Ementa para citação:

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PRELIMINAR. PROVA DOS AUTOS. REJEIÇÃO. ATIVIDADE RURAL. TEMPO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. REQUISITOS.

1. Rejeitada a preliminar de produção de provas, uma vez que esta se confunde com o mérito da demanda devendo com este ser examinada.

2. Comprovado o exercício de atividade rural, na qualidade de segurado especial, mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea.

3. Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade da atividade laboral por ele exercida.

4. No caso dos autos, a parte autora tem direito à aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, porquanto implementados os requisitos para sua concessão.

(TRF4, APELREEX 2005.71.14.001276-1, Sexta Turma, Relatora Vânia Hack de Almeida, D.E. 31/03/2015)


INTEIRO TEOR

D.E.

Publicado em 06/04/2015

APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 2005.71.14.001276-1/RS

RELATORA:Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
APELANTE:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
ADVOGADO:Procuradoria Regional da PFE-INSS
APELADO:RENATO ZARPELON WEBER
ADVOGADO:Caroline Bozzetto
:Nei Antonio Di Domenico
REMETENTE:JUÍZO SUBSTITUTO DA 1A VF DE LAJEADO

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. PRELIMINAR. PROVA DOS AUTOS. REJEIÇÃO. ATIVIDADE RURAL. TEMPO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. REQUISITOS.

1. Rejeitada a preliminar de produção de provas, uma vez que esta se confunde com o mérito da demanda devendo com este ser examinada.

2. Comprovado o exercício de atividade rural, na qualidade de segurado especial, mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea.

3. Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade da atividade laboral por ele exercida.

4. No caso dos autos, a parte autora tem direito à aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, porquanto implementados os requisitos para sua concessão.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar de nulidade da sentença, dar parcial provimento à remessa oficial e à apelação do INSS, para que seja computado o período de 39 anos, 6 meses e 1 dia de tempo de serviço, e por adequar, de ofício, a correção monetária e determinar o cumprimento imediato do acórdão quanto à implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 25 de março de 2015.

Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA

Relatora


Documento eletrônico assinado por Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7346030v9 e, se solicitado, do código CRC 20B0C513.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): Vânia Hack de Almeida
Data e Hora: 25/03/2015 18:02

APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 2005.71.14.001276-1/RS

RELATORA:Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
APELANTE:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
ADVOGADO:Procuradoria Regional da PFE-INSS
APELADO:RENATO ZARPELON WEBER
ADVOGADO:Caroline Bozzetto
:Nei Antonio Di Domenico
REMETENTE:JUÍZO SUBSTITUTO DA 1A VF DE LAJEADO

RELATÓRIO

Cuida-se de apelação e reexame necessário de sentença em que o magistrado a quo julgou parcialmente procedente o pedido para – reconhecendo parte do período laborado na agricultura, sob regime de economia familiar, bem como a especialidade do labor prestado no período de 01/06/1983 até 13/06/2003 – conceder o benefício de aposentadoria por tempo de serviço proporcional à parte autora, condenando o Instituto Previdenciário ao pagamento das parcelas vencidas, a partir da data do requerimento na esfera administrativa, atualizadas e acrescidas de juros moratórios, bem como dos honorários advocatícios de 10% sobre o valor das parcelas vencidas, tendo em vista a sucumbência mínima da parte autora.

Da sentença, a parte autora interpôs embargos de declaração alegando a ocorrência de erro material.

Às fls. 315/316, os embargos de declaração foram julgados procedentes para que fosse corrigido erro material, devendo se entender que o autor conta com um tempo de serviço de 40 anos, 04 meses e 28 dias.

O INSS também interpôs embargos de declaração (fls. 319/320). Alegou a existência de contradição entre as informações prestadas pelo perito, no laudo técnico judicial juntado aos autos, com relação aos demais dados constantes nestes autos.

Os embargos de declaração foram rejeitados (fls. 321-326).

Apela o INSS, sustentando, em síntese: (a) preliminarmente, a existência de contradição entre as informações prestadas pelo perito, no laudo técnico judicial, e os demais dados constantes do processo, assim como divergência entre datas existentes na reclamatória trabalhista juntada aos autos, o DSS-8030 e o laudo pericial judicial; (b) inexistentes provas do alegado labor especial no período pleiteado; (c) descabe o fator de conversão 1,4, conforme deferido em sentença, sendo possível somente a conversão pelo fator 1,2, se mantida a sentença; (d) como o benefício foi deferido somente na esfera judicial, a data de início da aposentadoria não pode ser fixada desde a data do requerimento administrativo; (e) como a mora da Autarquia se deu desde a data da juntada do laudo pericial judicial, esse é o marco inicial de fixação dos juros moratórios. Requer a anulação da sentença, para que os autos sejam devolvidos à origem com a produção da prova requerida às fls. 287-288. Em caso da rejeição da preliminar, requer a reforma da decisão, julgando-se improcedentes os pedidos formulados na inicial. Sendo mantida a condenação, pleiteia a reforma da sentença “quanto ao fator de conversão utilizado e quanto à data de início do benefício, ou, sucessivamente, quanto ao marco inicial dos juros moratórios. Requer, por fim, haja inversão dos ônus de sucumbência ou a limitação da base de cálculo nos termos acima expostos.” (fl. 336)

Com contrarrazões e por força da remessa oficial, vieram os autos a esta Corte para julgamento.

À fl. 345, foi proferido despacho para deferir o pedido de renúncia de mandato.

À fl. 346, remetidos os autos ao GT-INSS, o réu se manifestou no sentido de não haver interesse de sua parte em acordo.

É o relatório.

