Rômulo Pizzolatti, todos estes julgados na sessão de 07-08-2008.

Vários são os precedentes do Superior Tribunal de Justiça, ao longo de mais de duas décadas e também em períodos recentes, nesta linha:

AGRAVO REGIMENTAL. DEVOLUÇÃO DE DIFERENÇAS RELATIVAS A PRESTAÇÃO ALIMENTAR. DESCABIDA.

O caráter eminentemente alimentar dos benefícios previdenciários faz com que tais benefícios, quando recebidos a maior em boa-fé, não sejam passíveis de devolução. Agravo regimental a que se nega provimento”. (AgRg no Resp nº 705.249/SC, Rel. Ministro Paulo Medina, DJ de 20/02/2006)

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DEVOLUÇÃO. NATUREZA ALIMENTAR. IRREPETIBILIDADE. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. EMBARGOS REJEITADOS.

1. Os embargos de declaração são cabíveis quando “houver, na sentença ou no acórdão, obscuridade ou contradição;” ou “for omitido ponto sobre o qual devia pronunciar-se o juiz ou tribunal.” (artigo 535 do Código de Processo Civil).

2. Não é omissa a decisão fundamentada em que os benefícios previdenciários têm natureza alimentar, sendo, portanto, irrepetíveis.

3. O entendimento que restou consolidado no âmbito da 3ª Seção desta Corte Superior de Justiça no julgamento do Recurso Especial nº 991.030/RS, é no sentido de que a boa-fé do beneficiário e a mudança de entendimento jurisprudencial, por muito controvertido, não deve acarretar a devolução do benefício previdenciário, quando revogada a decisão que o concedeu, devendo-se privilegiar o princípio da irrepetibilidade dos alimentos.

4. Embargos de declaração rejeitados. (EDcl no AgRg no REsp n.º 1.003.743/RS, Sexta Turma, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, julgado em 10-06-2008, DJe de 01-09-2008)

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA. VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. DESCONTOS NO BENEFÍCIO. CARÁTER ALIMENTAR. RESTITUIÇÃO DOS VALORES. IMPOSSIBILIDADE.

Uma vez reconhecida a natureza alimentar dos benefícios previdenciários, descabida é a restituição requerida pela Autarquia, em razão do princípio da irrepetibilidade dos alimentos. Recurso provido. (REsp n.º 627.808/RS, Quinta Turma, Rel. Ministro José Arnaldo da Fonseca, julgado em 04-10-2005, DJU, Seção 1, de 14-11-2005, p. 377).

AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO. VALORES INDEVIDAMENTE PAGOS PELA ADMINISTRAÇÃO. VERBA DE NATUREZA ALIMENTAR RECEBIDA DE BOA-FÉ. RESTITUIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.

1. Os valores percebidos que foram pagos pela Administração Pública em decorrência de interpretação deficiente ou equivocada da lei, ou por força de decisão judicial, ainda que precária, não estão sujeitos à restituição, tendo em vista seu caráter alimentar e a boa-fé do segurado que não contribuiu para a realização do pagamento considerado indevido.

2. Agravo regimental a que se nega provimento.

(STJ, AgRg no AREsp 8433, Rel. Ministro Marco Aurélio Belizze, DJe em 13-04-2012)

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECEBIMENTO INDEVIDO DE APOSENTADORIA PELA ESPOSA DO FALECIDO APÓS O ÓBITO. INEXIGIBILIDADE DA DEVOLUÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS. INAPLICABILIDADE, NO CASO, DA CLÁUSULA DE RESERVA DE PLENÁRIO. AGRAVO DO INSS DESPROVIDO.

(…).

2. Assim, em face da boa-fé da pensionista que recebeu a aposentadoria do de cujus após o seu óbito, de caráter alimentar da verba, da idade avançada e da hipossuficiência da beneficiária, mostra-se inviável impor a ela a restituição das diferenças recebidas. Não há que falar em declaração de inconstitucionalidade do art. 115 da Lei 8.213/91 e 273, § 2º e 475-o do CPC, uma vez que, no caso, apenas foi dado ao texto desse dispositivo, interpretação diversa da pretendida pelo INSS.

3. Agravo regimental do INSS desprovido.

(AgRg no Agravo de Instrumento n. 1.115.362/SC, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJ de 17-05-2010)

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO PAGO A MAIOR. ERRO ADMINISTRATIVO. RECEBIMENTO DE BOA-FÉ. NATUREZA ALIMENTAR. RESTITUIÇÃO INDEVIDA.

1. Em face do caráter social das demandas de natureza previdenciária, associada à presença da boa-fé do beneficiário, afasta-se a devolução de parcelas pagas a maior, mormente na hipótese de erro administrativo.

2. Agravo regimental improvido.

(AgRg no Agravo de Instrumento n. 1.318.361/RS, Rel. Ministro Jorge Mussi, DJe 13-12-2010)

PROCESSO CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL AFASTADA. RESTITUIÇÃO DE PARCELAS PREVIDENCIÁRIAS PAGAS POR FORÇA DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. VERBA ALIMENTAR RECEBIDA DE BOA FÉ PELA SEGURADA. RECURSO ESPECIAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.

1. A questão da possibilidade da devolução dos valores recebidos por força de antecipação dos efeitos da tutela foi inequivocamente decidida pela Corte Federal, o que exclui a alegada violação do artigo 535 do Código de Processo Civil, eis que os embargos de declaração não se destinam ao prequestionamento explícito.

2. O pagamento realizado a maior, que o INSS pretende ver restituído, foi decorrente de decisão suficientemente motivada, anterior ao pronunciamento definitivo da Suprema Corte, que afastou a aplicação da lei previdenciária mais benéfica a benefício concedido antes da sua vigência. Sendo indiscutível a boa-fé da autora, não é razoável determinar a sua devolução pela mudança do entendimento jurisprudencial por muito tempo controvertido, devendo-se privilegiar, no caso, o princípio da irrepetibilidade dos alimentos.

