Ementa para citação:

EMENTA: ADMINISTRATIVO. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRÂNSITO EM CRUZAMENTO DE VIA FÉRREA COM RODOVIA MUNICIPAL. FATAL. FALHA NA SINALIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE DA CONCESSIONÁRIA E DO MUNICÍPIO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA UNIÃO. CULPA CONCORRENTE. DANOS MATERIAIS E MORAIS CONFIGURADOS. PENSÃO. QUANTIFICAÇÃO. HONORÁRIOS.

1. A jurisprudência pátria tem assentado a possibilidade jurídica do pagamento de indenização decorrente de acidente de trânsito quando demonstrada a ação ou omissão imputável ao ente público no tocante à conservação e sinalização da rodovia, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa (nos termos do art. 37, §6º, CF/88).

2. A responsabilidade estatal por ato omissivo é subjetiva, pois não há conduta ilícita do Estado que não seja proveniente de negligência, imprudência ou imperícia (culpa) ou, então, deliberado propósito de violar a norma que o constituía em dada obrigação (dolo).

3. É civilmente responsável, por culpa concorrente, a concessionária do transporte ferroviário pelo acidente envolvendo trem em via férrea, porquanto incumbe à empresa que explora essa atividade cercar e fiscalizar, devidamente, a linha, de modo a impedir sua invasão por terceiros, notadamente em locais urbanos e populosos.

4. Hipótese de responsabilidade subsidiária da União.

5. A responsabilidade do município decorre da sua obrigação de manter e implementar a sinalização necessária de controle viário, no âmbito de sua circunscrição , conforme dispõe o Código de Transito Brasileiro (Lei nº 9.503/97, art. 21, III). Caso em que o acidente aconteceu em cruzamento de linha férrea com via municipal, restando caracterizada a responsabilidade de ambos.

6. O dano moral decorrente do abalo gerado pela perda de pai e marido é considerado in re ipsa, isto é, não se faz necessária a prova do prejuízo, que é presumido e decorre do próprio fato

7. Comprovado o nexo de causalidade entre o acidente e a falta de sinalização nas vias férrea e municipal, bem como o comportamento temerário do motorista da viatura policial em que se encontrava a vítima, configurada a culpa concorrente das partes pelos danos morais e materiais.

8. Na quantificação do dano moral devem ser sopesadas as circunstâncias e peculiaridades do caso, as condições econômicas das partes, a menor ou maior compreensão do ilícito, a repercussão do fato e a eventual participação do ofendido para configuração do evento danoso. A indenização deve ser arbitrada em valor que se revele suficiente a desestimular a prática reiterada da prestação de serviço defeituosa e ainda evitar o enriquecimento sem causa da parte que sofre o dano.

9. A partir da vigência da Lei nº 11.960/09 (30-06-2009) sobre o quantum indenizatório incidem juros de mora nos índices oficiais de remuneração básica e juros da caderneta de poupança para fins de remuneração do capital e compensação da mora (ERESP 1.207.197/RS).

10. Ausente o provedor (pai/cônjuge), morto em acidente de trânsito, não mais poderá arcar com as despesas familiares, o que justifica o arbitramento de pensão de caráter civil.

11. Não é incompatível o recebimento de benefício previdenciário, no caso pensão por morte, com a fixação de pensão de natureza civil.

12. A pensão correspondente à indenização oriunda de responsabilidade civil deve ser reajustada com base no salário-mínimo. Inteligência do enunciado n° 490 da súmula do Supremo Tribunal Federal.

13. Tendo em vista que a remuneração da vítima por certo destinava-se também às despesas próprias, como indica a jurisprudência, considera-se, para fins de pensão civil, 2/3 da renda. No caso, tratando-se de culpa concorrente, cabe ao réus arcarem com o pagamento de pensão mensal no valor de 1/3 da renda da vítima.

14. Readequação da distribuição sucumbencial.

(TRF4, AC 5000077-51.2010.404.7201, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão Luís Alberto D’azevedo Aurvalle, juntado aos autos em 02/12/2014)


INTEIRO TEOR

APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000077-51.2010.404.7201/SC

RELATOR:LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
APELANTE:ELIEL FERNANDES DOS SANTOS
:JACKSON FERNANDES DOS SANTOS
:MARISOL APARECIDA FERNANDES DOS SANTOS
:SILAS FERNANDES DOS SANTOS
:VALÉRIA FERNANDES DOS SANTOS
:VANESSA FERNANDES DOS SANTOS
ADVOGADO:Filipe Ximenes de Melo Malinverni
:Claudio Avila da Silva Junior
:GUILHERME STINGHEN GOTTARDI
APELADO:ALL – AMÉRICA LATINA LOGÍSTICA S.A.
:MUNICÍPIO DE JOINVILLE
:UNIÃO – ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
INTERESSADO:MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

EMENTA

ADMINISTRATIVO. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRÂNSITO EM CRUZAMENTO DE VIA FÉRREA COM RODOVIA MUNICIPAL. FATAL. FALHA NA SINALIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE DA CONCESSIONÁRIA E DO MUNICÍPIO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA UNIÃO. CULPA CONCORRENTE. DANOS MATERIAIS E MORAIS CONFIGURADOS. PENSÃO. QUANTIFICAÇÃO. HONORÁRIOS.