VOTO

Remessa Oficial

Consoante decisão da Corte Especial do STJ (EREsp nº 934642/PR), em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o Instituto Nacional do Seguro Social só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos. No presente caso, remetidos os autos à Contadoria da Subseção Judiciária o Juízo Substituto da Vara do Juizado Especial Federal declinou da competência para a Vara Federal e Juizado Especial Federal Criminal Adjunto daquela Subseção de Lajeado (decisão da fl. 233), em razão dos valores apurados ultrapassarem sessenta salários mínimos. Assim, conheço da remessa oficial.

Prescrição Quinquenal

Não tendo transcorrido lapso superior a 5 (cinco) anos entre o requerimento administrativo (em 13/06/2003) e o ajuizamento da ação (19/04/2005), não há parcelas atingidas pela prescrição.

Preliminar

Requer a parte ré a anulação da sentença, para que os autos sejam devolvidos à origem com a produção da prova requerida às fls. 287-288. Alega o recorrente que na sentença trabalhista, juntada aos autos às fls. 64-69, consta que o autor teria começado a trabalhar como técnico agrícola e inseminador artificial somente a partir de 01/03/1984 até junho de 1991. Assim, pleiteou o envio de ofício à Prefeitura Municipal de Muçum para que fosse esclarecida a divergência entre datas. Referiu, também, que as atividades do autor se relacionavam com a orientação e assistência técnica, razão pela qual impugnou o laudo técnico judicial acostado aos autos.

Não merece acolhida a preliminar.

Com efeito, quanto à referida divergência entre datas não há falar em se considerar a sentença trabalhista, pois juntado aos autos o DSS-8030 assim como o laudo pericial judicial, sendo desnecessário o envio de ofício à Prefeitura Municipal de Muçum, a qual prestou tais informações posteriormente (em 2003 – fl. 62). Quanto ao fato de ter sido pleiteado o reconhecimento do labor na reclamatória somente até 1991 refira-se que a ação trabalhista foi julgada em 04/12/1992. No que se refere ao labor especial entendo ser irrelevante o esclarecimento quanto ao cargo exercido pelo autor uma vez que, de acordo com o Laudo Pericial Judicial, tanto como técnico agrícola quanto como inseminador estava ele submetido aos mesmos agentes nocivos, conforme adiante se demonstrará. Quanto aos demais aspectos do labor especial compreendo estar esse devidamente comprovado nos autos, de acordo com o que abaixo se desenvolverá, não se acolhendo a tese genérica de nulidade do Laudo Pericial Judicial. Dessa forma, considerado o fato de que a insurgência do réu se refere à prova produzida nos autos, entendo que a preliminar argüida pela Autarquia se confunde com o mérito da demanda devendo com este ser analisada.

Dessa forma, rejeito a preliminar.

Tempo de Atividade Rural

O trabalho rural como segurado especial dá-se em regime individual (produtor usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais) ou de economia familiar, este quando o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes (art. 11, VII e § 1º da Lei nº 8.213/91).

A atividade rural de segurado especial deve ser comprovada mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, e súmula 149 do STJ.

Desde logo ressalto que somente excluirá a condição de segurado especial a presença ordinária de assalariados – insuficiente a tanto o mero registro em ITR ou a qualificação como empregador rural (II b) – art. 1º, II, “b”, do Decreto-Lei 1166, de 15.04.71. Já o trabalho urbano do cônjuge ou familiar, relevante e duradouro, não afasta a condição de regime de economia familiar quando excluído do grupo de trabalho rural. Finalmente, a constitucional idade mínima de dezesseis nos para o trabalho, como norma protetiva, deve ser interpretada em favor do protegido, não lhe impedindo o reconhecimento de direitos trabalhistas ou previdenciários quando tenham efetivamente desenvolvido a atividade laboral.

Quanto ao início de prova material, necessário a todo reconhecimento de tempo de serviço (§ 3º do art. 56 da Lei nº 8.213/91 e Súmula 149/STJ), por ser apenas inicial, tem sua exigência suprida pela indicação contemporânea em documentos do trabalho exercido, embora não necessariamente ano a ano, mesmo fora do exemplificativo rol legal (art. 106 da Lei nº 8.213/91), ou em nome de integrantes do grupo familiar (Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental –Súmula 73 do TRF 4ª Região).

Nos casos de trabalhadores informais, especialmente em labor rural de bóia-fria, a dificuldade de obtenção de documentos permite maior abrangência na admissão do requisito legal de início de prova material, valendo como tal documentos não contemporâneos ou mesmo em nome terceiros (patrões, donos de terras arrendadas, integrantes do grupo familiar ou de trabalho rural). Se também ao bóia-fria é exigida prova documental do labor rural, o que com isto se admite é mais amplo do que seria exigível de um trabalhador urbano, que rotineiramente registra suas relações de emprego.

No caso concreto, a parte autora ingressou com a presente ação pretendendo o reconhecimento da atividade rural em regime de economia familiar nos períodos de 18/10/1969 a 31/12/1974, de 01/10/1976 a 03/11/1976, de 25/04/1977 a 30/04/1977 e de 05/08/1977 até 31/05/1983. A decisão considerou a parte autora carecedora da ação quanto aos períodos de 18/10/1971 a 31/12/1974 e de 01/09/1977 a 31/07/1983, pois já reconhecidos administrativamente como laborados no meio rural. Dessa forma, foi extinto o feito sem julgamento do mérito com relação a tais períodos, por ausência de interesse de agir, com fulcro no art. 267, VI, do CPC. A sentença também desconsiderou o período anterior ao ano de 1971, pois entendeu o MM. Juízo “a quo” que ausente início de prova material contemporânea, em que pese a prova testemunhal afirmar ter o autor laborado no meio rural desde a infância. Portanto, a sentença entendeu ter a parte autora laborado como segurado especial, em regime de economia familiar, somente nos períodos de 01/01/1971 a 17/10/1971 e de 01/10/1976 a 03/11/1976 e de 25/04/1977 até 30/04/1977. Nesse limite, irrecorrida a sentença, então, considerados os períodos de 01/01/1971 a 17/10/1971 e de 01/10/1976 a 03/11/1976 e de 25/04/1977 até 30/04/1977, examino a sentença.