3. Negado provimento ao recurso especial.”

(REsp n. 991030/RS, Terceira Seção, Rel. Min. Thereza de Assis Moura, DJE de 15-10-2008)

Os parâmetros até então adotados e consolidados foram alterados em julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.384.418-SC (rel. Min. Herman Benjamin). Por oportuno, transcrevo a ementa:

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. RECEBIMENTO VIA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA POSTERIORMENTE REVOGADA. DEVOLUÇÃO. REALINHAMENTO JURISPRUDENCIAL. HIPÓTESE ANÁLOGA. SERVIDOR PÚBLICO. CRITÉRIOS. CARÁTER ALIMENTAR E BOA-FÉ OBJETIVA. NATUREZA PRECÁRIA DA DECISÃO. RESSARCIMENTO DEVIDO. DESCONTO EM FOLHA. PARÂMETROS.

1. Trata-se, na hipótese, de constatar se há o dever de o segurado da Previdência Social devolver valores de benefício previdenciário recebidos por força de antecipação de tutela (art. 273 do CPC) posteriormente revogada.

2. Historicamente, a jurisprudência do STJ fundamenta-se no princípio da irrepetibilidade dos alimentos para isentar os segurados do RGPS de restituir valores obtidos por antecipação de tutela que posteriormente é revogada.

3. Essa construção derivou da aplicação do citado princípio em Ações Rescisórias julgadas procedentes para cassar decisão rescindenda que concedeu ben

efício previdenciário, que, por conseguinte, adveio da construção pretoriana acerca da prestação alimentícia do direito de família. A propósito: REsp 728.728/RS, Rel. Ministro José Arnaldo da Fonseca, Quinta Turma, DJ 9.5.2005.

4. Já a jurisprudência que cuida da devolução de valores percebidos indevidamente por servidores públicos evoluiu para considerar não apenas o caráter alimentar da verba, mas também a boa-fé objetiva envolvida in casu.

5. O elemento que evidencia a boa-fé objetiva no caso é a “legítima confiança ou justificada expectativa, que o beneficiário adquire, de que valores recebidos são legais e de que integraram em definitivo o seu patrimônio” (AgRg no REsp 1.263.480/CE, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 9.9.2011, grifei). Na mesma linha quanto à imposição de devolução de valores relativos a servidor público: AgRg no AREsp 40.007/SC, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJe 16.4.2012; EDcl nos EDcl no REsp 1.241.909/SC, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 15.9.2011; AgRg no REsp 1.332.763/CE, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 28.8.2012; AgRg no REsp 639.544/PR, Rel. Ministra Alderita Ramos de Oliveira (Desembargador Convocada do TJ/PE), Sexta Turma, DJe 29.4.2013; AgRg no REsp 1.177.349/ES, Rel. Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, DJe 1º.8.2012; AgRg no RMS 23.746/SC, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 14.3.2011.

6. Tal compreensão foi validada pela Primeira Seção em julgado sob o rito do art. 543-C do CPC, em situação na qual se debateu a devolução de valores pagos por erro administrativo: “quando a Administração Pública interpreta erroneamente uma lei, resultando em pagamento indevido ao servidor, cria-se uma falsa expectativa de que os valores recebidos são legais e definitivos, impedindo, assim, que ocorra desconto dos mesmos, ante a boa-fé do servidor público.” (REsp 1.244.182/PB, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, DJe 19.10.2012, grifei).

7. Não há dúvida de que os provimentos oriundos de antecipação de tutela (art. 273 do CPC) preenchem o requisito da boa-fé subjetiva, isto é, enquanto o segurado os obteve existia legitimidade jurídica, apesar de precária.

8. Do ponto de vista objetivo, por sua vez, inviável falar na percepção, pelo segurado, da definitividade do pagamento recebido via tutela antecipatória, não havendo o titular do direito precário como pressupor a incorporação irreversível da verba ao seu patrimônio.

9. Segundo o art. 3º da LINDB, “ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece”, o que induz à premissa de que o caráter precário das decisões judiciais liminares é de conhecimento inescusável (art. 273 do CPC).

10. Dentro de uma escala axiológica, mostra-se desproporcional o Poder Judiciário desautorizar a reposição do principal ao Erário em situações como a dos autos, enquanto se permite que o próprio segurado tome empréstimos e consigne descontos em folha pagando, além do principal, juros remuneratórios a instituições financeiras.

11. À luz do princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF) e considerando o dever do segurado de devolver os valores obtidos por força de antecipação de tutela posteriormente revogada, devem ser observados os seguintes parâmetros para o ressarcimento:

a) a execução de sentença declaratória do direito deverá ser promovida; b) liquidado e incontroverso o crédito executado, o INSS poderá fazer o desconto em folha de até 10% da remuneração dos benefícios previdenciários em manutenção até a satisfação do crédito, adotado por simetria com o percentual aplicado aos servidores públicos (art. 46, § 1º, da Lei 8.213/1991. 12. Recurso Especial provido. (Grifado).

Parte o Relator, em apertada síntese, da ideia de que a boa-fé que isentaria o postulante de devolução de valores recebidos de forma indevida só se verificaria nos pagamentos equivocadamente feitos na via administrativa, pois ali se poderia aferir, de modo objetivo, que recebeu os valores como se fossem seus, em razão da presunção de definitividade, decorrente da possibilidade de averiguação da boa-fé objetiva, não verificável em procedimento judicial, onde esta avaliação se daria apenas de forma subjetiva. Sendo assim, apenas o argumento da irrepetibilidade de alimentos não se sustentaria diante da inviabilidade de consideração da boa-fé subjetiva em provimento precário. Aliado a estes argumentos, sustenta que o princípio da dignidade humana, com a devolução destes alimentos, tampouco restaria ferido, na medida em que realizados com apoio legal no art. 115 da Lei n.º 8.213/91, que estabelece restrição ao percentual de 30% dos valores a que faça jus o segurado.

Deu-se confrontação de tese com o Ministro Arnaldo Esteves Lima, que sustentou a posição até então adotada de não-devolução, dada a natureza previdenciária dos benefícios, pautado em fundamentos que denominou de metajurídicos, mas com consistência social, argumentando ainda que o balizador de 30% seria viável apenas para empréstimos consignados em folha, sendo que nem mesmo para funcionários públicos se admitia tal desconto, em casos idênticos, a configurar evidente tratamento anti-isonômico.

