A Emenda Constitucional nº 103/2019, conhecida como Reforma da Previdência, gerou a modificação em diversos benefícios previdenciários, dentre eles, a aposentadoria especial, com alteração nos seus requisitos de concessão e sua forma de cálculo.

Com isso, passou a ser questionada a legalidade de tais alterações, à luz da Constituição Federal.

Nesse sentido, houve a proposição da Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI 6309, que busca o reconhecimento de inconstitucionalidade dos dispositivos da EC nº 103 que geraram alterações no benefício da Aposentadoria Especial.

Continue a leitura do artigo para entender mais sobre Aposentadoria Especial e suas alterações impostas pela Reforma de Previdência, o que é e qual o objetivo da ADI 6309, qual sua situação atual de julgamento e qual o seu impacto na vida dos trabalhadores que exercem atividades com exposição a agentes nocivos.

Alterações da Reforma da Previdência na Aposentadoria Especial

A partir da Reforma da Previdência, foram impostos requisitos adicionais para a concessão da Aposentadoria Especial. Além disso, passou a ser vedada a conversão de períodos especiais em comuns, bem como houve alteração na  forma de cálculo desse benefício, conforme explicitado a seguir.

Exigência de Idade Mínima

A partir da entrada em vigor da EC 103/2019, passou-se a exigir, pela Regra de Transição, que, além da comprovação do tempo em atividade especial, o segurado atinja uma pontuação mínima (resultado da soma do tempo de contribuição + idade do segurado), de acordo com a atividade: 66 pontos para atividades especiais de 15 anos, 76 pontos para atividades especiais de 20 anos e 86 pontos para atividades especiais de 25 anos

Ainda, a Reforma da Previdência prevê uma Regra Permanente (aplicável somente aos segurados que iniciaram a vida contributiva após a entrada em vigor da Reforma), na qual os segurados devem preencher o tempo de atividade especial + idade mínima, sendo de 55 anos de idade para atividade especial de 15 anos, 58 anos de idade para atividade especial de 20 anos e 60 anos de idade para atividade especial de 25 anos.

Portanto, a EC 103/2021 alterou o benefício de Aposentadoria Especial, incluindo, como requisito para gozo do benefício, não só o tempo mínimo de atividade em condições especiais, como na regra Pré-Reforma, mas também o cumprimento de uma idade mínima, seja através da exigência direta da idade ou através da soma de pontos, que é resultado da idade + tempo de contribuição.

Vedação de Conversão de Períodos Especiais em Comuns

Antes da Reforma, era possível a conversão do tempo especial em tempo comum, aplicando-lhes fatores de conversão de modo a tornar esses períodos proporcionais, de modo a utilizar essa contagem de tempo diferenciada para fins de concessão de Aposentadoria por Tempo de Contribuição por equivalência.

Porém, com a EC 103/2019, passou a ser vedada a conversão de períodos especiais em comuns para atividades exercidas após 12/11/2019, véspera da entrada em vigor da Emenda.

Nesse sentido, as atividades especiais exercidas após essa data somente são consideradas para fins de Aposentadoria Especial pura, ou, ainda, como se comuns fossem para fins de Aposentadoria por Tempo de Contribuição.

Alteração na Forma de Cálculo

Quanto ao cálculo da Aposentadoria Especial, pela regra Pré-Reforma, o valor desse benefício correspondia ao TOTAL (100%) da média aritmética das 80% maiores contribuições vertidas pelo segurado (ou seja, era possível descartar as menores contribuições, que “puxassem” o valor do benefício para baixo), o que fazia desse benefício um dos mais vantajosos financeiramente aos segurados.

Após a EC 103/19, a forma de cálculo foi alterada, passando a ser baseada na média de 100% do período contributivo do segurado a partir de julho de 1994 (sendo vedado, portanto, o descarte das contribuições menos vantajosas).