1. A jurisprudência pátria tem assentado a possibilidade jurídica do pagamento de indenização decorrente de acidente de trânsito quando demonstrada a ação ou omissão imputável ao ente público no tocante à conservação e sinalização da rodovia, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa (nos termos do art. 37, §6º, CF/88).

2. A responsabilidade estatal por ato omissivo é subjetiva, pois não há conduta ilícita do Estado que não seja proveniente de negligência, imprudência ou imperícia (culpa) ou, então, deliberado propósito de violar a norma que o constituía em dada obrigação (dolo).

 3. É civilmente responsável, por culpa concorrente, a concessionária do transporte ferroviário pelo acidente envolvendo trem em via férrea, porquanto incumbe à empresa que explora essa atividade cercar e fiscalizar, devidamente, a linha, de modo a impedir sua invasão por terceiros, notadamente em locais urbanos e populosos.

4. Hipótese de responsabilidade subsidiária da União.

5. A responsabilidade do município decorre da sua obrigação de manter e implementar a sinalização necessária de controle viário, no âmbito de sua circunscrição , conforme dispõe o Código de Transito Brasileiro (Lei nº 9.503/97, art. 21, III). Caso em que o acidente aconteceu em cruzamento de linha férrea com via municipal, restando caracterizada a responsabilidade de ambos.

6. O dano moral decorrente do abalo gerado pela perda de pai e marido é considerado in re ipsa, isto é, não se faz necessária a prova do prejuízo, que é presumido e decorre do próprio fato

7. Comprovado o nexo de causalidade entre o acidente e a falta de sinalização nas vias férrea e municipal, bem como o comportamento temerário do motorista da viatura policial em que se encontrava a vítima, configurada a culpa concorrente das partes pelos danos morais e materiais.

8. Na quantificação do dano moral devem ser sopesadas as circunstâncias e peculiaridades do caso, as condições econômicas das partes, a menor ou maior compreensão do ilícito, a repercussão do fato e a eventual participação do ofendido para configuração do evento danoso. A indenização deve ser arbitrada em valor que se revele suficiente a desestimular a prática reiterada da prestação de serviço defeituosa e ainda evitar o enriquecimento sem causa da parte que sofre o dano.

9. A partir da vigência da Lei nº 11.960/09 (30-06-2009) sobre o quantum indenizatório incidem juros de mora nos índices oficiais de remuneração básica e juros da caderneta de poupança para fins de remuneração do capital e compensação da mora (ERESP 1.207.197/RS).

10. Ausente o provedor (pai/cônjuge), morto em acidente de trânsito, não mais poderá arcar com as despesas familiares, o que justifica o arbitramento de pensão de caráter civil.

11. Não é incompatível o recebimento de benefício previdenciário, no caso pensão por morte, com a fixação de pensão de natureza civil.

12. A pensão correspondente à indenização oriunda de responsabilidade civil deve ser reajustada com base no salário-mínimo. Inteligência do enunciado n° 490 da súmula do Supremo Tribunal Federal.

13. Tendo em vista que a remuneração da vítima por certo destinava-se também às despesas próprias, como indica a jurisprudência, considera-se, para fins de pensão civil, 2/3 da renda. No caso, tratando-se de culpa concorrente, cabe ao réus arcarem com o pagamento de pensão mensal no valor de 1/3 da renda da vítima.

14. Readequação da distribuição sucumbencial.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento às apelações da parte autora e do MPF, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 02 de dezembro de 2014.