Penso que a compreensão adotada pelo voto divergente deve ser privilegiada.

Segundo Ruy Rosado de Aguiar, para caracterização da boa-fé é indispensável a existência de um princípio de direito envolto em um padrão ético que, além da confiança, impõe um dever de lealdade. Sendo assim, julgo necessário questionar-se se é possível vislumbrar um padrão ético de lealdade a partir da ignorância sobre um erro perpetrado pela Administração. Penso que, no caso de pagamento que vem a se configurar indevido, pode-se, quando muito, falar-se em um princípio de mera confiança, que não está atrelado, necessariamente, a um padrão ético de lealdade.

A boa-fé não é aferível apenas a partir do fato de não haver resistência à pretensão. Seria até questionável que ela estivesse em cheque na descrição trazida pelo relator como passível de não devolução (erro da Administração), na medida em que se pode sustentar que a boa-fé se estabelece numa relação de lealdade (ativa ou passiva) para com terceiro. A boa-fé objetiva, no âmbito processual, de outra parte, se revela pela lealdade processual; a má-fé, em oposição, não pode ser presumida.

E qual seria a extensão dessa afirmação de que a má-fé não pode ser presumida? Pelo que se vê de toda a explanação, o Relator do RE 1.384.418/SC trabalha com conceitos relativos à boa-fé, subjetiva e objetiva, que decorreria da consciência da definitividade do que foi deferido.

Há que ponderar primeiro, que em termos de boa-fé podemos sim supô-la, dado que o próprio conceito se presta a tal ilação, porém o inverso, pressupor a má-fé a partir de uma condição que serviria à coletividade, indiscriminadamente, não é possível.

Mutatis mutandis, no Direito Penal é possível, com mais clareza, perceber-se a inviabilidade de presunção para juízo onde há necessidade de comprovação, na medida em que se presume a inocência porém não se presume a culpa.

Sendo assim, não posso afirmar que toda a pessoa que é sucumbente em uma ação agiu de má-fé, ou toda pessoa que teve a antecipação de tutela revogada, agiu de má-fé.

A má-fé é um elemento exterior a esta formulação, não é possível matematizarmos, pressupondo, uma fórmula, no sentido de possibilitar a afirmação (sucumbência na ação = má-fé ou antecipação de tutela revogada = má-fé, ou, dito de outra forma, percepção a título provisório = má-fé). Esta tautologia não existe. Sempre deve ser aferível caso a caso e demonstrada, não suposta.

Impõe considerar, além disso, que as antecipações de

tutela, embora precárias, são deferidas mediante a existência de verossimilhança, que mais do que probabilidade do direito, exige comprovação do direito, ainda que não esgotada a cognição. Também não se pode descuidar da circunstância de que, não raras vezes, o direito postulado não é confirmado por mera alteração de orientação jurisprudencial.

Este raciocínio, ao menos no sentido de que as tutelas antecipadas são possíveis, antes de esgotar-se a realização plena do direito de defesa do demandado, é da essência e é o que inspira as antecipações de tutela, pois esta “verdade” por vezes é tida como não mais “verdadeira”, muitas vezes pela própria alteração de jurisprudência relativamente ao tempo em que deferida a antecipação ou proferida a sentença. Aliás, várias “verdades” balizadoras, são extraídas de interpretação das Cortes Superiores, que, por sua vez e não raras vezes, alteram o entendimento inicial do que seria a vontade da lei.

Sendo assim, ao determinar-se a devolução de valores apenas por se tratar de um juízo provável (embora não definitivo), acabar-se-ia por renovar esta compreensão obsoleta de que o juiz decidiu contra a lei, freando a utilização de um instituto legítimo, por receio de mais prejudicar a parte que faz jus à tutela de urgência do que a socorrer.

Repita-se, ainda, que o cumprimento imediato da tutela é de sua essência de urgência e colocar-se qualquer óbice ao cumprimento imediato da tutela, inclusive de ordem subjetiva, ao inibir indiretamente o juiz de conceder o que é legítimo, por receio do prejuízo ao hipossuficiente, é tentar esvaziar a força destes comandos.

Tem-se a ideia de que quando se concede o benefício previdenciário, em sede de antecipação de tutela, não se está diante de caso de relevância ou urgência a ponto de se dar imediata efetividade à inibição do ilícito (mesmo que aferível de forma provisória), minimizando-se a importância do que se está a tratar, diferentemente do que ocorre nos casos de danos ambientais e concessão de medicamentos, por exemplo, como se fosse menos urgente afastar-se a ilegalidade da não-concessão de uma aposentadoria (seja por invalidez, seja por exposição a agentes insalubres), de auxílio-doença e até mesmo de benefício assistencial.

É necessário ter-se a visão de que, cuidando de tutela de urgência, a exemplo do que acontece com as concessões de medicamentos, o juiz não pode furtar-se à concessão. Ainda, a ideia de que quando o juiz faz isso em cognição sumária, apenas por se tratar de hipótese passível de alteração, o faz de forma contrária a lei, impondo a devolução pelo beneficiário, implica em retirar-se, repito, a força do instituto, pois o juiz não está a proferir juízo menor ou menos “verdadeiro” apenas em razão de não estar esgotado o processo de cognição.

Aliás, fosse o argumento da reforma da decisão o que imporia a devolução, deveria ser aplicado também às sentenças ou acórdãos reformados, pois estes também teriam se revelado não “verdadeiros”.

A verossimilhança não é precária, ela é aferível e extreme de dúvida, em dado momento (momento da natureza do instituto), como única forma de afastar a lesão capaz de provocar gravame irreparável ou de difícil reparação. E, como regra, em matéria previdenciária, as prestações são de natureza alimentar e disso decorre o perigo, o dano irreversível. Sendo assim, se a medida é deferida justamente porque não pode a parte, sem ela, ter mantida sua subsistência ou de sua família, como sustentar-se a devolução, quando ela é absolutamente antagônica à segunda condição examinada pelo juiz para deferir a medida?