Além disso, sobre essa nova média, desfavorável aos segurados, aplica-se ainda o percentual de 60% + 2% por cada ano de contribuição que exceder 15 anos de contribuição para mulheres e 20 anos de contribuição para homens.

O que é a ADI e do que trata a ADI 6309? 

ADI é a sigla para Ação Direta de Inconstitucionalidade. Assim, através desse tipo de ação, busca-se o reconhecimento de que uma lei, um dispositivo legal ou um ato normativo fere a Constituição Federal, o que é feito através do julgado pelo Supremo Tribunal FederalSTF.

Nesse sentido, a ADI 6309 foi proposta pela Confederação Nacional dos Trabalhadores de Indústria – CNTI, contra as alterações trazidas pela Emenda Constitucional n° 103 com relação à Aposentadoria Especial, no que tange à exigência de CUMPRIMENTO DE IDADE MÍNIMA (pontos ou idade – art. 19, § 1º, I, alíneas a, b e c, da EC nº 103/2019), a VEDAÇÃO DA CONVERSÃO DE TEMPO ESPECIAL EM COMUM (art. 25, § 2º, da EC nº 103/2019) e a ALTERAÇÃO NA FORMA DE CÁLCULO de tal benefício (art. 26, § 2º, IV, da EC nº 103/2019).

Qual é a função da Aposentadoria Especial? 

A Aposentadoria Especial foi criada como uma forma de proteger a saúde e a integridade física do trabalhador que exerce atividades em condições prejudiciais ao organismo, acima dos limites de tolerância fixados por normas técnicas.

Assim, sua origem remonta ao reconhecimento, pelo legislador, de que a permanência prolongada em ambientes nocivos compromete seriamente a saúde física e psicológica do empregado, de modo que, mesmo com medidas protetivas, representam dano cumulativo ao longo dos anos, sendo capaz, inclusive, de lhe reduzir a expectativa de vida.

Portanto, a ideia central com a criação da Aposentadoria Especial era permitir que os trabalhadores expostos a agentes nocivos se aposentassem antes da idade mínima comum, justamente para retirar o operário do ambiente insalubre antes que o dano à saúde se consolidasse, preservando sua capacidade laborativa residual e garantindo-lhe condições dignas de subsistência.

Assim, no plano constitucional, o art. 201, §1º da CF/88 não apenas autoriza, mas impõe ao legislador a instituição de requisitos e critérios diferenciados para trabalhadores expostos a riscos.

Tal previsão deve ser interpretada à luz de outros dispositivos constitucionais, tais como da dignidade da pessoa humana e valorização social do trabalho (art.1º, III e IV da CF/88), redução dos riscos inerentes ao trabalho (art. 7º, XXII CF/88), valorização do trabalho humano como fundamento da ordem econômica (art. 170 CF/88), entre outros.

Assim, a Aposentadoria Especial é a materialização previdenciária desse conjunto de garantias constitucionais, de modo que qualquer modificação legislativa que dificulte o acesso a esse benefício deve ser submetida a um rigoroso controle de constitucionalidade, especialmente sob o prisma da vedação ao retrocesso social.

Alterações da EC nº 103 na Aposentadoria Especial à luz da Constituição Federal

Especificamente quanto à ADI 6309, tem que, em tal Ação, há o questionamento de constitucionalidade das seguintes alterações provocadas pela Reforma da Previdência:

  1. Estabelecimento de idades mínimas para a Aposentadoria Especial (art. 19, § 1º, I, alíneas a, b e c, da EC nº 103/2019).

Há que se notar que a exigência de idades mínimas rompe com a lógica protetiva da Aposentadoria Especial, além de violar o direito fundamental à saúde e o próprio direito à aposentadoria especial se torna ineficaz,

Isso porque, se antes, o único requisito era o tempo de exposição, agora, mesmo após atingir o tempo máximo tolerado em condições nocivas, o trabalhador deverá permanecer no ambiente insalubre por anos adicionais, agravando os riscos à sua saúde.

