Ementa para citação:

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. SEGURADO ESPECIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. TUTELA ESPECÍFICA.

1. Restando comprovado nos autos, mediante início de prova material corroborado pela prova testemunhal, o requisito idade e o exercício da atividade laborativa rural, no período de carência, é de ser concedida aposentadoria por idade rural. 2. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 461 do CPC, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo).

(TRF4, APELREEX 0018859-03.2014.404.9999, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 28/11/2014)


INTEIRO TEOR

D.E.


Publicado em 01/12/2014

APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0018859-03.2014.404.9999/PR

RELATOR:Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
ADVOGADO:Procuradoria Regional da PFE-INSS
APELADO:MITSUNO YAMAMOTO
ADVOGADO:Ricardo Rossi
REMETENTE:JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE ARAPONGAS/PR

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. SEGURADO ESPECIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. TUTELA ESPECÍFICA.

1. Restando comprovado nos autos, mediante início de prova material corroborado pela prova testemunhal, o requisito idade e o exercício da atividade laborativa rural, no período de carência, é de ser concedida aposentadoria por idade rural. 2. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 461 do CPC, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo).

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso do INSS e à remessa oficial, e determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 19 de novembro de 2014.

Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

Relator



Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7128608v4 e, se solicitado, do código CRC 42F5DB7D.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): João Batista Pinto Silveira
Data e Hora: 21/11/2014 16:04


APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0018859-03.2014.404.9999/PR

RELATOR:Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
ADVOGADO:Procuradoria Regional da PFE-INSS
APELADO:MITSUNO YAMAMOTO
ADVOGADO:Ricardo Rossi
REMETENTE:JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE ARAPONGAS/PR

RELATÓRIO

Cuida-se de remessa oficial e apelação interposta em face da sentença que julgou procedente a demanda, condenando o INSS a:

a) conceder à parte autora o benefício de aposentadoria rural por idade na condição de segurado especial, no valor de um salário mínimo, a partir da data de entrada do requerimento administrativo (08/10/2008 – fl. 42);

b) pagar as parcelas vencidas até a data da implantação do benefício, sendo que as parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente, em conformidade com os índices oficiais; quanto aos juros moratórios incidirão a partir da citação, à taxa de 1% ao mês e, a partir de 30/06/2009 os juros e a correção monetária deverão ser calculados na forma do art. 1º-F da lei 9.494/97, com a alteração dada pela Lei nº 11.960/09;

c) pagar custas judiciais, despesas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas (Súmula 111 do STJ).

Apela a Autarquia Previdenciária, postulando a reforma do julgado. Sustenta, preliminarmente, a incidência de prescrição quinquenal. No mérito, sustenta a impossibilidade de concessão do benefício pleiteado ao fundamento de que as provas juntadas aos autos não são suficientes para a comprovação do trabalho rural da autora, no período correspondente à carência do benefício. Aduz que está descaracterizado o regime de economia familiar, seja pelo enquadramento do cônjuge da autora como “empregador rural” pelo Sindicato da categoria, seja pela extensão das terras e a idade avançada da autora e seu cônjuge, presumindo-se o auxílio de terceiros. Ao final, requer a aplicação do comando da Lei nº 11.960/09 na parte dispositiva do voto.

Regularmente processado o feito, subiram os autos a esta corte.

É o relatório.

VOTO

É caso de reexame necessário, porque não há condenação em valor certo, de modo que não incide a exceção do art. 475, § 2.º do CPC. Aplica-se a Súmula n.º 490 do STJ.

Da prescrição quinquenal

A nova redação do art. 103 da Lei n.º 8.213/91 contempla, em seu caput, hipótese de prazo decadencial no que respeita à revisão de ato concessório e, no seu parágrafo único, caso de prazo prescricional quanto ao recebimento de créditos devidos aos segurados, sendo que a diferença de tratamento da matéria encontra-se cristalizada, atualmente, no enunciado n.º 85 do Superior Tribunal de Justiça.

Assim, não se cuidando da hipótese descrita no caput, apenas as parcelas anteriores ao quinquênio que antecede a propositura da ação é que são alcançadas pela prescrição.

Desse modo, tendo o feito sido ajuizado em 17/03/2010 (fl. 01) e o requerimento administrativo realizado em 08/10/2008 (fl. 42), inexistem parcelas atingidas pela prescrição.

