Em nota publicada no dia 17 de novembro de 2016, o Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário – IBDP, lançou suas considerações sobre as dúvidas que surgiram no meio jurídico após o julgamento da desaposentação.

Confira a nota abaixo, na íntegra.

Nota sobre Desaposentação (IBDP)

O Supremo Tribunal Federal, na linha de seus precedentes histórico sem direito previdenciário – logo nenhuma surpresa –proferiu decisão no sentido de haver a necessidade de lei para regulamentar a denominada desaposentação. Socorreu-se o tribunal do princípio da precedência da fonte de custeio.

Uma vez proferida a decisão algumas dúvidas despontaram. Para auxiliar nossos associados trazemos brevíssimas considerações na presente nota sobre algumas delas.

Honorários de sucumbência:

Devemos lembrar que só são cabíveis sem face daqueles segurados que ajuizaram demanda visando a desaposentação sem terem direito à justiça gratuita. E aqui vale o alerta de que: sim, em a União desejando poderá questionar as declarações de hipossuficiência, desde que comprometer o segurado deixado de atender aos requisitos legais para tal benesse.

Isto porque o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, mesmo antes do novo CPC, já tinham firmado posição no sentido de que a declaração de hipossuficiência pelo requerente já era prova hábil para a concessão da justiça gratuita, mas poderia ser afastada mediante prova em contrário. Estrutura que o próprio CNJ na Res. 35/2007 alterada recentemente pela 220/2016, ao dispor sobre gratuidade nos serviços notariais e de registro já asseverava pela eficácia da simples declaração.

Contudo, em sendo questionada a justiça gratuita há sim um grande distanciamento entre os critérios adotados porcada tribunal para definir quem se reveste deste direito, alguns partem da premissa da isenção do imposto de renda, outros do teto do INSS, outros de que a pessoa não perceba mensalmente valores superiores a 10 salários mínimos.

Mas diante desta celeuma que permeia o debate em torno da desaposentação julgada improcedente, cumpre lembrar a valiosíssima decisão do Min. Benedito Gonçalves que, mesmo afastando do STJ a decisão de um critério objetivo, acabou por delinear a estrutura a ser questionada nas instâncias inferiores, sobre o que recomendamos a leitura da íntegra do relatório e voto em: https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ATC&sequencial=15410366&num_registro=201100141038&data=20110527&tipo=91&formato=PDF

Uma vez afastada a justiça gratuita, e aqui cumpre lembrar que o próprio CNIS do segurado pode ser utilizado como prova para afastar o direito, como ficam os honorários de sucumbência?

Nestes casos resta fundamental que se atente para, pelo menos dentre todos os problemas, o momento processual pois:

  • Se já houve sentença e recurso antes do novo CPC entrar em vigência (18/03/2015) as regras de honorários permanecem as do antigo CPC;
  • Se houve sentença, mas o recurso já foi manejado na vigência do novo CPC, o entendimento praticamente unânime é de que valem as regras do novo CPC e os honorários podem ser majorados na fase recursal, nos termos do CPC, art. 85, § 11.

 

Não podemos negar que aqui haverá o debate sobre os percentuais iniciais e finais nas demandas envolvendo o INSS, tendo em vista o reconhecimento de sua natureza de Fazenda Pública, nos termos da Súmula 483 do Superior Tribunal de Justiça, e os dispositivos do CPC, art. 85, § 3o, bem como em relação à base de cálculo dos honorários sucumbências em face da Súmula 111 do STJ.

Logo todo o cuidado é pouco porque já há uma forte corrente para afastar as disposições sobre o escalonamento de percentuais de honorários previsto no CPC, art. 85, § 3oem relação às demandas previdenciárias em que o INSS for o vencedor, tendo em vista a histórica decisão de que nas lides previdenciárias não se trata de um debate entre a autarquia no plano de custeio e o segurado, mas da autarquia como concessora de benefícios e o segurado; bem como a interpretação de que o dispositivo só seria aplicado em sendo o INSS vencido, o que não seria o caso na desaposentação.

Tutela de evidência:

Seja em relação aos que estavam beneficiados por liminares ou tutelas antes do novo CPC, seja os que vieram a receber a tutela de evidência, o risco de devolução já era de conhecimento, especialmente após a ADI 675-4 que resultou na alteração da Lei 8213/91, art. 130 pela Lei 9.528/1997, pois ali já havia a sinalização do cenário que eclodiria com a decisão do STJ de 04/12/2007 no RESP 988.171 de relatoria do Min. Napoleão Nunes Maia Filho em que restou consignado:

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS A TÍTULO DE TUTELA ANTECIPADA POSTERIORMENTE REVOGADA. POSSIBILIDADE. LIMITAÇÃO DO DESCONTO A 10% SOBRE O VALOR LÍQUIDO DA PRESTAÇÃO DO BENEFÍCIO. 1. A tutela antecipada é provimento jurisdicional de caráter provisório, que, nos termos do art. 273, § 3º e 475-O do CPC, tem a sua execução realizada por iniciativa, conta e responsabilidade do exeqüente, que se obriga, se a decisão for reformada, a reparar os danos que o executado haja sofrido. 2. De acordo com o art. 115 da Lei 8.213/91, que disciplina os planos de benefícios da Previdência Social, havendo pagamento além do devido, como no caso, o ressarcimento será efetuado por meio de parcelas, nos termos determinados em regulamento, ressalvada a ocorrência de má-fé. 3. Tendo em vista a natureza alimentar do benefício previdenciário e a condição de hipossuficiência do segurado, reputa-se razoável o desconto de 10% sobre o valor líquido da prestação do benefício, a fim de restituir os valores pagos a mais, decorrente da tutela antecipada posteriormente revogada. 4. Embora possibilite a fruição imediata do direito material, a tutela antecipada não perde a sua característica de provimento provisório e precário, daí porque a sua futura revogação acarreta a restituição dos valores recebidos em decorrência dela (art. 273, § 3º e 475-O do CPC). 5. Recurso Especial do INSS provido. (Grifo nosso.)