Como início de prova material do labor rural juntou a parte autora os seguintes documentos:

– notas fiscais de produtor emitidas pelo pai do autor, relativas aos anos de 1971, 1973, 1974, 1975, 1976, 1977, 1978, 1979, 1980, 1981, 1982, 1983 (fls. 70-81);

– recibos de pagamento ao INCRA, relativos aos anos de 1972 e 1977.

Os documentos acima elencados correspondem ao início de prova material exigido para o reconhecimento da condição de segurado especial.

Da prova testemunhal

Na audiência de conciliação foram ouvidas as testemunhas, constando o seguinte:

Osmar Silvio Veber afirmou (fl. 207): “QUE conhece o autor desde a pequeno, pois sempre moraram próximos. QUE a distância entre a casa do autor e a casa do depoente é de cerca de mil e poucos metros. QUE o autor morava com os pais e irmãos. QUE o pai do autor chamava-se Clésio, e ele era agricultor. QUE o depoente via o autor trabalhando na terra quando passava pela propriedade. QUE não tinham empregados, apenas diarist

as por ocasião da colheita de soja. QUE a propriedade da família do autor devia ter cerca de noventa hectares. QUE plantavam milho para engordar porcos, soja, trigo, criavam vacas de leite e porcos. QUE a propriedade do autor tinha muitos morros, portanto pouco se aproveitava dos noventa hectares. QUE o autor ajudava os pais desde pequeno, com dez ou onze anos de idade. QUE nesta época o autor estudava pela manhã e trabalhava à tarde. QUE o autor não prestou serviço militar. QUE permaneceu trabalhando na agricultura até completar 25 ou 26 anos, quando foi para a cidade de Muçum trabalhar na prefeitura. QUE depois disso nunca mais retornou ao campo. Procurador(a) do(a) autor(a): QUE o depoente sabe que o pai do autor adquiriu uma propriedade em Xanxerê, Santa Catarina. QUE nesta época o autor e um irmão foram trabalhar nestas terras, onde permaneceram por cerca de dois anos. QUE após retornarem continuaram a trabalhar na roça…” 

Vilmar Zilio afirmou (fl. 208): “QUE conhece o autor desde criança, pois sempre foram vizinhos na localidade de linha Alegre. QUE nesta época o autor morava com os pais e cinco irmãos. QUE o pai do autor chamava-se Clésio, e ele era agricultor. QUE ainda hoje o pai do autor é agricultor. QUE a propriedade do autor distava cerca de 500 metros das terras do depoente. QUE se viam praticamente todos os dias. QUE toda a família do autor ajudava no trabalho da roça. QUE o autor devia ter cerca de sete ou oito anos de idade quando começou a ajudar os pais. QUE num turno estudavam e noutro iam para a roça. QUE a propriedade do autor devia ter cerca de 50 hectares, porém grande parte não era trabalhada em função da qualidade do solo e da presença de pedras. QUE plantavam soja, aipim, pipoca, criavam vacas de leite, porcos. QUE não tinham empregados e, ao que se recorda o depoente não faziam troca de serviço com vizinhos. QUE até completar 26 ou 27 anos de idade o autor permaneceu no campo. QUE depois disso foi para a cidade de Muçum, onde passou a exercer atividade urbana. QUE não sabe se o autor prestou serviço militar. Procurador(a) do(a) autor(a): QUE o depoente não tem certeza do local, mas sabe que uma parte da família do autor foi trabalhar em uma propriedade em Santa Catarina, onde permaneceram por cerca de dois anos…” 

A prova material juntada aos autos foi devidamente corroborada pela prova testemunhal. Assim, presente início de prova material, complementada por direta prova oral, no período controverso, devida é a admissão da condição da parte autora como segurada especial no período pretendido.

Desta forma, entendo que a parte autora logrou comprovar o exercício de atividade rural nos períodos de 01/01/1971 a 17/10/1971 e de 01/10/1976 a 03/11/1976 e de 25/04/1977 até 30/04/1977, resultando no acréscimo de: 10 meses e 26 dias.

 Tempo de Atividade Especial

O reconhecimento da especialidade de determinada atividade é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente uma lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.

Nesse sentido, aliás, é a orientação adotada pela Terceira Seção do Egrégio Superior Tribunal de Justiça (AR nº 3320/PR, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 24-09-2008; EREsp nº 345554/PB, Rel. Ministro José Arnaldo da Fonseca, DJ de 08-03-2004; AGREsp nº 493.458/RS, Quinta Turma, Rel. Ministro Gilson Dipp, DJU de 23-06-2003; e REsp nº 491.338/RS, Sexta Turma, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, DJU de 23-06-2003), que passou a ter expressa previsão legislativa com a edição do Decreto nº 4.827/2003, o qual alterou a redação do art. 70, §1º, do Decreto nº 3.048/99.

Feita essa consideração e tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, necessário inicialmente definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.

Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema sub judice:

a) no período de trabalho até 28-04-1995, quando vigente a Lei nº 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei nº 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (arts. 57 e 58), possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para os agentes nocivos ruído, frio e calor (STJ, AgRg no REsp nº 941885/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Jorge Mussi, DJe de 04-08-2008; e STJ, REsp nº 639066/RJ, Quinta Turma, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ de 07-11-2005), em que necessária a mensuração de seus níveis por meio de perícia técnica, carreada aos autos ou noticiada em formulário emitido pela empresa, a fim de se verificar a nocividade ou não desses agentes;

b) a partir de 29-04-1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional – à exceção daquelas a que se refere a Lei nº 5.527/68, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13-10-1996, dia anterior à publicação da Medida Provisória nº 1.523, que revogou expressamente a Lei em questão – de modo que, no interregno compreendido entre 29-04-1995 (ou 14-10-1996) e 05-03-1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei nº 9.032/95 no art. 57 da Lei de Benefícios, necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído, frio e calor, conforme visto acima;

c) a partir de 06-03-1997, data da entrada em vigor do Decreto nº 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Medida Provisória nº 1.523/96 (convertida na Lei nº 9.528/97), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.

d) a partir de 01-01-2004, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) passou a ser documento indispensável para a análise do período cuja especialidade for postulada (art. 148 da Instrução Normativa nº 99 do INSS, publicada no DOU de 10/12/2003). Tal documento substituiu os antigos formulários (SB-40, DSS-8030, ou DIRBEN-8030) e, desde que devidamente preenchido, inclusive com a indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica, exime a parte da apresentação do laudo técnico em juízo.

Para fins de enquadramento das categorias profissionais, devem ser considerados os Decretos nº 53.831/64 (Quadro Anexo – 2ª parte), nº 72.771/73 (Quadro II do Anexo) e nº 83.080/79 (Anexo II) até 28-04-1995, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal, ressalvadas as exceções acima mencionadas. Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos nº 53.831/64 (Quadro Anexo – 1ª parte), nº 72.771/73 (Quadro I do Anexo)

e nº 83.080/79 (Anexo I) até 05-03-1997, e os Decretos nº 2.172/97 (Anexo IV) e nº 3.048/99 a partir de 06-03-1997, ressalvado o agente nocivo ruído, ao qual se aplica também o Decreto nº 4.882/03. Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre possível também a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula nº 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGRESP nº 228832/SC, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJU de 30-06-2003).

Em relação aos agentes biológicos, saliente-se que segundo a jurisprudência dominante deste Tribunal, a exposição não precisa ocorrer durante toda a jornada de trabalho, uma vez que basta o contato de forma eventual para que haja risco de contração de doenças (EIAC nº 1999.04.01.021460-0, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, DJ de 05-10-2005, EINF 2005.72.10.000389-1, Terceira Seção, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 18/05/2011).

AGENTES BIOLÓGICOS – DR. CELSO KIPPER – 0017663-95.2014.404.9999, na divergência.

Oportuno referir que, para a caracterização da especialidade, não se reclama exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática laboral, sendo suficiente que o trabalhador, em cada dia de labor, esteja exposto a agentes nocivos em período razoável da jornada, salvo exceções (periculosidade, por exemplo). Caso se admitisse o contrário, chegar-se-ia ao extremo de entender que nenhum ofício faria jus àquela adjetivação, e, como é curial, o intérprete deve afastar a interpretação que o leve ao absurdo. Habitualidade e permanência hábeis para os fins visados pela norma – que é protetiva – devem ser analisadas à luz do serviço cometido ao trabalhador, cujo desempenho, não descontínuo ou eventual, exponha sua saúde à prejudicialidade das condições físicas, químicas, biológicas ou associadas que degradam o meio ambiente do trabalho.

Neste sentido, a Terceira Seção deste Tribunal já harmonizou seu entendimento:

PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. ATIVIDADE ESPECIAL. INSALUBRIDADE. COMPROVAÇÃO. EXPOSIÇÃO HABITUAL E PERMANENTE. PERÍODO ANTERIOR A ABRIL DE 1995. INSTALADOR HIDRÁULICO JUNTO A HOSPITAL.

1) Para caracterizar a especialidade, não há necessidade de haver exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática laboral. Habitualidade e permanência hábeis para os fins visados pela norma – que é protetiva – devem ser analisadas à luz do serviço cometido ao trabalhador, cujo desempenho, não descontínuo ou eventual, exponha sua saúde à prejudicialidade das condições físicas, químicas, biológicas ou associadas que degradam o meio ambiente do trabalho, como no caso de hospital.

2) É pacífico nesta Corte que, no período de trabalho até 28-04-95, quando vigente a Lei nº 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei nº 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (arts. 57 e 58), possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para ruído, em que necessária sempre a aferição do nível de decibéis por meio de perícia técnica, carreada aos autos ou noticiada em formulário emitido pela empresa, a fim de se verificar a nocividade ou não desse agente.

3) Embargos infringentes improvidos.

(EINF n. 2004.71.00.028482-6/RS, Rel. Des. Federal Luís Alberto D”Azevedo Aurvalle, D.E. de 08-01-2010)

EMBARGOS INFRINGENTES. ATIVIDADE ESPECIAL. INSALUBRIDADE. COMPROVAÇÃO. EXPOSIÇÃO HABITUAL E PERMANENTE RUÍDOS ACIMA DE 80 Db.

Prevaleceu o entendimento de que a exposição habitual e permanente a ruídos superiores a 80 dB caracteriza atividade especial, segundo o Decreto nº 53.831/64, deve ser aplicado o limite mais favorável ao segurado. Não há falar em eventualidade e intermitência, se a exposição ao agente nocivo é não-eventual, diurna e contínua; mesmo que durante parte de sua jornada de trabalho não haja contato ou presença de agentes insalutíferos, o trabalhador tem direito ao cômputo do tempo de serviço especial.

