As atividades concomitantes, por muito tempo, geraram discussões sobre a sua forma de cálculo nos benefícios previdenciários. Alguns entendiam pela análise separada de contribuições das atividades principais e das atividades secundárias; outros entendiam pela soma de todas as contribuições.
Fato é que, independente da forma de cálculo, o segurado sempre buscava a forma que fosse mais benéfica para o seu benefício, bem como possuía jurisprudências para embasar o seu pedido, o que acabava gerando uma insegurança jurídica. Diante destes entendimentos e discussões, a TNU visou unificar o entendimento, no Tema 167, o que posteriormente foi também fixado pelo STJ, no tema 1.070, e pela Lei 13.846/19.
Contudo, apesar de hoje estar consolidado o entendimento, é importante estar informado sobre as modificações legais e os seus respectivos marcos legais. Continue a leitura e entenda mais sobre as atividades concomitantes e a possibilidade de revisão dos benefícios.
O que são atividades concomitantes?
Atividades concomitantes são duas ou mais atividades que são desempenhadas ao mesmo tempo. No Direito Previdenciário, esta prática implica em duas ou mais contribuições ao INSS ao mesmo tempo, o que gera dúvidas sobre como tais contribuições são contabilizadas nos benefícios e qual o limite legal de desconto contributivo.
Quais as modificações legais acerca das atividades concomitantes?
Até 2019, o entendimento sobre as atividades concomitantes está amparado no artigo 32 da Lei 8.213/91, que dispunha:
Art. 32. O salário-de-benefício do segurado que contribuir em razão de atividades concomitantes será calculado com base na soma dos salários-de-contribuição das atividades exercidas na data do requerimento ou do óbito, ou no período básico de cálculo, observado o disposto no art. 29 e as normas seguintes:
I – quando o segurado satisfizer, em relação a cada atividade, as condições do benefício requerido, o salário-de-beneficio será calculado com base na soma dos respectivos salários-de-contribuição;
II – quando não se verificar a hipótese do inciso anterior, o salário-de-benefício corresponde à soma das seguintes parcelas:
- a) o salário-de-benefício calculado com base nos salários-de-contribuição das atividades em relação às quais são atendidas as condições do benefício requerido;
- b) um percentual da média do salário-de-contribuição de cada uma das demais atividades, equivalente à relação entre o número de meses completo de contribuição e os do período de carência do benefício requerido;
III – quando se tratar de benefício por tempo de serviço, o percentual da alínea “b” do inciso II será o resultante da relação entre os anos completos de atividade e o número de anos de serviço considerado para a concessão do benefício.
- 1º O disposto neste artigo não se aplica ao segurado que, em obediência ao limite máximo do salário-de-contribuição, contribuiu apenas por uma das atividades concomitantes.
- 2º Não se aplica o disposto neste artigo ao segurado que tenha sofrido redução do salário-de-contribuição das atividades concomitantes em respeito ao limite máximo desse salário.
Com base neste artigo, poderia haver a soma das atividades concomitantes de forma integral desde que o segurado preenchesse os requisitos necessários para o benefício por todas as atividades desempenhadas.
Caso não preenchesse os requisitos para o benefício por todas as atividades, utilizaria as contribuições dos períodos utilizados para atingir o direito ao benefício, mais um percentual sobre a média das atividades secundárias.
Assim, em suma, o que ocorria era que considerava a atividade de maior tempo de contribuição como atividade principal e as demais atividades eram consideradas secundárias, de forma que as atividades secundárias eram consideradas apenas em parte, com a média e um percentual do valor, baixando a renda e desconsiderando o valor pago de contribuição previdenciária.
Em 2019, contudo, depois de algumas discussões jurisprudenciais, sobreveio a Lei 13.846/19, que modificou a redação do artigo 32, passando a prevê-lo da seguinte forma:
Art. 32. O salário de benefício do segurado que contribuir em razão de atividades concomitantes será calculado com base na soma dos salários de contribuição das atividades exercidas na data do requerimento ou do óbito, ou no período básico de cálculo, observado o disposto no art. 29 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
- 1º O disposto neste artigo não se aplica ao segurado que, em obediência ao limite máximo do salário de contribuição, contribuiu apenas por uma das atividades concomitantes. (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
- 2º Não se aplica o disposto neste artigo ao segurado que tenha sofrido redução do salário de contribuição das atividades concomitantes em respeito ao limite máximo desse salário. (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
A partir da nova previsão legal, todas as contribuições concomitantes serão somadas no cálculo do benefício, desconsiderando se são atividades principais ou secundárias.
Apenas por estas modificações, pode ser entendido que para os benefícios concedidos até 17/06/2019, deveria ser verificada qual atividade principal para depois verificar as atividades secundárias e a renda do benefício. Já a partir de 18/06/2019, aplica-se a soma de todas as contribuições.