A questão controversa nos presentes autos cinge-se acerca do direito da parte autora à concessão de APOSENTADORIA POR IDADE RURAL, desde a data de entrada do requerimento administrativo (08/10/2008 – fl. 42).

Primeiramente, cumpre esclarecer o conceito de segurado especial.

A área do imóvel rural não se constitui fator determinante do conceito de segurado especial, porquanto, para fins de concessão de benefício previdenciário a essa espécie de segurado, a legislação determina que as atividades rurais sejam exercidas individualmente ou em regime de economia familiar, dispondo, ainda, o artigo 11, que:

Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:

(omissis)

VII – como segurado especial: o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o garimpeiro, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 (quatorze) anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo.

§ 1º – Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados.

Como se vê, não há imposição, na norma previdenciária, seja o trabalho rural, do segurado especial, vinculado à dimensão de terras em que exercida a atividade agrícola. Ademais, não está na definição de regime de economia familiar a extensão da propriedade, requisito específico da Lei 4.504/64 (Estatuto da Terra) que regula os direitos e obrigações concernentes aos bens imóveis rurais, precipuamente, para fins de execução de reforma Agrária e promoção da Política Agrícola, não se mostrando, assim, razoável descaracterizar a condição de segurado especial do requerente com fundamento na extensão da propriedade explorada por sua família.

A eventual classificação como “empregador rural II-B” no certificado de cadastro do INCRA, do mesmo modo, não significa necessariamente a descaracterização do regime de economia familiar, pois tal classificação geralmente é baseada no tamanho da propriedade, sem considerar a efetiva existência de empregados permanentes. O cerne da questão está no Decreto-Lei 1166, de 15/04/71, que dispõe sobre enquadramento e contribuição sindical rural, cujo artigo 1º dispõe que:

Art. 1º. Para efeito do enquadramento sindical, considera-se:

I – omissis

II – empresário ou empregador rural:

a) a pessoa física ou jurídica que tendo empregado, empreende, a qualquer título, atividade econômica rural;

b) quem, proprietário ou não e mesmo sem empregado, em regime de economia familiar, explore imóvel rural que lhe absorva toda a força de trabalho e lhe garanta a subsistência e progresso social e econômico em área igual ou superior à dimensão do módulo rural da respectiva região;

c) os proprietários de mais de um imóvel rural, desde que a soma de suas áreas seja igual ou superior à dimensão do módulo rural da respectiva região.

Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. LEI Nº 8.213/91. DER POSTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI Nº 9.032/95. RECURSOS PRINCIPAL E ADESIVO. INTEMPESTIVIDADE. EMPREGADOR RURAL II-B. EXTENSÃO DA PROPRIEDADE. JUROS MORATÓRIOS. CUSTAS PROCESSUAIS.

1. Recurso de apelo interposto pelo INSS de forma extemporânea não conhecido, seguindo a mesma sorte o adesivo, por força do disposto no art. 500 do CPC.

2. O fato de constar empregador II-B nos respectivos recibos de ITR não significa a condição de empregador rural. A denominação constante dos certificados de cadastro perante o INCRA não desconfigura a condição de trabalho agrícola em regime de economia familiar.

3. Inexiste na legislação previdenciária qualquer menção à extensão da propriedade ou sua localização em zona rural como elementos necessários ao reconhecimento da prestação de labor rural em regime de economia familiar.

4. Considera-se comprovado o exercício de atividade rural havendo início razoável de prova material contemporânea ao período laboratício, corroborada por prova testemunhal idônea e consistente.

5 – 8. Omissis.

(TRF 4ª Região, AC n° 200404010044583/RS, 5ª Turma, Relator(a) JUIZ OTÁVIO ROBERTO PAMPLONA, DJU:16/03/2005, p. 762)

Além disso, o auxílio de terceiros (vizinhos, boias-frias) em determinados períodos não elide o direito postulado, consoante o inciso VII do art. 11 da Lei n° 8.213/91, visto que se trata de prática comum no meio rural.

Outrossim, o fato de o imóvel, hoje, se localizar em zona urbana ou de o requerente residir em zona urbana, por si só, não descaracteriza a sua condição de segurado especial. Nesse sentido, já se manifestou esta e. Corte, senão vejamos:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. DOCUMENTOS EM NOME DE TERCEIROS. AGRICULTOR RESIDENTE NA ZONA URBANA. ADMISSIBILIDADE.