Desse modo, tal medida inverte a lógica preventiva do instituto, transformando-o em mera indenização tardia, paga após a ocorrência dos danos.

Os defensores da implementação dos requisitos de idade mínima na Aposentadoria Especial alegam que essa é a “única solução financeiramente sustentável para o sistema”, como citado pelo Ministro Luís Roberto Barroso, em seu voto contrário à ADI e em favor das alterações trazidas pela Reforma da Previdência e, supostamente, em defesa do “princípio do equilíbrio financeiro e atuarial na Previdência”.

Quanto à questão financeira, cumpre ressaltar que existe financiamento específico para a Aposentadoria Especial, a chamada SAT ESPECIAL, paga pelos empregadores dos trabalhadores expostos aos agentes nocivos enquanto ativos. Essa arrecadação tributária deve gerar o correspondente benefício previdenciário, a Aposentadoria Especial. 

Portanto, o argumento de inviabilidade financeira, desde o princípio, já se mostra frágil, visto o prévio custeio legalmente previsto.

Ademais, quanto ao tema, merece destaque trecho do voto do ministro Edson Facchin na própria ADI 6309:

“É um grande equívoco confundir os gastos que o Estado tem com a aposentadoria – e que, obviamente, precisarão ser revistos dada a mudança no perfil etário da população – com os gastos necessários para garantir e manter a capacidade produtiva das pessoas. No Brasil, boa parte das medidas de seguro social são feitas pela Previdência Social, o que acaba por ampliar a confusão. Por isso, é preciso ser muito cuidadoso para não se permitir que, em nome das necessidades de uma reforma da previdência, sejam retiradas proteções do seguro social”.

Ademais, a falácia de suposto déficit na Previdência Social leva em consideração apenas a receita de contribuições ao INSS que incidem sobre a folha de pagamento.

Ocorre que, conforme previsto no Art. 195 da Constituição Federal, a seguridade social  é financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, das receitas, faturamentos e lucro de empresas e empregadores, receitas de concursos de prognósticos, bem como contribuições sociais sobre bens e serviços.

Dessa forma, a Seguridade Social é financiada por grande parcela da arrecadação nacional, sendo injustificável a alegação de falta de recursos exclusivamente advindo da Previdência Social.

De outra banda, em defesa da instituição da idade mínima, Barroso argumenta ainda que “[e]mbora exista uma crença de que o segurado que exerce atividades com exposição a agentes nocivos tem uma vida mais curta, os dados de benefícios nos mostram (…) que a idade média no óbito desses segurados foi (…) de 79,19 e 79,05 [anos de idade]”, querendo alegar, assim, que não haveria necessidade da retirada desses trabalhadores mais cedo do mercado de trabalho.

Ora, o fato de as pessoas que conseguiram o benefício de Aposentadoria Especial terem a mesma expectativa de vida dos demais aposentados não indica um desvirtuamento do instituto.

Pelo contrário, ele indica que a política pública foi bem-sucedida. “O objetivo, afinal, era justamente esse”, contra-argumenta o ministro Edson Facchin, em seu voto pelo julgamento de procedência da ADI e contra a Reforma da Previdência no que tange às alterações na Aposentadoria Especial.

Ademais, não obstante o legítimo interesse do Estado em preservar a viabilidade financeira da Previdência Social, a sua intervenção acabou por desconfigurar a dimensão securitária do instituto da Aposentadoria especial.

Assim, a consequência lógica é a elevação de doenças ocupacionais e a redução da expectativa de vida do trabalhador, o que ofende a Constituição (e ao núcleo essencial do direito fundamental à seguridade social), uma vez que a instituição de idade mostra-se dissociada de medidas que promovam a extensão com dignidade da capacidade laboral.

Portanto, fica demonstrada que a instituição da idade mínima para a Aposentadoria Especial contraria frontalmente os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, do direito à previdência social e da isonomia, devendo, nesse ponto, ser considerado inconstitucional o art. 19, § 1º, I, alíneas a, b e c, da EC nº 103/2019.