(EIAC n. 2000.04.01.088061-6/RS, Rel. Juiz Federal Fernando Quadros da Silva, DJU 03-03-2004)

Também foi reconhecida a especialidade das atividades exercidas com exposição a hidrocarbonetos Registre-se que, quanto à exposição aos hidrocarbonetos, a jurisprudência desta Turma orienta-se no sentido de que a análise é qualitativa e a exposição habitual, ainda que intermitente, é suficiente para caracterizar a especialidade do labor, pois “o contato com esses agentes (graxas, óleos minerais, hidrocarbonetos aromáticos, combustíveis, solventes, inseticidas, etc) é responsável por frequentes dermatoses profissionais, com potencialidade de ocasionar afecções inflamatórias e até câncer cutâneo em número significativo de pessoas expostas, em razão da ação irritante da pele, com atuação paulatina e cumulativa, bem como irritação e dano nas vias respiratórias quando inalados e até efeitos neurológicos, quando absorvidos e distribuídos através da circulação do sangue no organismo. Isto para não mencionar problemas hepáticos, pulmonares e renais” (TRF4, APELREEX 0002033-15.2009.404.7108, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 12/07/2011).

Cumpre referir que a habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91 não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, devendo ser interpretada no sentido de que tal exposição deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual, ocasional. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho, e em muitas delas a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível. A propósito do tema, vejam-se os seguintes precedentes da Terceira Seção deste Tribunal: EINF n.º 0003929-54.2008.404.7003, de relatoria do Desembargador Federal Néfi Cordeiro, D.E. 24/10/2011; EINF n.º 2007.71.00.046688-7, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 07/11/2011.

Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (TRF4, EINF 2005.72.10.000389-1, Terceira Seção, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 18/05/2011; TRF4, EINF 2008.71.99.002246-0, Terceira Seção, Relator Luís Alberto D”Azevedo Aurvalle, D.E. 08/01/2010).

O deferimento da aposentadoria especial à parte autora na condição de contribuinte individual, e não na de trabalhador empregado que presta serviços a pessoa jurídica, ou como cooperado filiado à cooperativa de trabalho ou de produção, não afronta o disposto nos artigos 57, §§ 6° e 7°, da Lei 8.213/91 e 22, inciso III, da Lei 8.212/91, nem viola o disposto no artigo 64 do Decreto 3.048/99.

No caso dos autos, o labor especial controverso está assim detalhado:

Períodos:01/06/1983 até 13/06/2003
Empresa:Prefeitura Municipal de Muçum/RS
Função/Atividades:Técnico Agrícola e Inseminador Artificial
Agentes Nocivos:Agentes biológicos (carbúnculo, brucela, mormo e tétano – operações industriais com animais ou produtos oriundos de animais infectados – trabalhos permanentes expostos ao contato com germes infecciosos – assistência veterinária, serviços em matadouros, cavalariças e outros no manejo de animais na aplicação de vacinas e medicamentos, procedimentos cirúrgicos, inseminação artificial e outras técnicas cirúrgicas, sob supervisão de médico veterinário); Agentes Químicos Tóxicos (na aplicação de fungicidas, inseticidas clorados, bem como outros defensivos derivados de carbono – hidrocarbonetos) 
Enquadramento Legal:Códigos 1.3.1 e 1.2.11 do Quadro Anexo III do Decreto nº 53.831/64; Código 1.2.10 do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73; Códigos 1.2.10, 1.2.11, 1.3.1 e 1.3.2 do Anexo I do Quadro I do Decreto nº 83.080/79; Código e 3.0.1 do Anexo IV do Decreto nº 2.172/97; Código 3.0.1 do Anexo IV do Decreto nº 3.048/99
Provas:DSS-8030 (fl. 62); atestado da fl. 63, emitido por médico veterinário da Secretaria da Agricultura e Abastecimento; Laudo Pericial Judicial das fls. 276-281.
Conclusão:Restou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua exposição aos agentes nocivos indicados.

Então, a sentença deve ser mantida quanto ao reconhecimento da especialidade das atividades da parte autora no período de 01/06/1983 até 13/06/2003.

 Uso de Equipamento de Proteção

No que concerne ao uso de equipamento de proteção individual ou coletiva pelo segurado para a neutralização dos agentes nocivos e, por conseguinte, a descaracterização do labor em condições especiais, esta 6ª Turma tem adotado os seguintes parâmetros:

(a) Ruído: a exposição habitual e permanente a níveis de ruído acima dos limites de tolerância estabelecidos na legislação pertinente à matéria sempre caracteriza a atividade como especial, independentemente da utilização ou não de EPI, ou de menção em laudo pericial à neutralização de seus efeitos nocivos. Isso porque os EPIs, mesmo que consigam reduzir o ruído a níveis inferiores aos estabelecidos nos referidos decretos, não têm o condão de deter a progressão das lesões auditivas decorrentes da exposição ao referido agente.

(b) Demais agentes: a utilização de equipamento de proteção somente descaracterizará a especialidade da atividade se comprovada, por laudo técnico, a sua real efetividade, e demonstrado nos autos o seu uso permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho, consoante entendimento do Superior Tribunal de Justiça (AgRg no AREsp nº 174.282/SC, Segunda Turma, Rel. Ministro Humberto Martins, DJe 28-06-2012; Resp nº 1.108.945/RS, Quinta Turma, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe 23-06-2009).

No caso concreto, não restou comprovado nos autos a efetiva e permanente utilização dos equipamentos de proteção pelo segurado durante a jornada de trabalho.

Não se desconhece que a descaracterização do tempo de serviço como especial pelo uso de equipamento de proteção individual (EPI) foi tema reconhecido com repercussão geral pelo STF sob o número 555 e que sua discussão será feita à luz do § 5° do artigo 195 e do § l e caput do artigo 201 da Constituição Federal.