Contudo, não é esse o entendimento atual. Isto, pois, antes mesmo da modificação pela Lei 13.846/19, já se tinha entendimentos favoráveis na jurisprudência, conforme será analisado abaixo.
Entendimento jurisprudencial acerca das atividades concomitantes: o que diz a TNU e o STJ?
A jurisprudência, diferentemente da legislação, há muito tempo aplica entendimento favorável aos segurados, determinando a soma das contribuições concomitantes, chegando, definitivamente, a sua unificação.
Neste ponto, é importante assinalar que a Turma Nacional de Uniformização foi a primeira a unificar a jurisprudência, estabelecendo um critério nacional para todos os Juizados Especiais Federais. Assim, em 11/04/2018 transitou em julgado o Tema 167, no qual fixou a seguinte tese:
Tema 167: O cálculo do salário de benefício do segurado que contribuiu em razão de atividades concomitantes vinculadas ao RGPS e implementou os requisitos para concessão do benefício em data posterior a 01/04/2003, deve se dar com base na soma integral dos salários-de-contribuição (anteriores e posteriores a 04/2003) limitados ao teto.
A partir da tese fixada na TNU, para os benefícios concedidos com DER/DIB a partir de 01/04/2003, as contribuições concomitantes deverão ser somadas integralmente.
Nesta mesma linha, é o que previu o Superior Tribunal de Justiça, no Tema 1.070, estabelecendo uma uniformização de âmbito nacional e para todos os julgadores:
Tema 1070: Após o advento da Lei 9.876/99, e para fins de cálculo do benefício de aposentadoria, no caso do exercício de atividades concomitantes pelo segurado, o salário-de-contribuição deverá ser composto da soma de todas as contribuições previdenciárias por ele vertidas ao sistema, respeitado o teto previdenciário.
O Superior Tribunal de Justiça, mais abrangente que a TNU, definiu que a soma das atividades concomitantes seriam a partir da Lei 9.876/99, ou seja, desde 26/11/1999, e não apenas a partir de 2003.
Assim, o entendimento atual é de que para os benefícios concedidos a contar de 26/11/1999, as contribuições de atividades concomitantes deverão ser somadas, independentemente da atividade principal ou secundária.
Como o INSS realiza o cálculo das atividades concomitantes?
Atualmente, a Instrução Normativa 128/22 já traz o entendimento legal atual, determinando a soma das contribuições, nos termos do artigo 32 da Lei 8.213/91, com redação dada pela Lei 13.846/19.
Art. 225. O salário de benefício do segurado que contribui em razão de atividades concomitantes será calculado com base na soma dos salários de contribuição das atividades exercidas no período básico de cálculo.
- 1º Em se tratando de DIB, ou, no caso dos benefícios por incapacidade, de DII, anterior a 18 de junho de 2019, data da publicação da Lei nº 13.846, deverá ser observada a múltipla atividade.
- 2º Para efeito do disposto no § 1º, será considerada múltipla atividade quando o segurado exercer atividades concomitantes dentro do PBC e não cumprir as condições exigidas ao benefício requerido em relação a cada atividade.
Neste contexto, o INSS entende que anteriormente a Lei 13.846/19, quando houver atividades concomitantes deverá ser considerada a múltipla atividade, separando as contribuições e aplicando um percentual sobre a média das contribuições das atividades secundárias.
Logo, deve ser verificado o benefício concedido, a data de início do benefício e o cálculo apresentado pelo INSS na carta de concessão, pois é possível que haja revisão a ser feita com base no entendimento jurisprudencial aplicado.
Qual a possibilidade de revisão de atividades concomitantes?
A revisão de benefícios com base nas atividades concomitantes encontra-se no entendimento jurisprudencial aplicado pelo Superior Tribunal de Justiça. Isso porque permite a soma das contribuições concomitantes desde a Lei 9.876/99, o que torna bastante vantajoso o cálculo da renda do benefício.
Aqui é importante se atentar à revisão, eis que o INSS costuma aplicar o entendimento da IN 128/22, limitando a soma das contribuições apenas em caso de atingir o direito ao benefício por todas as atividades ou então a partir da Lei 13.846/19. Logo, nesta situação, os benefícios concedidos com DER/DIB anterior a junho de 2019, podem ter uma redução significativa do valor do benefício quando possuir atividades concomitantes.
É importante sempre conferir a carta de concessão e realizar o cálculo do benefício pela regra atual para verificar se efetivamente será mais vantajoso ao segurado. Diante disso, recomenda-se a análise do benefício por um advogado especializado.