  1. Vedação da conversão do tempo especial em tempo comum, para fins de Aposentadoria por Tempo de Contribuição (art. 25, § 2º, da EC nº 103/2019).

A conversão de períodos especiais em comuns foi criada como uma forma de ajustar proporcionalmente o tempo de atividade exercida pelos segurados em exposição à agentes nocivos com outros períodos sem tal exposição.

O fundamento dessa contagem diferenciada se baseia no fato de que um ano de trabalho sob risco à saúde equivale, em esforço e desgaste, a mais de um ano em condições normais, justificando a antecipação do direito ao benefício.

Assim, a vedação da conversão de períodos especiais em comuns, imposta a partir da EC 103/2019, retira do trabalhador a possibilidade de proporcionalizar o desgaste sofrido nos períodos em que efetivamente houve exposição à sua saúde e integridade física.

Ou seja, apesar da exposição a agentes nocivos em determinados períodos de sua vida laborativa, esse tempo parcial do trabalhador não será considerado, gerando um “tudo ou nada”: ou o trabalhador atinge o tempo integral exigido para aposentadoria especial ou o período laborado sob risco é ignorado para fins de antecipação da aposentadoria comum.

Assim, se é certo que, a partir da EC 103/2019, há uma faculdade para os demais entes da Federação instituírem, em seus regimes próprios, critérios para a contagem diferenciada, ela passa a ser necessária quando há uma idade mínima para a concessão da aposentadoria, inclusive na modalidade especial.

Isso porque, conforme amplamente comprovado em estudos científicos, a exposição a agentes nocivos diminui consideravelmente a capacidade laboral. Segundo o estudo recente “The Role of Physical, Cognitive, and Interpersonal Occupational Requirements and Working Conditions on Disability and Retirement”, há um efeito cumulativo das tarefas mais exigentes na saúde do trabalhador.

Desse modo, conforme bem adotado pelo Ministro Facchin, em seu voto na ADI 6309, “se o objetivo – correto – da Reforma é estender o período laboral, a vedação da conversão do tempo especial em comum desincentiva os trabalhadores expostos a condições mais graves a buscarem uma alternativa mais salubre“.

Portanto, é obrigação do Estado fornecer meios para que os trabalhadores expostos a condições insalubres busquem alternativas de renda sem desconsiderar os efeitos cumulativos dos períodos especiais, o que se mostra impedido pelo dispositivo da Emenda Constitucional nº 103 que proíbe a conversão de períodos especiais em comuns.

Logo, uma vez que a vedação de tempo especial em comum iguala trabalhadores em situações absolutamente distintas, tem-se demonstrada a violações dos princípios constitucionais da proporcionalidade e da isonomia, de modo que forçoso o entendimento pela inconstitucionalidade do art. 25, § 2º, da EC nº 103/2019.

  1. Alteração da forma de cálculo da Aposentadoria Especial, de 100% (cem por cento) do Salário-de-Benefício para 60% (sessenta por cento) + 2% (dois por cento) por ano contribuído acima de 20 anos para homens e 15 anos para mulheres sobre o salário de benefício (art. 26, § 2º, IV, da EC nº 103/2019).

Essa fórmula de cálculo foi concebida para a Aposentadoria Programada e não é compatível com a realidade da Aposentadoria Especial, na qual, conforme já citado, o tempo de contribuição deve ser naturalmente menor devido aos riscos inerentes à atividade laborativa com exposição a agentes nocivos.

Nesse sentido, por essa regra de cálculo, para que um trabalhador atinja sua aposentadoria integral (100% de sua média de contribuições), é preciso que ele contribua por 40 anos, se homem ou 35 anos, se mulher.

Vale lembrar que, pela regra Pré-Reforma, bastava o cumprimento do tempo em atividade especial (15, 20 ou 25 anos) para que, no recebimento de Aposentadoria Especial, todo segurado recebesse a integralidade de sua média contributiva.