Desembargador Federal Luís Alberto D’Azevedo Aurvalle

Relator



Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal Luís Alberto D’Azevedo Aurvalle, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7183908v4 e, se solicitado, do código CRC 4C4103FF.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): Luís Alberto D’Azevedo Aurvalle
Data e Hora: 02/12/2014 17:32


APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000077-51.2010.404.7201/SC

RELATOR:LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
APELANTE:ELIEL FERNANDES DOS SANTOS
:JACKSON FERNANDES DOS SANTOS
:MARISOL APARECIDA FERNANDES DOS SANTOS
:SILAS FERNANDES DOS SANTOS
:VALÉRIA FERNANDES DOS SANTOS
:VANESSA FERNANDES DOS SANTOS
ADVOGADO:Filipe Ximenes de Melo Malinverni
:Claudio Avila da Silva Junior
:GUILHERME STINGHEN GOTTARDI
APELADO:ALL – AMÉRICA LATINA LOGÍSTICA S.A.
:MUNICÍPIO DE JOINVILLE
:UNIÃO – ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
INTERESSADO:MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto contra sentença que, nos autos de ação ordinária de indenização por danos morais e materiais decorrentes de acidente de trânsito, julgou o feito nos seguintes termos:

Pelo exposto, julgo improcedente o pedido, havendo resolução de mérito nos termos do artigo 269, I, do Código de Processo Civil.

Condeno os autores no pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios que fixo, nos termos do § 4º do artigo 20 do Código de Processo Civil, em R$ 1.000,00 (mil reais) para cada réu. Ressalvo, no entanto, que tendo sido deferido aos autores o benefício da Justiça Gratuita, resta suspensa a exigibilidade da verba referida, nos termos da Lei nº 1.060/50.

A parte autora apela, sustentando ser objetiva a responsabilidade dos réus e assevera que o dever de indenizar está lastreado nas provas de insuficiência de sinalização aliado às péssimas condições de visibilidade no local do acidente. Sucessivamente, defende a culpa concorrente. Requer a condenação na indenização por danos morais em, no mínimo, R$ 255.000,00 em favor de cada um dos apelantes; e por danos materiais, consubstanciados em pensão mensal correspondente a 2/3 dos vencimentos que o de cujus faria jus no exercício da função de soldado da Polícia Militar de Santa Catarina, incluindo 1/3 de férias, 13º salário e demais gratificações, a ser paga aos filhos até a data em que completarem 25 (vinte e cinco) anos de idade, e à viúva até a data em que seu finado marido faria 75 (setenta e cinco) anos, sendo que, à medida em que aqueles já não fizerem mais jus ao recebimento da referida pensão, sejam suas frações acrescidas à parcela devida à viúva.

O Ministério Público Federal apela, requerendo seja reformada a sentença, a fim de que sejam julgados procedentes os pedidos veiculados na inicial.

Apresentadas contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

Os autores buscam a responsabilização civil das rés por danos morais e materiais em razão dos prejuízos sofridos em acidente de trânsito ocorrido em 04/10/2009 (que resultou na morte do pai/marido), em razão de que a viatura em que ele se encontrava foi abalroada por um trem, ao cruzar a ferrovia que corta o Município de Joinville.

Relatam que no dia 04 de outubro de 2009 houve uma rebelião no Presídio Regional de Joinville, e foi acionada a Polícia Militar para conter o conflito, tendo os policiais Jackson dos Santos, Tarcísio Mello Schroeder, Nelson de Oliveira e Wagner Sardo se dirigido ao local a bordo da viatura policial de placas MHF 0644. Mencionam que durante o trajeto, ao cruzar a ferrovia que corta o Município, a viatura colidiu com o trem, na altura da Avenida Getúlio Vargas, por volta das 08h30min, causando a morte do policial Jackson, que não resistiu aos ferimentos sofridos no acidente.

Argumentam que houve omissão dos réus em não adotar medidas de segurança no local (cancela, sinal luminoso e sonoro), havendo responsabilidade objetiva em razão de nada indicar culpa da vítima.

Da Responsabilidade Civil

A Constituição estabelece a responsabilidade objetiva da Administração Pública: “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: § 6° – As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa“.

Imputada a responsabilidade objetiva ao Estado, torna-se dispensável a verificação da existência de culpa do réu, bastando apenas a demonstração do nexo de causalidade entre o ato e o dano sofrido. Essa responsabilidade baseia-se na teoria do risco administrativo, em relação a qual basta a prova da ação, do dano e de um nexo de causa e efeito entre ambos, sendo, porém, possível excluir a responsabilidade em caso de culpa exclusiva da vítima, de terceiro ou ainda em caso fortuito ou força maior.