Aliás, a capacidade de suportar descontos mensais no benefício, sem prejuízo de seu sustento próprio ou da família é questionável neste universo de segurados que, quase na totalidade, desfruta dos benefícios da AJG, por perceber o mínimo legal ou pouco mais que isso.

Desse modo, a grande questão que se impõe não envolve a possibilidade de mudança de orientação jurisprudencial consolidada, mas, sim, a necessidade de debate participativo mais profundo acerca de questão tão relevante, como a que concretamente se verifica, e que tem repercussão na realidade vivida, muitas vezes, por parcela da população que não tem força política e que, uma vez não reconhecido o direito ao benefício, quando muito, teria como responder a tal encargo com o alijamento de seu direito à possibilidade de acesso à aquisição de quaisquer bens, diante de inscrição de seu nome em órgãos de restrição de crédito. É, no mínimo, quanto a esse iter que marca a formação do precedente que devemos atentar e, se as propostas são adequadas à sua conformação.

É importante ressaltar que não estou a rejeitar disposição de adequação à orientação das Cortes Superiores quanto à uniformização vertical. Contudo, a orientação a ser seguida deve ser clara e extreme de dúvidas interpretativas, que possam gerar um descompasso com a harmonização da própria jurisprudência que prevaleceu por tantos anos.

Dessa forma, em atenção ao fato de que as decisões dos Tribunais não devem oscilar a ponto de não preservar um mínimo de estabilidade e credibilidade nas instituições, tenho que toda mudança impõe cautela, mormente quando se está a tolher direitos dessa ordem.

Com essas considerações, entendo deva, por ora, ser mantida a orientação anterior, no sentido de assegurar a não-repetição dos valores havidos de boa-fé por força de antecipação da tutela, ainda que, posteriormente, ela tenha sido revogada.

Cumpre referir que a Terceira Seção deste Regional, em sessão de 01-08-2013, ratificou o entendimento no sentido de que é descabida a cobrança de valores recebidos em razão de decisão judicial. O acórdão vem assim ementado:

AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS A TÍTULO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. VIOLAÇÃO DO ART. 515 DO CPC. OMISSÃO DO ACÓRDÃO.

1. Omisso o acórdão quanto ao pedido de reforma da sentença para desobrigar a autora da devolução de parcelas do auxílio-doença recebidas por força de antecipação de tutela revogada, admite-se a rescisão com fundamento no art. 485, V, do CPC.

2. O pagamento originado de decisão devidamente motivada à luz das razões de fato e de direito apresentadas, e mediante o permissivo do art. 273 do CPC, tem presunção de legitimidade e assume contornos de definitividade no sentir da segurada, dada a finalidade a que se destina de prover os meios de subsistência.

3. Evidenciada a boa-fé, o beneficiário não pode ficar jungido à contingência de devolver valores que já foram consumidos, sob pena de inviabilização do instituto da antecipação de tutela no âmbito dos direitos previdenciários.

4. Hipótese em que não se constata a alegada violação do princípio da reserva do plenário por declaração tácita de inconstitucionalidade dos arts. 115 da Lei nº 8.213/91 e 475-O do CPC.

5. Ação rescisória julgada procedente; dispensada a autora da restituição das verbas recebidas durante a vigência da antecipação de tutela.

(Ação Rescisória n.º 0015157-78.2011.404.0000/PR, Rel. Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, D.E. em 09-08-2013).

Não fossem estes os argumentos suficientes a, por ora, manter-e a orientação prestigiada há tantos anos, a Suprema Corte já se manifestou nessa linha, de modo expresso, também em período não muito remoto:

A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que o benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado em virtude de decisão judicial não está sujeito a repetição de indébito, dado o seu caráter alimentar. Na hipótese, não importa declaração de inconstitucionalidade do art. 115 da Lei 8.213/91, o reconhecimento, pelo Tribunal de origem, da impossibilidade de desco

nto dos valores indevidamente percebidos. Agravo regimental conhecido e não provido. (STF, AI 829661 AgR, Rel. Min. Rosa Weber, Primeira Turma, j. 18.06.2013, DJ 07.08.2013).

Embora tenha sido publicado, em 14.05.2012, acórdão da Primeira Turma do STF, de relatoria do Ministro Luiz Fux, que negou provimento a Agravo Regimental interposto pelo INSS contra decisão proferida no Agravo de Instrumento 850.620-RS, ao argumento de que o enfrentamento do tema implicaria interpretação de norma infraconstitucional, chama a atenção o fato de que essa mesma decisão se reporta ao julgamento unânime, pelo Plenário do STF, da Reclamação 6944-DF, Rel. Min. Carmen Lúcia, que entendeu que a não aplicação do dispositivo contido no art. 115, II, da Lei 8.213/91, não violaria a Súmula Vinculante 10 do STF (Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, art. 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua incidência, no todo ou em parte). Nas palavras da Ministra Relatora,

“a simples ausência de aplicação de uma dada norma ao caso sob exame não caracteriza, tão somente por si, violação da orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal. Por exemplo, é possível que dada norma não sirva para desate do quadro submetido ao crivo jurisdicional pura e simplesmente porque não há subsunção”.

No caso em questão, como esclareceu a Ministra Relatora, a decisão recorrida não havia afastado o art. 115, II, da Lei 8.213/91 com base em norma constitucional.

Nessa mesma Reclamação 6944-DF, a Ministra Carmen Lúcia expressou que, já em outro julgamento do Plenário do STF (MS 26085, DJ 18.04.2008), foi decidido que “os valores recebidos indevidamente devem ser restituídos ao Poder Público somente quando demonstrada a má-fé da parte beneficiária”.

A esse respeito, assim leciona o Eminente Juiz Federal Daniel Machado da Rocha (Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social, 11ª edição, fls. 378/379):

Na jurisprudência começa a tomar corpo o entendimento no sentido de que o segurado não precisa devolver os valores recebidos de boa-fé, hoje pacificado na 3ª S. do STJ, inclusive em decorrência de antecipação de tutela em ação judicial. Mesmo na hipótese de provimento de ação rescisória proposta pelo INSS – como foi o caso das ações que foram julgadas procedentes para determinar a aplicação retroativa da Lei 9.032/95, entendimento modificado após a manifestação do STF – entende o STJ não ser devida a restituição daquilo que foi recebido em face de decisão judicial.