Ademais, é imperioso se atentar aos prazos de revisão, pois os beneficiários têm o prazo de 10 anos para solicitar a revisão dos benefícios, com retorno financeiro, na maior parte dos casos, apenas dos últimos cinco anos, conforme entendimento da prescrição quinquenal.
Desta forma, a revisão das atividades concomitantes pode ser bastante vantajosa, de forma que se recomenda a análise minuciosa do tempo contributivo e da carta de concessão para verificar e realizar o pedido revisional.
Diferenças de valores pelo cálculo com base no entendimento do INSS em relação ao entendimento jurisprudencial:
Como referido, o INSS tem entendimento de que as atividades concomitantes somente poderão ser somadas após a vigência da Lei 13.846/19. No entanto, o entendimento jurisprudencial é de que é possível a soma das contribuições desde a vigência da Lei 9.876/99, o que seria muito mais vantajoso.
Para melhor compreender essa diferença de entendimentos e o quão desvantajoso pode ser o cálculo do INSS, vejamos o exemplo abaixo:
Cálculo aplicado pelo INSS: Em síntese, o INSS considera uma das atividades como a “primária” – a que possui maior tempo de contribuição –, sendo que, referente a esta atividade, os recolhimentos são normalmente computados para o cálculo do benefício.
No tocante à atividade “secundária”, o cálculo consistirá em um percentual da média dos salários-de-contribuição, auferido da relação entre os anos completos da atividade e o tempo de contribuição necessário à concessão da aposentadoria.
Assim, no caso de um segurado homem de 35 anos de tempo de contribuição em uma atividade; 10 anos de tempo de contribuição em outra concomitante; 58 anos de idade; requer a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
Atividade primária:
35 anos de contribuição;
Média dos recolhimentos: R$ 2.000,00 x Fator Previdenciário (0,844) = R$: 1.688,00
Atividade secundária:
10 anos de contribuição
Média dos recolhimentos: R$ 1.000,00 x proporção (10/35) = 285,71 x Fator Previdenciário (0.230) = R$ 65,71
Valor do benefício = 1.688,00 (atividade primária) + 65,71 (atividade secundária) = R$ 1753,71
Note-se que mesmo tendo contribuído por 10 anos sob o valor de R$ 1.000,00 na atividade “secundária”, tal vínculo garantiu um acréscimo de apenas R$65,71 no valor da aposentadoria deste segurado!
Cálculo nos termos do entendimento firmado pela TNU e STJ: As teses fixadas por ocasião dos Temas 167 e 1070, respectivamente ó, deixam claras a forma de cálculo estabelecida, determinando a soma integral das contribuições desde, pelo menos, a vigência da Lei 9.876/99.
Aqui não há a aplicação da proporcionalidade nem tampouco do fator previdenciário para a atividade secundária, ocorrendo apenas a soma dos salários-de-contribuição oriundos das remunerações percebidas em períodos concomitantes. Ou seja, se o segurado percebeu, no mesmo mês, R$ 2.000,00 em relação a uma atividade e R$ 1.000,00 em relação a outra, o salário-de-contribuição desta competência será de R$ 3.000,00.
Em comparação ao exemplo anterior, o mesmo segurado, utilizando um período básico de cálculo (PBC) de 20 anos, sendo 10 com atividades concomitantes, teria como média o valor de R$ 2.500,00 e, após a multiplicação pelo Fator Previdenciário (0,844), o valor do benefício seria de R$ 2.110,00.
Note-se, portanto, que a diferença é bastante expressiva, merecendo o tema a devida atenção de todos previdenciaristas.
Conclusão
As atividades concomitantes são duas ou mais atividades desempenhadas pelos segurados no mesmo período, para as quais são vertidas contribuições previdenciárias.
Tais contribuições atualmente devem ser somadas para fins de cálculo da renda de benefícios. Contudo, nem sempre foi assim. Inclusive, a jurisprudência alternou seu entendimento passando a adotar a soma das contribuições concomitantes a partir da Lei 9.876/99, conforme Tema 1.070 do STJ.
Apesar do entendimento atual e das discussões jurisprudenciais, o INSS ainda aplica o seu entendimento restritivo, somando as contribuições apenas se todas as atividades ensejarem o direito ao benefício ou se for posterior à Lei 13.846/19, o que torna bastante desvantajoso o cálculo quando se tem atividades concomitantes.
Logo, ao ser verificado que o INSS aplicou o entendimento restritivo, é possível pedir a revisão judicial para que seja aplicado o entendimento do STJ e da TNU. No entanto, antes de realizar o pedido, recomenda-se, sempre, a análise por um advogado especialista em direito previdenciário para verificar a real vantagem da revisão e a possibilidade do pedido, diante dos prazos decadenciais e prescricionais.
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