Entretanto, é entendimento desta Corte que o uso dos equipamentos de proteção contra a insalubridade não descaracteriza a especialidade do trabalho e, neste sentido, não há que se falar em ofensa aos dispositivos constitucionais supracitados.

Fonte de Custeio

No tocante à concessão do benefício sem a correspondente fonte de custeio, transcrevo trecho do bem lançado voto do Des. Federal Celso Kipper (Apelação Cível nº 0014748-78.2011.404.9999/RS), que bem traduz o entendimento desta Corte acerca da questão em debate:

 

“(…)

A teor do art. 195, § 5º, da Constituição Federal, nenhum benefício da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total.

No entanto, para a concessão de aposentadoria especial ou conversão de tempo exercido sob condições especiais em tempo de trabalho comum, previstas nos artigos 57 e 58 da Lei de benefícios, existe específica indicação legislativa de fonte de custeio: o parágrafo 6º do mesmo art. 57 supracitado, combinado com o art. 22, inc. II, da Lei n. 8.212/91, os quais possuem o seguinte teor:

“Art. 57 – (…)

§ 6º – O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inc. II do art. 22 da Lei 8.212, de 24/07/91, cujas alíquotas serão acrescidas de 12, 9 ou 6 pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após 15, 20 ou 25 anos de contribuição, respectivamente.

Art. 22 – (…)

II – para o financiamento do benefício previsto nos arts. 57 e 58 da Lei 8.213/91, e daqueles concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, sobre o total das remunerações pagas ou creditadas, no decorrer do mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos:

a) 1% para as empresas em cuja atividade preponderante o risco de acidentes do trabalho seja considerado leve;

b) 2% para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado médio;

c) 3% para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado grave.”

Não vejo óbice ao fato de a lei indicar como fonte do financiamento da aposentadoria especial e da conversão de tempo especial em comum as contribuições a cargo da empresa, pois o art. 195, caput e incisos, da Constituição Federal, dispõe que a seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e, dentre outras ali elencadas, das contribuições sociais do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei.

Por fim, ressalto que, a rigor, sequer haveria, no caso, necessidade de específica indicação legislativa da fonte de custeio, uma vez que se trata de benefício previdenciário previsto pela própria Constituição Federal (art. 201, § 1º c/c art. 15 da EC n. 20/98), hipótese em que sua concessão independe de identificação da fonte de custeio (STF, RE n. 220.742-6, Segunda Turma, Rel. Ministro Néri da Silveira, julgado em 03-03-1998; RE n. 170.574, Primeira Turma, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence, julgado em 31-05-1994; AI n. 614.268 AgR, Primeira Turma, Rel. Ministro Ricardo Lewandowski, julgado em 20-11-2007; ADI n. 352-6, Plenário, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence, julgada em 30-10-1997; RE n. 215.401-6, Segunda Turma, Rel. Ministro Néri da Silveira, julgado em 26-08-1997; AI n. 553.993, Rel. Ministro Joaquim Barbosa, decisão monocrática, DJ de 28-09-2005), regra esta dirigida à legislação ordinária posterior que venha a criar novo benefício ou a majorar e estender benefício já existente.”

Continuidade no exercício de atividade especial

Não é o caso de permitir a incidência do disposto no artigo 57, § 8°, da Lei 8.213/91, que condiciona a concessão da aposentadoria especial ao afastamento do segurado da atividade insalubre que vem desenvolvendo, tendo-se em conta a conclusão do julgamento do Incidente de Inconstitucionalidade n° 5001401-77.2012.404.0000 por esta Corte, que acolheu sua invalidade frente ao disposto nos artigos 5°, inciso XIII, inciso XXXIII e 201, § 1°, da Constituição Federal.

Nesse contexto, resta assegurado à parte autora o direito à percepção do benefício de aposentadoria especial independentemente de seu afastamento das atividades laborais sujeitas a condições nocivas.

Conversão do tempo de serviço especial para comum

Inicialmente, cumpre ressaltar que esta Corte já firmou entendimento no sentido de que é possível a conversão do tempo especial para comum, mesmo com relação aos períodos anteriores ao advento da Lei nº 6.887, de 10-12-1980.

No que tange à possibilidade de conversão de tempo de serviço especial prestado a partir de 28-05-1998, a Medida Provisória nº 1.663/98 revogou o §5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91. Todavia, a Lei 9.711/98 deixou de convalidar a prefalada revogação, por via expressa ou tácita, motivo pelo qual plena é a vigência dos artigos 57 e 58 da Lei de Benefícios e, por conseguinte, possível a conversão de tempo de serviço especial em comum inclusive após 28-05-1998.

Quanto ao fator de conversão, pacífico é o entendimento de que, em casos como o presente, onde os requisitos da aposentadoria foram implementados durante a vigência da Lei n. 8.213, de 24-07-1991, devem ser aplicados a todo o período laboral os fatores de conversão previstos no artigo 64 do Decreto nº 357/91, que regulamenta o referido diploma legal.

Desta forma, admitida a especialidade da atividade desenvolvida no período de 01/06/1983 até 13/06/2003, impõe-se a conversão pelo fator multiplicador 1,4 par

a 25 anos de especial, totalizando o acréscimo de 8 anos e 4 meses.

Assim, não merece guarida o recurso do INSS no ponto em que pleiteia seja aplicado o fator multiplicador de 1,2.

Da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição

Analiso, pois, a possibilidade de concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.

Considerando-se o tempo de labor reconhecido e tendo-se em vista a data do protocolo do requerimento administrativo, resta analisar o preenchimento dos requisitos para a concessão da aposentadoria pleiteada frente às regras dispostas pela Emenda Constitucional nº 20, em vigor desde 16-12-1998.