Com isso, foi dado aos segurados tratamento análogo ao que se dá em relação aos valores recebidos indevidamente por servidores públicos, em entendimento cristalizado na Súmula 106 do TCU, chancelado pela jurisprudência. Em outra formulação, encontramos, também, precedente no sentido de que a devolução somente tem lugar quando o segurado concorreu para o pagamento a maior.

Com efeito, não é razoável que se pretenda a restituição de valores recebidos por força da decisão rescindenda, os quais, de caráter alimentar, até então estavam protegidos pelo pálio da coisa julgada..

(…)

Assim, havendo manifestação do STF pela irrepetibilidade, não cabe desconto no benefício do demandante, a título de restituição de valores pagos por antecipação de tutela revogada.

Dessa forma, em consequência do não cabimento de desconto deve, o INSS ressarcir ao autor os valores eventualmente descontados de seus proventos, devidamente corrigidos. Com razão, portanto, a agravante.

Ante o exposto, voto por dar provimento ao agravo.”

Não é demasiado lembrar também que em decisão posterior e próxima ao referido repetitivo, examinando os Embargos de Divergência nº 1.086.154 sobre a matéria em questão, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (portanto órgão com representação mais abrangente), em sessão realizada em 20/11/2013, acompanhou voto da Min. Nancy Andrighi (EREsp. 1.086.154-RS – D.J. 19/03/2014) que embora estivesse a defender não devolução em hipóteses de conhecimento não mais precário (o que reforça a ideia de que não é a reforma que implica automático reconhecimento de má-fé), em sua fundamentação, invoca trecho de julgado na linha de não devolução mesmo para decisão precária, a recomendar cautela quanto a alteração da jurisprudência há anos sedimentada no próprio STJ:

(…)

3. A jurisprudência iterativa desta Corte enuncia que os valores que foram pagos pela Administração Pública em decorrência de interpretação deficiente ou equivocada da lei, ou por força de decisão judicial, ainda que precária, não estão sujeitos à restituição, tendo em vista seu caráter alimentar e a boa fé do segurado, que não contribuiu para a realização do pagamento considerado indevido.

(…)

(AR 3.818/PR, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª Seção, DJe de 29/04/2013) (grifou-se)”

Tenho por pertinente, transcrever ainda, trecho de voto da eminente Des. Vânia Hack de Almeida, em ações em que se discute a não devolução, onde sustenta a idéia que venho defendendo, embora se refira, inicialmente, à cognição exauriente. Todavia, seus argumentos valem de forma absolutamente pertinente para as hipóteses de antecipação de tutela revogada:

Embora nesta altura, importa referir que, se é dado ao homem médio criar expectativa legítima (boa-fé objetiva) na irrepetibilidade de verba paga por interpretação errônea ou inadequada da lei por servidor da administração, diga-se, da Autarquia – matéria reconhecida pela União por meio da edição da Súmula nº 34/AGU – com muito mais força se mostra presente a boa-fé objetiva nos casos em que o direito é confirmado por um magistrado em cognição exauriente.

 

De outro lado, calha mencionar que não se está fazendo letra morta aos artigos 273, §§3º e 4º, c/c art 475-O, I e II, que determinam a restituição ao estado anterior das partes em caso de reforma do julgado que ensejou execução provisória ou percepção de tutela antecipada, tampouco ao art. 115, II, da Lei nº 8.213/91, porque tais dispositivos, embora constitucionais, devem ser lidos em interpretação conforme a Constituição, não maculando princípio fundamental da República, insculpido no art. 1º, III, da CF/88, que é a dignidade da pessoa humana, menos ainda afrontando a segurança jurídica consubstanciada na sedimentada jurisprudência que, repito, por anos, assentou a irrepetibilidade da verba alimentar.

 

Determinar-se a devolução irrestrita de valores previdenciários percebidos provisoriamente, sem qualquer reflexão sobre as consequências sociais que tal medida viria a causar, é, sem sombra de dúvida, ferir o que de mais básico é garantido ao cidadão brasileiro – o direito à vida digna-, pois compromete o direito à alimentação, à moradia, à saúde, enfim, à subsistência da família, deixando ao total desamparo aquele que um dia procurou o Judiciário e confiou seu futuro a este Poder na expectativa legítima de uma proteção. Advirto, ainda, que a insegurança de tal ordem poderia gerar um receio generalizado do segurado recorrer ao Judiciário e de postular medidas antecipadas, ensejando desprestígio ao instituto da antecipação de tutela, e, principalmente, a este Poder.

 

Com essas considerações, por ora, reputo mais prudente a manutenção da orientação sedimentada até então por esta Corte e pelas próprias Cortes Superiores.

Quanto aos danos pretendidos pela parte autora, para evitar tautologia me permito transcrever os fundamentos da sentença utilizando-os como razões de decidir, uma v

ez que não destoam da orientação desta Corte:

(…)

Dos danos materiais.

O pedido indenizatório de danos materiais cinge-se à devolução em dobro dos valores indevidamente cobrados pelo INSS.

Contudo, a indenização em dobro somente é admitida nas hipóteses em que há prova de que o credor agiu com má-fé; não havendo demonstração de que o credor agiu de forma consciente ao exigir o que lhe era indevido, descabe a cominação da penalidade (AC, 200370000263464/PR, Terceira Turma, Rel. Roger Raupp Rios, DJ 13/08/2008).

Dano moral.

Alega a Autora que ao receber a carta de cobrança no valor de R$ 29.483,18 foi acometida de ansiedade, angústia, tensão, incerteza e preocupação com o seu futuro, face ao temor de ver seu nome inscrito em dívida ativa ou ainda diante da possibilidade de ter que pagar um valor sem ser devido.

Postulou a condenação da Autarquia em danos morais, no valor não inferior ao cobrado indevidamente.

