A aposentadoria por invalidez, também chamada de aposentadoria por incapacidade permanente, é o benefício concedido às pessoas que, preenchida a qualidade de segurado e a carência mínima (quando necessária), possuem incapacidade permanente para as atividades que habitualmente desempenham.
O ponto que costuma gerar controvérsias é a incapacidade, pois embora se entenda que o benefício deve ser concedido a quem tiver uma incapacidade total e permanente, há entendimentos que permitem flexibilizar esse critério, sendo concedido o benefício mesmo quando a incapacidade é considerada parcial.
Nesta linha, a TNU julgou o Tema 274, que versa sobre a possibilidade de análise de outras variantes quando o perito aponta somente a incapacidade parcial do segurado, em se tratando de doença estigmatizada.
Continue a leitura e entenda sobre o Tema 274 e as condições pessoais para fins de aposentadoria por incapacidade permanente.
Aposentadoria por invalidez e incapacidade parcial
Como referido, a aposentadoria por invalidez requer o preenchimento dos requisitos: incapacidade total e permanente; qualidade de segurado; e, em alguns casos, a carência.
A incapacidade total e permanente é aquela em que o segurado não possui condições de retornar às suas funções habituais, ou qualquer outra, de forma permanente. Isto é, a sua patologia e sua condição são irreversíveis. Ademais, deve ser considerado insusceptível de reabilitação.
Tal critério é bastante rigoroso e não raras vezes os segurados apresentam patologias que embora não sejam patologias que lhe impeçam de desempenhar todas as atividades que possui competência, devido a outras circunstâncias e fatores externos, pode-se considerar que a incapacidade seria total e permanente.
É o caso, por exemplo, de um segurado em que o único tratamento possível seja o procedimento cirúrgico pelo SUS. Neste caso, considerando a fila do SUS e ainda a impossibilidade de o segurado ser obrigado a se submeter ao procedimento invasivo, é possível afastar a parcialidade da incapacidade, considerando-a total.
Outro exemplo é da pessoa com doença estigmatizante. Ainda que a doença, por si só, não seja geradora do direito ao benefício de aposentadoria por invalidez, os fatores impostos pela sociedade, é suficiente para enquadrar o segurado como apto a receber o benefício.
Neste contexto, cumpre destacar que a Turma Nacional de Uniformização, ao decidir a Súmula 47, já mitigou a questão da incapacidade, fixando a tese de que devem ser analisadas as condições pessoais, sociais e econômicas para a concessão da aposentadoria por invalidez:
Súmula 47: Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez.
No mesmo sentido, assim decidiu na Súmula 78, quando traz a análise das condições pessoais em caso de pessoas acometidas de HIV:
Súmula 78:
Comprovado que o requerente de benefício é portador do vírus HIV, cabe ao julgador verificar as condições pessoais, sociais, econômicas e culturais, de forma a analisar a incapacidade em sentido amplo, em face da elevada estigmatização social da doença.
Com efeito, tratou-se do reconhecimento das dificuldades a mais trazidas por uma doença ainda bastante estigmatizada por boa parte da sociedade. Poder considerar as barreiras de socialização, bem como a complexidade em se inserir no meio de trabalho em razão da doença auxiliou sobremaneira os segurados afetados.
Isso porque, ainda que muitas vezes a doença pudesse se encontrar estabilizada, o simples fato de estar com ela poderia ser motivo para uma não contratação. Portanto, a incapacidade, nesses casos, passou a ser analisada de maneira mais ampla.
Nesse sentido, a produção de prova testemunhal pode ser essencial para comprovar as limitações impostas pelo HIV, para além da incapacidade em seu espectro mais simples.
Análise das condições sociais e pessoais para outras doenças em aposentadoria por invalidez
No mesmo sentido da Súmula 78, que viabilizou a concessão da aposentadoria por invalidez a pessoas acometidas de HIV, em maio de 2021, a TNU decidiu permitir a análise dessas condições em relação a outras doenças igualmente estigmatizadas. Todavia, é necessário que o Perito tenha concluído, pelo menos, pela existência de incapacidade parcial e permanente.