 

Instado à época o Supremo Tribunal Federal já tinha precedentes no sentido de não conhecer de recursos extraordinários sobre a matéria tendo em vista:

Agravo regimental no recurso extraordinário. Previdenciário. Devolução de valores recebidos indevidamente por segurado do Regime Geral da Previdência Social. 1. O art. 115 da Lei nº 8.213/91 não foi declarado inconstitucional, tampouco teve afastada sua aplicação pela Corte de origem. Não ocorrência, destarte, de violação do princípio da reserva de plenário. 2. Má aplicação de norma de caráter infraconstitucional configura ofensa meramente reflexa à Constituição, insuscetível de apreciação em recurso extraordinário. Precedentes. 3. Agravo regimental não provido. “(RE 596212 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 24/04/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-098 DIVULG 18-05-2012 PUBLIC 21-05-2012)(Grifo nosso.)

 

O tempo passou e em 12/06/2013 a Primeira Sessão do Superior Tribunal de Justiça ao julgar o Resp 1.384.418 firmou o entendimento pela devolução dos valores percebidos por antecipação de tutela posteriormente revogada.

No que vem sendo seguida pela  2 Sessão, ao que convidamos o leitor, pela didática do voto e pelas palpitantes provocações que o mesmo nos desperta (aqui não há espaço para esse debate), à leitura acórdão proferido em 13/04/2016 no Resp 1.548.749 – RS.

Neste ponto, dentre as considerações a serem feitas, três merecem destaque:

a) a decisão não foi unânime, o que motiva vez ou outra decisão de Turma do STJ contrárias à decisão da Sessão;

b) o STF acabou se manifestando em alguns casos sobre a irrepetibilidade dos valores, como por exemplo, no julgamento do ARE 734.242 de relatoria do Min. Roberto Barroso, segundo o qual:

(…) A jurisprudência do STF já assentou que o benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado, em decorrência de decisão judicial, não está sujeito à repetição de indébito, em razão de seu caráter alimentar. Precedentes. 2. Decisão judicial que reconhece a impossibilidade de descontos dos valores indevidamente recebidos pelo segurado não implica declaração de inconstitucionalidade do art. 115 da Lei nº 8.213/1991.

 

c) o sistema processual sofreu profundas alterações desde aquela decisão de 2013.

Resumidamente temos então que:

  1. Se a tutela foi concedida e mantida pelo Tribunal Regional Federal, mas vier a ser reformada pela decisão de instância superior, seguindo entendimento exarado no EDIV. no Resp1.086.154, não há de se falar em devolução de valores, tendo em vista a estabilização do julgado ante a impossibilidade de Corte Superior analisar matéria de prova. Importante destacar que este fundamento demanda um profundo debate no processo e uma forte atuação junto ao STJ para fazer prevalecer o entendimento do acórdão ora em comento;
  2. Por via de exclusão, se a tutela não foi confirmada em sentença ou mesmo no acórdão, a devolução de valores ficará sob o manto da decisão do STJ proferida em sede de repetitivo pela repetibilidade, tendo em vista a precariedade da decisão.

Sem exaurir o tema, mesmo porque não é o objeto desta nota,cumpre destacar que o novo CPC trouxe fortes argumentos para justificara irrepetibilidade de valores recebidos mediante tutela, somente a título de exemplos citamos os arts.: 332, II, 496, § 4o, 521, IV e 932, IV, b, dentre outros.

Por fim, precisamos tomar consciência de que o direito previdenciário não pode ser estudado e aplicado de forma divorciada do estudo da hermenêutica jurídica, do direito constitucional, do direito administrativo e do processo civil. A era das demandas de massa cedeu espaço a um amadurecimento do direito previdenciário e estarmos preparados para isso é uma questão não mais de necessidade, mas de sobrevivência.

O IBDP na linha de sua construção histórica pautada no estudo técnico-científico do direito previdenciário está à disposição dos associados e da sociedade em geral para o desenvolvimento da base sólida que norteou e norteará o direito previdenciário, como já o fez em demandas de grande repercussão como da conversão de tempo especial em comum e do conversor 1,2 para 1,4.

O advento do novo CPC faz com que as demandas previdenciárias deixem cada vez mais os núcleos individuais para repercutirem sobre todos e precisamos unir forças para que as grandes teses jurídicas sejam exitosas. O novo CPC fortaleceu o conjunto ao ampliar os poderes da figura denominada amicuscuriae, e isto permitirá uma atuação mais direta do IBDP.

Nesta linha a presente nota não teve o objetivo de esgotar as temáticas em torno do tema desaposentação, mas apenas expor algumas linhas a serem observadas no encaminhamento do tema.

Por fim, esclarecemos que o IBDP, na condição de amicuscuriae, oporá embargos de declaração em face do acórdão proferido no tema 503.

Melissa Folmann

Diretoria Científica do IBDP

Jane Lucia Wilhelm Berwanger

Presidente do IBDP

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