No que concerne à indenização por danos morais, o pedido é improcedente.

Ocorre que a cobrança efetuada pelo INSS, por si só, não é capaz de gerar constrangimento ou abalo tais que caracterizem a ocorrência de dano moral. A Administração Pública apenas seguiu a legislação em vigor, sem extrapolar os limites de seu poder-dever, como já referido alhures.

Outrossim, para o deferimento de indenização por danos morais, é preciso provar a existência do dano, o ato da administração e o nexo de causalidade entre ambos, ônus que incumbe ao autor, nos termos do art. 333, inciso I, do CPC.

No presente caso, mesmo que se admita que a cobrança dos valores foi indevida, não há qualquer comprovação do indigitado dano extrapatrimonial sofrido pela Autora. Note-se que a requerente limita-se a alegar, genericamente, que sofreu abalo, sem contudo, especificar ou provar tais alegações. Verifico que a Autora sequer apontou a existência de um dano concreto, tal como uma humilhação específica ou situação vexatória pela qual tenha efetivamente passado.

Na hipótese em tela, o desconforto gerado pela cobrança dos valores recebidos por força da antecipação de tutela, se resolve na esfera patrimonial.

Mantida a AJG.

Ante o exposto, voto por negar provimento aos apelos e à remessa oficial.

Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

Relator


Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7846839v7 e, se solicitado, do código CRC E92A7B2F.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): João Batista Pinto Silveira
Data e Hora: 09/10/2015 15:04

APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5004803-13.2011.4.04.7111/RS

RELATOR:JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE:CLEDIA KOENIG
ADVOGADO:LIA LUCIANA JOST
APELANTE:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
APELADO:OS MESMOS

VOTO-VISTA

Pedi vista para poder melhor apreciar o tema da obrigatoriedade de repetição de valores recebidos por segurado na pendência de decisão judicial que, mais adiante, veio a ser revogada.

Cledia Koenig ajuizou ação ordinária contra o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, com o propósito, in limine, de obter ordem judicial para que  o réu se abstenha de inscrever o alegado débito em dívida ativa ou o deduza de seu benefício previdenciário. No mérito, requereu o cancelamento da cobrança dos valores recebidos por força de decisão judicial. Sustentou, ainda, para não ter de devolver, que recebeu a quantia de boa-fé e o seu caráter alimentar. Requereu, por fim,  o pagamento em dobro do valor indevidamente cobrado e a condenação do INSS em danos morais.

O pedido liminar foi deferido. Na mesma ocasião também foi deferido o benefício da assistência judiciária gratuita.

O MM. Juiz Federal da 1º Vara Federal de Santa Cruz do Sul/RS julgou parcialmente procedentes os pedidos para:

“a) Declarar a inexigibilidade dos valores recebidos pela Autora, a título de auxílio-doença acidentário, no período de 20.07.2005 a 20.06.2008;

b) Determinar ao INSS que se abstenha de inscrevê-la em dívida ativa bem como se abstenha de efetuar qualquer consignação referente a estes valores em atual ou futuro benefício previdenciário percebido pela Autora, face da inexigibilidade descrita no item ‘a’;

Considerando a sucumbência recíproca, condeno cada parte a pagar os honorários da parte adversa, que vão arbitrados em 05% (cinco por cento) sobre o valor da causa devidamente atualizado, consoante o artigo 20, § 4º, do Código de Processo Civil, ficando reciprocamente compensada entre as partes, nos termos do artigo 21, também do Código de Processo Civil. Não é óbice à compensação o fato de a Autora ser beneficiária da assistência judiciária gratuita, visto que a compensação não implicará desembolso de valores.

 

Custas ‘ex lege’.

 

Sentença sujeita a reexame necessário”

O INSS interpôs recurso de apelação. Sustentou, em síntese, a legitimidade da cobrança, contrariedade ao art. 475-O do CPC e ofensa ao art. 115 da Le 8.213/91 e 876 do Código Civil.

A parte autora também recorreu. Requereu a reforma da sentença no ponto pertinente aos danos materiais e morais e, por último, a majoração dos honorários advocatícios.

Segundo o voto do eminente relator,  a cobrança prevista no artigo 115 da Lei 8.213/91 somente se justifica nos casos em que tornar-se comprovada a má-fé no auferimento dos valores, o que não foi evidenciado. Afastou, ainda, a possibilidade de indenização por danos materiais e morais.

Assim, votou por negar provimento às apelações e à remessa oficial.

Prossigo para decidir.

O Superior Tribunal de Justiça possuía consolidada jurisprudência no sentido da irrepetibilidade dos valores de benefícios previdenciários recebidos por conta de antecipação de tutela posteriormente revogada e em situações similares, sempre que verificada a boa-fé do beneficiário (REsp 1356427/PI, Primeira Turma, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 29/04/2013; EDcl no AgRg no AREsp 229179/RS, Segunda Turma, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 17/12/2012; AgReg no REsp 722.464/RS, Quinta Turma, Relator Ministro Gilson Dipp, DJ 23/05/2005; AgReg no REsp 697.397/SC, Quinta Turma, Relatora Ministra Laurita Vaz, DJ 16/05/2005; REsp nº 179.032/SP, Sexta Turma, Relator Ministro Vicente Leal, DJ 28/05/2001).

O julgamento dos Recursos Especiais 1.384.418/SC e 1.401.560/MT, realizados em 12/06/2013 e 12/02/2014, este último representativo de controvérsia, nos termos do artigo 543-C do Código de Processo Civil e ainda pendente de publicação, modificaram a orientação anterior.

Adotou-se, a partir de então, entendimento no sentido de que é possível a repetição de valores recebidos do erário no influxo dos efeitos de antecipação de tutela posteriormente revogada, em face da precariedade da decisão judicial que a justifica, ainda que se trate de verba alimentar e esteja caracterizada a boa-fé subjetiva. A desnecessidade de devolução de valores somente estaria autorizada no caso de recebimento com boa-fé objetiva, pela presunção de pagamento em caráter definitivo, o que não se verifica nas decisões que antecipam os efeitos da tutela. O segurado, assistido por advogado, não poderia alegar desconhecimento da natureza jurídica do disposto no art. 273 do Código de Processo Civil para evitar o ressarcimento.