Tem-se, pois, as seguintes possibilidades:

(a) concessão de aposentadoria por tempo de serviço proporcional ou integral, com o cômputo do tempo de serviço até a data da Emenda Constitucional nº 20, de 16-12-1998, cujo salário de benefício deverá ser calculado nos termos da redação original do art. 29 da Lei nº 8.213/91: exige-se o implemento da carência (art. 142 da Lei nº 8.213/91) e do tempo de serviço mínimo de 25 anos para a segurada e 30 anos para o segurado (art. 52 da Lei de Benefícios), que corresponderá a 70% do salário de benefício, acrescido de 6% (seis por cento) para cada ano de trabalho que superar aquela soma, até o máximo de 100%, que corresponderá à inativação integral (art. 53, I e II da LBPS);

(b) concessão de aposentadoria por tempo de contribuição proporcional ou integral, com o cômputo do tempo de contribuição até 28-11-1999, dia anterior à edição da Lei que instituiu o fator previdenciário, cujo salário de benefício deverá ser calculado nos termos da redação original do art. 29 da Lei nº 8.213/91: exige-se o implemento da carência (art. 142 da Lei nº 8.213/91) e do tempo de contribuição mínimo de 25 anos para a segurada e 30 anos para o segurado, e a idade mínima de 48 anos para a mulher e 53 anos para o homem, além, se for o caso, do pedágio de 40% do tempo que, em 16-12-1998, faltava para atingir aquele mínimo necessário à outorga do benefício (art. 9.º, § 1.º, I, “a” e “b”, da Emenda Constitucional nº 20, de 1998), que corresponderá a 70% do salário de benefício, acrescido de 5% (cinco por cento) para cada ano de trabalho que superar aquela soma, até o máximo de 100%, que corresponderá à inativação integral (inciso II da norma legal antes citada); contudo, se o segurado obtiver tempo suficiente para a concessão do benefício de forma integral até 28-11-1999, ou seja, 35 anos para homem e 30 anos para mulher, o requisito etário e o pedágio não lhe podem ser exigidos;

(c) concessão de aposentadoria por tempo de contribuição integral, com o cômputo do tempo de contribuição até a data do requerimento administrativo, quando posterior às datas dispostas nas alíneas acima referidas: exige-se o implemento da carência (art. 142 da Lei nº 8.213/91) e do tempo de serviço mínimo de 30 anos para a segurada e 35 anos para o segurado (art. 201, § 7.º, I, da Constituição Federal de 1988), que corresponderá a 100% do salário de benefício, a ser calculado nos termos do inciso I do art. 29 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 9.876/99.

No caso concreto, o resultado da soma do tempo de serviço/contribuição reconhecido pela administração previdenciária, com o tempo de serviço/contribuição reconhecido judicialmente demonstra que:

(a) Em 16-12-1998, a parte autora possuía 33 anos, 2 meses e 18 dias, preenchia a carência necessária (102 meses: artigo 142 da Lei 8.213/91), tendo direito à aposentadoria por tempo de serviço proporcional.

(b) Em 28-11-1999, a parte autora possuía 34 anos, 6 meses e 1 dia não preenchia o requisito etário, não tendo direito à aposentadoria por tempo de contribuição proporcional.

(c) Em 13/06/2003 (DER), a parte autora possuía 39 anos, 6 meses e 1 dia de tempo de serviço, tendo direito à aposentadoria por tempo de contribuição integral.

Quanto ao tempo de serviço do autor, tendo em vista o julgamento dos embargos de declaração interpostos pela parte autora e julgados às fls. 315/316, deve ser dado parcial provimento à remessa oficial, uma vez que o autor totalizou um tempo de serviço inferior aos 40 anos, 04 meses e 28 dias (fls. 315/316), totalizando na data da DER (em 13/06/2003) 39 anos, 6 meses e 1 dia.

No que se refere ao marco inicial do benefício, os efeitos financeiros devem, em regra, retroagir à data do requerimento administrativo, respeitada eventual prescrição quinquenal, porquanto esta Corte tem considerado que desimporta se naquela ocasião o feito foi instruído adequadamente, ou mesmo se continha, ou não, pleito de reconhecimento do tempo de serviço especial posteriormente admitido na via judicial, sendo relevante para essa disposição o fato de a parte, àquela época, já ter incorporado ao seu patrimônio jurídico o benefício nos termos em que deferido. Dessa forma, não se acolhe o recurso do INSS no ponto.

Assim, o melhor dos benefícios ao qual a parte autora tem direito deverá ser concedido, tendo como termo inicial a data do protocolo do requerimento administrativo.

Conclusão

Dessa forma, rejeito a preliminar de nulidade da sentença, devendo ser reformada a decisão quanto ao tempo de serviço do autor, o qual totaliza 39 anos, 6 meses e 1 dia, o que enseja o parcial provimento da remessa oficial e do recurso do INSS.

Consectários

a) Correção monetária e juros de mora:

De início, esclareço que a correção monetária e os juros de mora, sendo consectários da condenação principal, possuem natureza de ordem pública e podem ser analisados até mesmo de ofício. Assim, sequer há que se falar em reformatio in pejus.

As prestações em atraso serão corrigidas, desde o vencimento de cada parcela, ressalvada a prescrição quinquenal, utilizando-se os seguintes indexadores: INPC (março/91 a dezembro/92), IRSM (janeiro/93 a fevereiro/94), URV (março/94 a junho/94), IPC-r (julho/94 a junho/95), INPC (julho/95 a abril/96), IGP-DI, de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei nº 9.711/98 e art. 20, §§ 5º e 6º, da Lei nº 8.880/94) e INPC, a partir de 04/2006 (art. 31 da Lei nº 10.741/03, c/c a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11-08-2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91, e REsp. n.º 1.103.122/PR).