1. Os documentos em nome de terceiros (pais/cônjuge) consubstanciam início de prova material do trabalho rural desenvolvido em regime de economia familiar, independentemente do agricultor residir na zona urbana ou na zona rural no próprio imóvel em que exerce suas funções.

2. Para a concessão de aposentadoria rural por idade, necessário o preenchimento do requisito de idade mínima (55 anos para a mulher) e a prova do exercício da atividade rural no período de carência, de acordo com a tabela constante do art. 142 da Lei nº 8.213/91.

3. Demonstrada a atividade rural através de início razoável de prova material, complementada por testemunhos idôneos colhidos em juízo, a parte autora faz jus ao benefício pleiteado.

4. O fato de a autora residir na cidade não descaracteriza a sua condição de segurada especial, porquanto o que define essa condição é o exercício de atividade rural independentemente do local onde o trabalhador possui residência.(grifei)

(EIAC nº 16045/PR, TRF4, 3ª Seção, Rel. Juiz Ricardo Teixeira do Valle Pereira, DJU de 11/02/2004, p.325)

Por fim, ressalta-se que o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural também não serve para descaracterizar automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício, pois, ainda que considerado como trabalhador rural individual, sua situação encontra guarida no art. 11, VII, da Lei n° 8.213/91, sendo certo também que incumbia à Autarquia a prova de que a subsistência da família era garantida pelo salário do cônjuge, e não pela atividade rural desenvolvida pelo requerente.

A concessão de aposentadoria rural por idade, devida a partir da DER, está condicionada à comprovação do implemento da idade mínima exigida, de sessenta anos para o homem e de cinqüenta e cinco anos para a mulher, e do labor rural correspondente ao período de carência relativo ao ano da data de entrada do requerimento administrativo (DER entre 01-09-1994 e 28-4-1995) ou relativo ao ano em que cumprido o requisito etário (na vigência da Lei n° 9.032/95, a partir de 29-04-1995), contado retroativamente à data da implementação dos requisitos, ainda que a atividade se dê de forma descontínua, não importando que após preenchidos tais pressupostos, sobrevenha a perda daquela condição, a teor do art. 102, § 1º da Lei de Benefícios. A concessão do benefício independe, pois, de recolhimento de contribuições previdenciárias.

No caso em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31-08-1994 (data da publicação da Medida Provisória n. 598, que introduziu alterações na redação original do art. 143 da Lei de Benefícios, sucessivamente reeditada e posteriormente convertida na Lei n. 9.063/95), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 anos (60 meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei nº 8.213/91.

Quanto à demonstração do exercício da atividade rural, encontra-se averbado no parágrafo 3º do art. 55 da Lei de Benefícios da Previdência que a comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento.

Complementando a matéria, cuidou o legislador de elencar no art. 106 do mesmo Diploma os meios destinados à demonstração do exercício da atividade rural e, ainda que se entenda o referido rol meramente enunciativo, à evidência, alguma prova material há de ser produzida.

Registra-se que o início de prova material, consoante interpretação sistemática da lei, será feito mediante documentos que comprovem o exercício da atividade rural, devendo ser contemporâneos ao período de carência, ainda que parcialmente.

De outro modo, não há impedimento a que sejam considerados os documentos emitidos em período próximo ao controverso, desde que indiquem a continuidade da atividade rural.

Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, consubstanciam início de prova material do labor rural, de acordo com a Súmula n° 73, desta Corte, haja vista que o trabalho com base em uma única unidade produtiva tem como regra a documentação emitida em nome de uma única pessoa.

Tal orientação, agora sumulada, decorre da própria interpretação possibilitada pelo art. 11 da Lei de Benefícios, que define o regime de economia familiar como aquele em que os membros da família exercem “em condições de mútua dependência e colaboração”, sendo certo, repita-se, que os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome do pater familiae, que é quem representa o grupo familiar perante terceiros, função esta exercida, normalmente, pelo genitor ou cônjuge masculino (STJ, REsp 506.959/RS, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 07-10-03; REsp 603.202, Rel. Min. Jorge Scartezzini, j. 06-05-04 e REsp. 538.232/RS, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 15-03-04).

Oportuno, no presente caso, conferir-se decisão unânime proferida pela Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, em 26 de outubro de 1999, assim ementada:

PREVIDENCIÁRIO. RURÍCOLA. PROVA TESTEMUNHAL. CERTIDÃO DE CASAMENTO. MARIDO. LAVRADOR. EXTENSÃO PROVA MATERIAL.