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no entanto, examinando os Embargos de Divergência nº 1.086.154, julgados em 20 de novembro de 2013, de que foi relatora a Exma. Ministra Nancy Andrighi, por maioria de votos, entendeu que é indevida a repetição de valores decorrentes do direito a benefício previdenciário, recebidos por determinação contida em sentença, ratificada em recurso, mas reformada somente por acórdão que julgou recurso especial.

A dupla conformidade, entre sentença e acórdão, constituiria legítima expectativa de titularidade do direito proveniente de decisão judicial com força de definitiva. Esta, em síntese, a fundamentação do julgado do STJ.

O Supremo Tribunal Federal (STF), no entanto, em mais de uma decisão, de que é exemplo a que se transcreve abaixo, afirmava então a irrepetibilidade das verbas alimentares recebidas de boa-fé pelo beneficiário:

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO RECEBIDO POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL. DEVOLUÇÃO. ART. 115 DA LEI 8.213/91. IMPOSSIBILIDADE. BOA-FÉ E CARÁTER ALIMENTAR. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DO ART. 97 DA CF. RESERVA DE PLENÁRIO: INOCORRÊNCIA. ACÓRDÃO RECORRIDO PUBLICADO EM 22.9.2008. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que o benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado em virtude de decisão judicial não está sujeito à repetição de indébito, dado o seu caráter alimentar. Na hipótese, não importa declaração de inconstitucionalidade do art. 115 da Lei 8.213/91, o reconhecimento, pelo Tribunal de origem, da impossibilidade de desconto dos valores indevidamente percebidos. Agravo regimental conhecido e não provido.

(Agravo Regimental no Recurso Extraordinário com Agravo nº 734.199/RS, Primeira Turma, Relatora Ministra Rosa Weber, DJe em 23/09/2014)

A Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região reafirmou, de forma unânime, alinhamento à posição do STF:

PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. CONVERSÃO DOS BENEFÍCIOS EM URV – ART. 20 DA LEI Nº 8.880/94. CONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO STF. VIOLAÇÃO À LEI. DEVOLUÇÃO DE PARCELAS RECEBIDAS DE BOA-FÉ – IMPOSSIBILIDADE.

1. Afirmada pelo STF a constitucionalidade da forma de conversão dos benefícios em URV determinada pelo artigo 20 da Lei nº 8.880/94, deve ser reconhecida, no acórdão rescindendo, sua violação.

2. É indevida a restituição de valores recebidos por força da decisão rescindenda, os quais, de caráter alimentar, até então estavam protegidos pelo pálio da coisa julgada.

3. Precedentes do STF e do STJ.

(Ação Rescisória 2003.04.01.030574-0/SC, Relator Juiz Federal Roger Raupp Rios, D.E. em 12/11/2014)

Mais recentemente, porém, ambas as Turmas do Supremo Tribunal Federal vêm estabelecendo que a questão objeto deste processo teve sua repercussão geral rejeitada, por se tratar de matéria infraconstitucional:

Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo. 2. Cálculo de benefício previdenciário homologado por decisão judicial. 3. Limites da coisa julgada. Matéria infraconstitucional (ARE-RG 748.371, de minha relatoria, DJe 1º.8.2013). 4. Devolução de valores recebidos de boa-fé. Matéria infraconstitucional (AI-RG 841.473, relator min. Cezar Peluso, DJe de 31.8.2011). 5

. Ausência de argumentos capazes de infirmar a decisão agravada. 6. Agravo regimental a que se nega provimento. (ARE 887274 AgR/SP, Segunda Turma, Relator Ministro Gilmar Mendes, julgado em 23/06/2015, DJe de 03/08/2015)

 

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PREVIDENCIÁRIO. PARCELAS RECEBIDAS EM RAZÃO DA ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ. RESTITUIÇÃO. MATÉRIA COM REPERCUSSÃO GERAL REJEITADA PELO PLENÁRIO VIRTUAL NO JULGAMENTO DO AI 841.473. MATÉRIA DE ORDEM INFRACONSTITUCIONAL. 1. O dever do beneficiário de boa-fé em restituir aos cofres públicos os valores que lhe foram concedidos mediante decisão judicial ou pagos indevidamente pela Administração Pública, devido à sua natureza infraconstitucional, não revela repercussão geral apta a tornar o apelo extremo admissível, consoante decidido pelo Plenário Virtual do STF na análise do AI 841.473-RG, Relator Min. Cezar Peluso, DJe de 31/8/2011. 2. In casu, o acórdão recorrido assentou: “EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ACÓRDÃO QUE DEU PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS, PARA PRONUNCIAR A DECADÊNCIA DO DIREITO DA PARTE AUTORA, RESSALVANDO QUE EVENTUAIS PARCELAS RECEBIDAS EM RAZÃO DA ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA NÃO SERIAM REPETIDAS, DIANTE DA NATUREZA ALIMENTAR DO BENEFÍCIO.” 3. Agravo regimental DESPROVIDO. (RE 798793 AgR/ES, Primeira Turma, Relator Ministro Luiz Fux, julgado em 10/02/2015, DJe de 06/03/2015)

Logo, os precedentes anteriores, que vinham sendo utilizados para afastar a necessidade de devolução de valores recebidos de boa-fé, já não podem configurar diretriz a ser observada. O equacionamento da questão, pela interpretação a ser conferida à legislação ordinária, dar-se-á pela orientação do Superior Tribunal de Justiça, de modo que não se pode simplesmente ignorar a existência de recurso julgado em regime representativo de controvérsia que determina a restituição ao erário de valores percebidos pela parte em decorrência de antecipação de tutela posteriormente revogada.

Esta conclusão, contudo, não afasta a possibilidade de aplicação moderada deste entendimento. O rigor processual, muitas vezes, cede seu espaço em favor da efetividade dos postulados constitucionais dos direitos sociais fundamentais, na busca da materialização de prestações positivas do poder público, previstas no art. 194 da Constituição Federal de 1988, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.