Os juros de mora são devidos a contar da citação, à razão de 1% ao mês (Súmula n.º 204 do STJ e Súmula 75 desta Corte) e, desde 01/07/2009 (Lei nº 11.960/2009), passam a ser calculados com base na taxa de juros aplicáveis à caderneta de poupança (RESP 1.270.439).

Não incide a Lei nº 11.960/2009 para correção monetária dos atrasados (correção equivalente à poupança) porque declarada inconstitucional (ADIs 4.357 e 4.425/STF), com efeitos erga omnes e ex tunc – e mesmo eventual modulação não atingirá processos de conhecimento, como é o caso presente.

Destaco ser evidente que, em razão da inconstitucionalidade declarada pela STF, os índices de remuneração básica aplicados à caderneta de poupança como índice de correção monetária foi erradicado do ordenamento jurídico, não havendo como deixar de observar a decisão da Suprema Corte no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, com efeito erga omnes e eficácia vinculante, independentemente de eventual modulação de efeitos.

A propósito, o próprio Supremo Tribunal Federal já está aplicando o precedente firmado no julgamento da ADI 4.357, como se percebe do seguinte precedente:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO – IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DO ÍNDICE OFICIAL DE REMUNERAÇÃO BÁSICA DA CADERNETA DE POUPANÇA COMO CRITÉRIO DE CORREÇÃO MONETÁRIA DOS DÉBITOS FAZENDÁRIOS SUJEITOS AO REGIME DE EXECUÇÃO INSCRITO NO ART. 100 DA CF/88 – DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL DO § 12 DO ART. 100 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, NA REDAÇÃO DADA PELA EC Nº 62/20

09 – DIRETRIZ JURISPRUDENCIAL FIRMADA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO.

(RE 747727 AgR / SC. Relator(a): Min. CELSO DE MELLO. Julgamento: 06/08/2013. Órgão Julgador: Segunda Turma)

Em relação à medida cautelar relativa à reclamação 16.745/DF, importa consignar, ainda, que ela se deu apenas no sentido de assegurar a continuidade dos pagamentos de precatórios na forma como vinham sendo pagos antes da decisão invocada, o que não obsta que eventualmente se prossiga com a execução das diferenças decorrentes da aplicação correta do índice.

Logo, impõe-se a adequação, de ofício, da sentença no ponto.

b) Honorários advocatícios:

Mantenho a condenação do INSS ao pagamento dos honorários advocatícios no percentual de 10% sobre as parcelas vencidas até a decisão judicial concessória do benefício previdenciário pleiteado (Súmula nº 76 do TRF4 e nº 111 do STJ), tendo em vista a sucumbência mínima da parte autora.

Tutela Específica

Considerando os termos do art. 461 do CPC e o fato de que, em princípio, a presente decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7/RS – Rel. p/ acórdão Desemb. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007 – 3ª Seção), o presente julgado deverá ser cumprido de imediato quanto à implantação do benefício postulado. Prazo: 45 dias.

Prequestionamento

Quanto ao prequestionamento, não há necessidade de o julgador mencionar os dispositivos legais e constitucionais em que fundamenta sua decisão, tampouco os citados pelas partes, pois o enfrentamento da matéria através do julgamento feito pelo Tribunal justifica o conhecimento de eventual recurso pelos Tribunais Superiores (STJ, EREsp nº 155.621-SP, Corte Especial, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 13-09-99).

Dispositivo

Ante o exposto, voto por rejeitar a preliminar de nulidade da sentença, dar parcial provimento à remessa oficial e à apelação do INSS, para que seja computado o período de 39 anos, 6 meses e 1 dia de tempo de serviço, e por adequar, de ofício, a correção monetária e determinar o cumprimento imediato do acórdão quanto à implantação do benefício.

É o voto.

Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA

Relatora


Documento eletrônico assinado por Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7346029v23 e, se solicitado, do código CRC D6E83D95.
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Signatário (a): Vânia Hack de Almeida
Data e Hora: 25/03/2015 18:02

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 25/03/2015

APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 2005.71.14.001276-1/RS

ORIGEM: RS 200571140012761

RELATOR:Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
PRESIDENTE:Desembargador Federal CELSO KIPPER
PROCURADOR:Procurador Regional da República Paulo Gilberto Cogo Leivas
APELANTE:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
ADVOGADO:Procuradoria Regional da PFE-INSS
APELADO:RENATO ZARPELON WEBER
ADVOGADO:Caroline Bozzetto
:Nei Antonio Di Domenico
REMETENTE:JUÍZO SUBSTITUTO DA 1A VF DE LAJEADO

Certifico que este processo foi incluído no Aditamento da Pauta do dia 25/03/2015, na seqüência 406, disponibilizada no DE de 11/03/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.

Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU REJEITAR A PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA, DAR PARCIAL PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL E À APELAÇÃO DO INSS, PARA QUE SEJA COMPUTADO O PERÍODO DE 39 ANOS, 6 MESES E 1 DIA DE TEMPO DE SERVIÇO, E POR ADEQUAR, DE OFÍCIO, A CORREÇÃO MONETÁRIA E DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO QUANTO À IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.

RELATOR ACÓRDÃO:Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
VOTANTE(S):Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
:Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
:Des. Federal CELSO KIPPER

Gilberto Flores do Nascimento

Diretor de Secretaria


Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7445803v1 e, se solicitado, do código CRC F60D199.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): Gilberto Flores do Nascimento
Data e Hora: 25/03/2015 18:20

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