1. Verificada a existência de certidão de casamento reconhecendo a atividade de rurícola do marido, é de se estender à sua mulher esta condição, para fins de obtenção de aposentadoria por idade ou por invalidez, desde que aliada à idônea prova testemunhal. 2. Precedentes. 3. Recurso não conhecido. (REsp. nº 225.867, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, in DJ de 29-05-2000)

Nesse sentido, ressalte-se que os documentos em nome do cônjuge extensíveis a parte autora devem ser contemporâneos ao período a ser comprovado ou estarem aliados a outros documentos referentes ao período de carência do benefício.

Não se pode deixar de mencionar, parte do voto proferido pelo Exmo. Sr. Ministro Edson Vidigal, no REsp. nº 237.378, publicado no DJ de 08-03-2000, que com muita propriedade analisou a questão proposta:

(…) A realidade no campo é bem diversa da que vivemos aqui na cidade. A imensidão de nosso país esconde por trás da civilização, pessoas alheias à realidade concreta, que sequer possuem meios suficientes à autosubsistência digna ou de seus familiares. Somos bombardeados todos os dias com notícias veiculadas na televisão ou em revistas da existência de “escravidão” nos campos, em pleno século XX, “bóias-frias” que se desgastam dia e noite em troca de pão e água. E quando chega a ancianidade, ainda têm de lutar para conseguir um mínimo à sua sobrevivência. É nesse sentido que se deve buscar uma interpretação teleológica da regra contida na Lei 8.213/91, Art. 55, § 3º. Ao contrário do que tenta fazer crer o INSS, quando o dispositivo se refere à expressão “início de prova material”, essencial para a comprovação de tempo de serviço, busca se reportar a qualquer documento escrito que demonstre inequivocamente o exercício da atividade referida, ainda que não corresponda integralmente ao período exigido em lei, desde que complementado, é claro, por qualquer outro meio de prova idôneo, como os depoimentos testemunhais. Não fosse assim, seria praticamente inócua a disposição legal.

Acresça-se às Jurisprudências mencionadas, a decisão unânime, proferida pela Terceira Sessão do Superior Tribunal de Justiça, em 25 de outubro de 2000, rescindindo o acórdão, na AÇÃO RESCISÓRIA nº 931, em que foi relator o ilustre Ministro Félix Fischer e Revisor o ilustre Ministro Gilson Dipp:

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. TRABALHADOR RURAL. PROVA DOCUMENTAL. ERRO DE FATO.

Existência de documento – certidão de casamento -, não considerado quando do julgamento do recurso especial, atestando a condição de rurícola da então recorrida, sendo razoável presumir que se a Turma houvesse atentado nessa prova não teria julgado no sentido em que julgou. Erro de fato, que, nos termos do art. 485, inciso IX, do CPC, autoriza a rescisão do acórdão. Precedentes. Ação rescisória procedente.

Quando se trata de mulheres, a prova se torna ainda mais difícil, pois se sabe que quando existiam documentos, estes eram lançados em nome do chefe da família onde, há certo tempo, era o único membro familiar a possuir direito à aposentadoria, de modo que deixar de atribuir-lhe a qualidade de trabalhadora rural em face da inexistência de documento em nome próprio, qualificando-a como tal, redunda em grande injustiça com as mulheres ativas neste tipo de trabalho árduo em que trabalham tanto quanto ou muitas vezes ainda mais que os homens.

Enfim, o tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea – quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas – não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do disposto no art. 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91, e na Súmula n.º 149 do STJ. Embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo. Não se exige prova plena da atividade rural de todo o período correspondente à carência, de forma a inviabilizar a pretensão, mas um início de documentação que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.

No caso concreto:

A propósito de tal exigência, foram juntados pela parte autora aos autos os seguintes documentos:

a) certificado de seu casamento, celebrado em 1964, qualificando como lavrador o cônjuge (fl. 17);

b) matrícula de imóvel rural e escritura pública de compra e venda ao cônjuge da autora, de uma área de terras de 18,1 ha na comarca de Arapongas/PR, ano de 1978 (fl. 18);

c) comprovante de pagamento do ITR em nome do cônjuge da autora, exercícios 1992 e 1983 (fl. 19);

d) notas fiscais em nome da autora, no período de 1995, 1999, 2000, 2001, 2002, 2004, 2005, 2006 (fls. 20/21 e 25/32);

e) cadastro de imóvel rural em nome do cônjuge da autora, referente aos anos 1996, 1997, 1998, 1999, 2003, 2004 e 2005 (fls. 22/24);

f) comprovantes de contribuição sindical rural em nome do cônjuge da autora, anos de 1998, 1999, 2002, 2003, 2004, 2005, 2006, 2007, 2008 (fls. 33/41).