Portanto, a alteração na forma de cálculo da Aposentadoria Especial desestimulará o segurado a se aposentar no tempo adequado à sua saúde, forçando a sua permanência excessiva no ambiente laboral nocivo.

A única outra hipótese será de trabalhadores se aposentando precocemente, por questões de saúde laboral, gerando, assim, uma renda de benefício menor, ainda que tenham cumprido integralmente o tempo de exposição previsto em lei.

Os defensores da alteração na forma de cálculo da Aposentadoria Especial alegam que as regras de cálculo seriam as mesmas, tanto para a aposentadoria voluntária, como para a aposentadoria especial, de modo que não seria verdadeira a afirmação de que esses trabalhadores receberão valor menor de proventos que os segurados que laboram em condições normais.

Tal afirmação demonstra total desconhecimento do exercício de atividades em condições insalubres e/ou perigosas.

Ora, é cientificamente comprovado que quanto mais exigente o trabalho, mais cedo as pessoas precisam se aposentar, o que compromete sua renda futura (Stengard, J. Et al. The Implication of Physically Demanding and Hazardous Work on Retirement Timing. International Journal of Environmental Resarch and Public Health. 2022 Jul).

Para aumentar ainda mais o problema, são justamente os trabalhadores com os menores salários que tendem a se aposentar antes (Lopez, Italo Garcia, Kathleen J. Mullen, and Jeffrey Wenger. 2022. “The Role of Physical, Cognitive and Interpersonal Occupational Requirements and Working Conditions on Disability and Retirement.” Ann Arbor, MI. University of Michigan Retirement and Disability Research Center (MRDRC) Working Paper; MRDRC WP 2022- 448).

Ademais, o instituto da Aposentadoria Especial foi criado justamente para que os trabalhadores em condições nocivas pudessem se aposentar mais cedo, de modo que não há lógica ou sentido em exigir de trabalhadores em situações distintas o mesmo tempo de labor.

Em defesa das alterações advindas da EC 103/2019, o deputado Samuel Moreira (PSDB-SP) alegou que “caso seja constatado que falte condição para o trabalho, o segurado terá acesso à aposentadoria por incapacidade permanente” (BRASIL, 2019).

Nota-se que, para os que defendem as alterações da EC nº 103, o caráter preventivo da aposentadoria especial é totalmente ignorado, de modo que, segundo eles, o benefício somente deveria ser concedido em último caso: se o trabalhador sobreviver aos desgastes físicos provenientes de atividade especial, ou se não se aposentar precocemente por invalidez, aí sim, poderá então usufruir da sua aposentadoria que foi galgada em ambientes de trabalhos insalubres e/ou perigosos.

Vale lembrar, ainda, que, além da alteração dos regramentos e forma de cálculo da Aposentadoria Especial, a Reforma também alterou a forma de cálculo da Aposentadoria por Incapacidade Permanente.

Portanto, além de pagar com a sua saúde e integridade física, trabalhando além do que a própria legislação previdenciária e trabalhista prevê como salubre, o segurado ainda é penalizado financeiramente caso fique inválido e necessite de Aposentadoria por Incapacidade Permanente, uma vez que essa também teve seu valor drasticamente reduzido.

Portanto, a aposentadoria antecipada, causada pelas condições adversas de trabalho, implica em benefícios previdenciários reduzidos, o que afeta diretamente o poder de compra do trabalhador aposentado, tornando mais difícil cobrir despesas básicas como alimentação, moradia e saúde.

Além disso, a falta de recursos financeiros pode levar a uma dependência maior de familiares, do sistema público de assistência social e saúde.

Em resumo, a Aposentadoria Especial e a Aposentadoria por Incapacidade Permanente, com rendas reduzidas pela nova forma de cálculo, geram um ciclo de dificuldades econômicas e sociais que prejudicam significativamente a qualidade de vida do trabalhador.