Por essa razão é que o art. 100, §1º, da Constituição Federal estabelece expressamente o caráter alimentar dos benefícios de natureza previdenciária, em atenção, por certo, ao princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, inciso III, da Constituição Federal de 1988), para garantir as condições mínimas de preservação de sobrevivência e vida digna.

O argumento de que a parte, assistida por advogado, não pode alegar o desconhecimento da natureza precária de uma decisão que antecipa os efeitos da tutela, como forma de justificar a devolução de valores, não pode ser isoladamente considerado.

Conforme já destacado, a jurisprudência estava, há anos, consolidada no sentido de serem irrepetíveis os valores recebidos de boa-fé pelo segurado em hipóteses como a dos autos.

Nessa linha também é a Súmula 51 da Turma Nacional de Uniformização: os valores recebidos por força de antecipação dos efeitos de tutela, posteriormente revogada em demanda previdenciária, são irrepetíveis em razão da natureza alimentar e da boa-fé no seu recebimento.

A devolução indiscriminada de valores percebidos provisoriamente, sem um juízo de proporcionalidade, afetará o direito constitucional de ação. Ainda que presentes os requisitos da antecipação de tutela, a parte poderá deixar de requerê-la; o magistrado ocasionalmente hesitará em concedê-la, pelo risco de afetar o patrimônio do jurisdicionado; a própria credibilidade do Poder Judiciário seria atingida, uma vez que não se teria mais a segurança jurídica legitimamente esperada das suas decisões.

Com tais considerações, e buscando aplicar de forma equilibrada a nova orientação do STJ, compreende-se que a melhor solução a ser adotada em casos como o destes autos é de que a devolução de valores em face de antecipação de tutela posteriormente revogada só deve ser autorizada nas hipóteses em que ela for concedida durante a instrução processual, mas não for ratificada em sentença, em decorrência da improcedência do pedido. Nesse caso, mostra-se razoável afastar a boa-fé objetiva do jurisdicionado, na medida em que os requisitos para a concessão de antecipação de tutela foram analisados de forma precária.

Conforme precedentes do STJ, nas hipóteses em que o segurado ainda permaneça como titular de benefício previdenciário, o desconto em folha deverá se limitar ao percentual de 10% (dez por cento) sobre a remuneração, até a satisfação do crédito.

Diferentes são as situações em que a tutela antecipada é confirmada ou concedida em sentença, e mantida ou reconhecida em grau recursal, com a determinação de implantação do benefício por força do art. 461 do CPC. Aqui, o caráter provisório resta mitigado, na medida em que o direito foi reconhecido em cognição exauriente, com exame de todas as provas já produzidas e anexadas ao feito, sendo incabível a restituição de valores, eis que a boa-fé objetiva resta caracterizada.

Essa interpretação não está negando a constitucionalidade ou a vigência dos arts. 273, §§3º e 4º, combinado com art. 475, incisos I e II, ambos do CPC, e tampouco ao art. 115, inciso II, da Lei 8.213/91, e sim compatibilizando-os com os princípios constitucionais já referidos.

No caso concreto, a parte autora percebeu benefício previdenciário em razão de antecipação dos efeitos da tutela, posteriormente revogada em face da sentença de improcedência, já transitada em julgado, o que possibilita a repetição de valores.

Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios fixados em R$ 788,00 (setecentos e oitenta e oito reais), cuja cobrança permanecerá sobrestada até modificação favorável de sua situação econômica.

Considerando-se que se está reconhecendo a possibilidade de repetição de valores, prejudicado o recurso de apelação da parte autora.

Em face do que foi dito, voto por dar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, prejudicado o recurso da parte autora.

Juiz Federal OSNI CARDOSO FILHO


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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 07/10/2015

APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5004803-13.2011.4.04.7111/RS

ORIGEM: RS 50048031320114047111

RELATOR:Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PRESIDENTE:Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PROCURADOR:Procurador Regional da República Cláudio Dutra Fontella
APELANTE:CLEDIA KOENIG
ADVOGADO:LIA LUCIANA JOST
APELANTE:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
APELADO:OS MESMOS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 07/10/2015, na seqüência 477, disponibilizada no DE de 23/09/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.

Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

APÓS O VOTO DO DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA NO SENTIDO DE NEGAR PROVIMENTO AOS APELOS E À REMESSA OFICIAL, PEDIU VISTA O JUIZ FEDERAL OSNI CARDOSO FILHO. AGUARDA O JUIZ FEDERAL HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR.

PEDIDO DE VISTA:Juiz Federal OSNI CARDOSO FILHO
VOTANTE(S):Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

Gilberto Flores do Nascimento

Diretor de Secretaria


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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 16/12/2015

APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5004803-13.2011.4.04.7111/RS

ORIGEM: RS 50048031320114047111

RELATOR:Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PRESIDENTE:Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida
PROCURADOR:Procuradora Regional da República Adriana Zawada Melo
APELANTE:CLEDIA KOENIG
ADVOGADO:LIA LUCIANA JOST
APELANTE:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
APELADO:OS MESMOS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 16/12/2015, na seqüência 1521, disponibilizada no DE de 02/12/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.

Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

PROSSEGUINDO NO JULGAMENTO, APÓS O VOTO-VISTA APRESENTADO PELO JUIZ FEDERAL OSNI CARDOSO FILHO, E DO VOTO DA DESEMBARGADORA FEDERAL VÂNIA HACK DE ALMEIDA, ACOMPANHANDO A DIVERGÊNCIA, A TURMA, POR MAIORIA, VENCIDO O RELATOR, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E À REMESSA OFICIAL, PREJUDICADO O RECURSO DA PARTE AUTORA. LAVRARÁ O ACÓRDÃO O JUIZ FEDERAL OSNI CARDOSO FILHO, PRIMEIRO NA DIVERGÊNCIA.

RELATOR ACÓRDÃO:Juiz Federal OSNI CARDOSO FILHO
VOTO VISTA:Juiz Federal OSNI CARDOSO FILHO
VOTANTE(S):Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA

Gilberto Flores do Nascimento

Diretor de Secretaria


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