Inquiridas, em audiência realizada em 29/08/2012, as testemunhas José Aparecido da Silva e Joel Aparecido da Silva (mídia digital – fl. 162), advertidos, compromissados e não impugnados pelo Instituto Previdenciário, restou confirmado que a parte autora trabalhou em regime de economia familiar, no período de carência, conforme a seguir relato:

Depoimento pessoal da parte autora

Disse que começou a trabalhar com 17 anos; que morava em sítio; que trabalhava com a família; que plantavam soja, milho e trigo; que a área era de uns 7,5 alqueires; que trabalhava com o marido e os filhos; que não tinham máquinas, pois o sítio era pequeno; que trabalhou até o ano de 2008 mais ou menos; que o nome é Sítio Santo Antonio na estrada da Ponte Seca.

José Aparecido da Silva

Disse que conhece a autora desde 1991; que ela trabalhava na roça juntamente com seus filhos; que o esposo da autora faleceu no ano de 2009; que a família da autora utilizava a produção da propriedade para consumo próprio.

Joel Aparecido da Silva

Disse que conhece a autora há aproximadamente vinte anos; que sabe que a autora foi trabalhadora rural; que ela trabalhou na roça até o ano de 2009; que a autora trabalhava no sítio da família juntamente com seus filhos.

No caso, é possível a formação de uma convicção plena, após a análise do conjunto probatório, no sentido de que, efetivamente, houve o exercício da atividade laborativa rurícola, em regime de economia familiar, no período correspondente à carência.

Assim, preenchidos os requisitos – idade exigida (completou 55 anos em 1991, DN: 25/12/1936 – fl. 15) e carência no caso, 60 meses -, deve ser mantida a sentença que concedeu o benefício, com o pagamento dos valores atrasados, desde a data do requerimento administrativo (08/10/2008 – fl. 42).

Dos consectários

Cuidando-se de questão de ordem pública, segundo orientação do STJ, devem ser adequados de ofício (AgRg no AREsp: 144069 SP 2012/0026285-1, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, DJe 19-10-12).

Assim, conforme entendimento das Turmas Previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região estes são os critérios aplicáveis aos consectários:

a) CORREÇÃO MONETÁRIA:

A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e jurisprudencialmente aceitos, quais sejam:

– ORTN (10/64 a 02/86, Lei nº 4.257/64);

– OTN (03/86 a 01/89, Decreto-Lei nº 2.284/86);

– BTN (02/89 a 02/91, Lei nº 7.777/89);

– INPC (03/91 a 12/92, Lei nº 8.213/91);

– IRSM (01/93 a 02/94, Lei nº 8.542/92);

– URV (03 a 06/94, Lei nº 8.880/94);

– IPC-r (07/94 a 06/95, Lei nº 8.880/94);

– INPC (07/95 a 04/96, MP nº 1.053/95);

– IGP-DI (05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei nº 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6.º, da Lei nº 8.880/94);

– INPC (a partir de 04/2006, conforme o art. 31 da Lei nº 10.741/03, combinado com a Lei nº 11.430/06, precedida da MP nº 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei nº 8.213/91, e REsp nº 1.103.122/PR).

Entendia a 3.ª Seção deste Tribunal que a contar de 30.06.2009, data em que passou a viger a Lei nº 11.960/09, de 29.06.2009, publicada em 30.06.2009 (a qual alterou o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97), deveria haver, para fins de atualização monetária e juros, a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança.