Nesta senda, quanto à alteração da forma de cálculo na Aposentadoria Especial, o Ministro Facchin, em seu voto na ADI 6309, assim destacou:

“o cálculo do benefício da aposentadoria especial, sobretudo se considerada a proibição da conversão do tempo especial em comum, além de desincentivar a opção pelos trabalhadores de ocupações que sejam menos arriscadas, põe em condições iguais quem está em posições jurídicas diferentes [ferindo o princípio da isonomia]. Note-se que o trabalhador em condições especiais de 20 ou 25 anos de contribuição, apesar de estar em condições prejudiciais à saúde, terá que trabalhar pelo mesmo período que os demais trabalhadores para ter a mesma renda”.

E o Ministro ainda finaliza: “Com todas as vênias ao e. Ministro Relator, não vejo como essa alteração possa ser compatível com o direito à igualdade e à seguridade social”.

Portanto, a alteração na forma de cálculo da Aposentadoria Especial, trazida pela Emenda Constitucional nº 103 viola os princípios constitucionais da isonomia, da dignidade da pessoa humana, da proporcionalidade, e da vedação do retrocesso, sendo o único entendimento razoável o de consideração pela inconstitucionalidade do art. 26, § 2º, IV, da EC nº 103/2019.

Situação atual da ADI 6309

O Ministro Roberto Barroso, Relator do processo, votou pela improcedência da ADI 6309, declarando, assim, a constitucionalidade das alterações na Aposentadoria Especial trazidas pela EC 103/2019.

O Ministro Gilmar Mendes acompanhou o relator.

O Ministro Edson Fachin antecipou seu voto divergindo do Relator, para julgar procedente a presente Ação Direta, declarando a inconstitucionalidade das alterações da Aposentadoria Especial, de modo a serem mantidas as regras Pré-Reforma.

A então Ministra Rosa Weber acompanhou o voto divergente de Fachin, pela inconstitucionalidade dos artigos da Reforma da Previdência na Aposentadoria Especial.

Portanto, até o momento, há um empate técnico: 2 votos a favor da constitucionalidade e manutenção das alterações trazidas pela Reforma da Previdência (Barroso e Gilmar Mendes) e 2 a favor da inconstitucionalidade, com vedação das alterações da EC 103 na Aposentadoria Especial (Fachin e Rosa Weber). 

O processo encontra-se aguardando nova inclusão em Pauta para julgamento, após a suspensão pelo pedido de vistas solicitado pelo Ministro Alexandre de Moraes.

Restam ser proferidos os votos dos demais ministros do STF, com exceção do ministro Flávio Dino, que não apresentará voto na ADI, visto que assumiu a cadeira da ex-ministra Rosa Weber, que já havia votado.

Conclusão

A EC 103/2019, ao impor idade mínima, vedar a conversão do tempo especial e reduzir o valor do benefício, desconfigurou a essência da Aposentadoria Especial. De medida preventiva, o instituto passou a ser uma indenização tardia, concedida após a consolidação dos danos à saúde do trabalhador.

As consequências concretas são graves: maior exposição a riscos, aumento de doenças ocupacionais, perda de qualidade de vida e insegurança financeira.

Sob o ponto de vista constitucional, essas alterações ferem princípios fundamentais, tais como o da dignidade da pessoa humana (Art. 1º, III), dos valores sociais do trabalho (Art. 1º, IV), do direito à redução dos riscos inerentes ao trabalho (Art. 7º, XXII), da proporcionalidade e da isonomia (Art. 201, §1º – redação dada pela EC 20/98).

Além disso, afrontam a vedação ao retrocesso social (art. 60, § 4º CF/88), pois direitos já consolidados e que materializavam a proteção constitucional foram restringidos sem justificativa legítima e proporcional.

Por essas razões, é imprescindível que a ADI 6309 seja julgada procedente, restaurando a função protetiva da Aposentadoria Especial e reafirmando o compromisso do Estado brasileiro com a dignidade, a saúde e a valorização do trabalho.

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