Dessa forma, fixou-se a seguinte tese no Tema 274:
Tema 274: É possível a concessão de aposentadoria por invalidez, após análise das condições sociais, pessoais, econômicas e culturais, existindo incapacidade parcial e permanente, no caso de outras doenças, que não se relacionem com o vírus HIV, mas, que sejam estigmatizantes e impactem significativa e negativamente na funcionalidade social do segurado, entendida esta como o potencial de acesso e permanência no mercado de trabalho.
Em seu voto, o Relator Juiz Federal Luis Eduardo Bianchi Siqueira, destacou que é o caso de doenças como lúpus, fogo selvagem e vitiligo. Acerca dessa última patologia, o N. Julgador ainda se manifestou:
(…) Em princípio, não haveria qualquer incapacidade física para o trabalho, puramente, em função do vitiligo em si, porque não há um relação de causa e efeito entre a sua existência e algum grau de redução funcional da capacidade de trabalho.
Porém, como as manchas aparentes provocam esse efeito de desclassificação social, com o rebaixamento da identidade social do indivíduo, com base em determinados estereótipos sociais, a sua empregabilidade, para determinadas funções, tende a ser bastante reduzida. (…)
Acesse a íntegra da decisão aqui.
Voto-vista e a inserção no mercado de trabalho
Por fim, destaca-se que em seu voto, o Juiz Federal Ivanir Cesar Ireno Junior solicitou que fosse acrescentado o trecho final à tese. Dessa forma, ela passou a conter o significado de funcionalidade social do segurado. Para a Corte, ela se traduz no “potencial de acesso e permanência no mercado de trabalho”.
Conforme já referi, novamente se faz muito importante a realização de audiência de instrução e julgamento, para fins de demonstrar essas condições. Pessoas que saibam da condição do segurado e da sua dificuldade em conseguir emprego, por exemplo, podem ser peças-chave para casos assim.
Por outro lado, o Juiz Federal Fábio Souza foi voto vencido, ao sugerir que a análise das condições sociais e pessoais independeria da constatação de incapacidade. Em razão disso, verifica-se que a decisão vai na direção do disposto na Súmula 77, da TNU, que versa sobre a não obrigatoriedade do juiz de analisar condições pessoais se não houver constatação de incapacidade.
Portanto, é necessário ao menos que o expert tenha referido a incapacidade, mesmo que parcial, para concessão da aposentadoria por invalidez.
Aplicação do Tema 274 da TNU
O Tema 274 da TNU transitou em julgado em 24/10/2022, passando a ser aplicado de forma obrigatória aos Juizados Especiais Federais do Brasil. As decisões que não observarem a tese firmada, podem ser reformadas após a análise e decisão dos pedidos de uniformização.
O que são análises das condições pessoais?
A análise das condições pessoais, de forma ampla, é a análise realizada pelo juiz acerca dos meios em que o requerente vive. Como a patologia e o ingresso no mercado de trabalho (ou retorno ao trabalho) é impactado pela aparência, pelas limitações decorrentes da doença, pelo histórico profissional entre outros.
O que são estigmas sociais?
O estigma social é uma imagem criada através de estereótipos e preconceitos que inviabilizam o bom convívio em sociedade. Pode ser algo referente à aparência, como também a comportamentos.
O juiz é obrigado a analisar as condições pessoais em todo o processo de aposentadoria por invalidez?
Não, com base no entendimento da Turma Nacional de Uniformização, os juízes devem avaliar as condições pessoais quando se tratar de incapacidade parcial e permanente e quando, além da incapacidade parcial e permanente, tratar-se de doença estigmatizante, como o HIV, por exemplo.
Qual a diferença entre incapacidade parcial e total?
A incapacidade parcial é aquela em que há uma incapacidade apenas para a atividade habitualmente desenvolvida, mas não para toda e qualquer atividade. Já a incapacidade total é aquela em que o segurado não consegue mais desempenhar qualquer atividade laborativa que lhe garanta subsistência.
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