Não são aplicáveis, todavia, no que toca à correção monetária, os critérios previstos na Lei nº 11.960/2009, que modificou a redação do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, por conta de decisão proferida pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, que apreciou a constitucionalidade do artigo 100 da CF, com a redação que lhe foi dada pela EC 62/2006. Essa decisão proferida pela Corte Constitucional, além de declarar a inconstitucionalidade da expressão “na data de expedição do precatório”, do §2º; dos §§ 9º e 10º; e das expressões “índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança” e “independente de sua natureza”, do §12, todos do art. 100 da Constituição Federal de 1988, com a redação da Emenda Constitucional nº 62/2009, por arrastamento, também declarou inconstitucional o art. 1º-F da Lei nº 9.494, com a redação dada pelo art. 5º da Lei nº 11.960, de 29.07.2009 (atualização monetária pelo índice de remuneração da poupança).

Impõe-se, pois, a observância do que decidido com efeito erga omnes e eficácia vinculante pelo STF nas ADIs 4.357 e 4.425, restabelecendo-se, no que toca a juros e correção monetária, a sistemática anterior à Lei nº 11.960/09, ou seja, apuração de correção monetária pelo INPC.

A correção monetária deve ser adequada aos critérios acima definidos. De fato, em razão do que decidido pelo Supremo Tribunal Federal, as disposições do art. 1.º-F da Lei n.º 9.494, com a redação dada pelo art. 5.º da Lei nº 11.960/09, foram expungidas do ordenamento jurídico no que toca à correção monetária, a qual, como sabido, constitui acessório, sobre o qual pode e deve o órgão julgador deliberar. Eliminada do mundo jurídico uma norma legal em razão de manifestação do Supremo Tribunal Federal em ação direta de inconstitucionalidade, não pode subsistir decisão que a aplique, pois está em confronto com a Constituição Federal.

b) JUROS DE MORA

Até 30.06.2009 os juros de mora, apurados a contar da data da citação, devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n.º 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.

A partir de 30.06.2009, por força da Lei n.º 11.960, de 29.06.2009(publicada em 30.06.2009), que alterou o art. 1.º-F da Lei n.º 9.494/97, haverá a incidência uma única vez, até o efetivo pagamento, dos juros aplicados à caderneta de poupança. Registre-se que a Lei 11.960/09, segundo o entendimento do STJ, tem natureza instrumental, devendo ser aplicada aos processos em tramitação (EREsp 1207197/RS. Relator Min. Castro Meira. Julgado em 18.05.2011).

Observo que as decisões tomadas pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425 não interferiram com a taxa de juros aplicável às condenações da Fazenda Pública, consoante entendimento firmado no Superior Tribunal de Justiça a partir do julgamento do RESP 1.270.439. Com efeito, como consignado pela Ministra Eliana Calmon no julgamento do MS 18.217, “No julgamento do REsp 1.270.439/PR, sob a sistemática dos recursos repetitivos, esta Corte, diante da declaração de inconstitucionalidade parcial do art. 1º-F da Lei 9.494/99 no que concerne à correção monetária, ratificou o entendimento de que nas condenações impostas à Fazenda Pública após 29.06.2009, de natureza não tributária, os juros moratórios devem ser calculados com base na taxa de juros aplicáveis à caderneta de poupança“.

c) HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS: devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: “Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência”.

d) CUSTAS PROCESSUAIS: o INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS), isenções estas que não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, p. único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.

DA TUTELA ESPECÍFICA DO ART. 461 DO CPC

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 461 do CPC, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3.ª Seção, Questão de Ordem na AC n.º 2002.71.00.050349-7/RS, Rel. para o acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 09-08-2007), determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora (NB 143.236.200-0) a ser efetivada em 45 dias, com DIP na data do presente julgamento.

Frente ao exposto, nos termos da fundamentação, voto por negar provimento ao recurso do INSS e à remessa oficial, e determinar a implantação do benefício.

Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

Relator



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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 19/11/2014

APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0018859-03.2014.404.9999/PR

ORIGEM: PR 00022509820108160045

RELATOR:Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PRESIDENTE:Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PROCURADOR:Procurador Regional da República Paulo Gilberto Cogo Leivas
APELANTE:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
ADVOGADO:Procuradoria Regional da PFE-INSS
APELADO:MITSUNO YAMAMOTO
ADVOGADO:Ricardo Rossi
REMETENTE:JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE ARAPONGAS/PR

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 19/11/2014, na seqüência 97, disponibilizada no DE de 05/11/2014, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.

Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS E À REMESSA OFICIAL, E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.

RELATOR ACÓRDÃO:Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
VOTANTE(S):Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
:Des. Federal CELSO KIPPER
:Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA

Gilberto Flores do Nascimento

Diretor de Secretaria



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