A responsabilidade estatal prescinde da comprovação de dolo ou culpa na conduta do seu agente, bastando ficar provado o nexo de causalidade entre esse dano e a conduta estatal. Neste sentido:

ACIDENTE DE TRÂNSITO. VEÍCULO DA UNIÃO CONDUZIDO POR POLICIAL RODOVIÁRIO FEDERAL. COMPROVADA A RESPONSABILIDADE DO POLICIAL PELO ACIDENTE. DESCABIMENTO DA DENUNCIAÇÃO DA EMPREITEIRA QUE FAZIA CONSERVAÇÃO DA RODOVIA E DO DNIT. SENTENÇA ULTRA PETITA – REDUÇÃO AO PEDIDO. LEGITIMIDADE DA UNIÃO POR ATO DE SEU AGENTE. INOCORRÊNCIA DE CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR. CERCEAMENTO DE DEFESA – INOCORRÊNCIA. Desnecessária para a garantia da lide de regresso a admissão da empreiteira que faz a manutenção da rodovia, além do que, evidenciada a responsabilidade do Policial que conduzia a viatura e não do estado da rodovia, afastada, também a responsabilidade do DNIT. Não estando contemplado na prefacial o pedido de indenização por danos estéticos, é de ser reduzida a condenação ao pedido, não caracterizando a nulidade da sentença. A teor do previsto no art. 37, § 6º da CF, responde a União civilmente pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, venham a causar a terceiros. Inocorrente o cerceamento de defesa pela não realização em perícia na viatura da PRF, pois pois a prova pericial foi pedida muito tempo depois do acidente, sendo impossível sua realização, além do que, as demais provas colhidas nos autos são suficientes para determinar as responsabilidades. (TRF4, APELREEX 2004.72.05.000737-3, Quarta Turma, Relator Jorge Antonio Maurique, D.E. 12/11/2010)

Contudo, quando o dano ocorre em decorrência de omissão do Estado aplica-se a teoria da responsabilidade subjetiva. Ora, se o Estado não agiu, não pode, logicamente, ser o autor do dano; não sendo o autor, só cabe responsabilizá-lo caso esteja obrigado a impedir o evento lesivo. Logo, a responsabilidade estatal por ato omissivo é subjetiva, pois não há conduta ilícita do Estado que não seja proveniente de negligência, imprudência ou imperícia (culpa) ou, então, deliberado propósito de violar a norma que o constituía em dada obrigação (dolo).

Sobre a responsabilidade da ALL-AMÉRICA LATINA LOGÍSTICA MALHA SUL S.A, a Lei nº 8.987/95, que dispõe sobre a Concessão e a Permissão de Serviços Públicos, em seu art. 25, estabelece a responsabilidade da concessionária em responder pelos prejuízos causados ao poder concedente, aos usuários e a terceiros, verbis:

“Art. 25. Incumbe à concessionária a execução do serviço

concedido, cabendo-lhe responder por todos os prejuízos

causados ao poder concedente, aos usuários ou a terceiros,

sem que a fiscalização exercida pelo órgão competente exclua

ou atenue essa responsabilidade.

§ 1o

Sem prejuízo da responsabilidade a que se refere este artigo,

a concessionária poderá contratar com terceiros o desenvolvimento

de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço

concedido, bem como a implementação de projetos associados”

O Superior Tribunal de Justiça tem orientação jurisprudencial no sentido de que é civilmente responsável, por culpa concorrente, a concessionária do transporte ferroviário pelo acidente envolvendo trem em via férrea, porquanto incumbe à empresa que explora essa atividade cercar e fiscalizar, devidamente, a linha, de modo a impedir sua invasão por terceiros, notadamente em locais urbanos e populosos (EREsp 705.859/SP, Rel. Min. Castro Filho, Segunda Seção, julgado em 13.12.2006, DJ 08.03.2007.)

No mesmo sentido:

DIREITO CIVIL E ADMINISTRATIVO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE. RESPONSABILIDADE CIVIL. CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. 1. A legitimidade da parte diz respeito às condições da ação, sendo questão de ordem pública e passível de revisão a qualquer tempo, até mesmo de ofício. 2. Conforme artigo 25 da Lei nº 8987, de 13/02/1995, cabe à concessionária arcar com os prejuízos causados aos usuários ou a terceiros, sem que a fiscalização do poder concedente possa vir a excluir ou atenuar esta responsabilidade. Outrossim, a atividade do concessionário rege-se pela responsabilidade objetiva, como averba o artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, o qual determina que, assim como as pessoas jurídicas de direito público, as pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos sujeitam-se àquela modalidade de responsabilização, que se caracteriza pela desnecessidade de investigação sobre o elemento culposo na ação ou omissão. Hipótese de responsabilidade subsidiária da União. 3. Não comprovados os lucros cessantes – ônus de quem alega – não há falar em sua indenização. (TRF4, AC 0003050-11.2003.404.7201, Quarta Turma, Relator Sérgio Renato Tejada Garcia, D.E. 04/02/2011)

PROCESSO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DO TRABALHO. ART. 120 DA LEI Nº 8.213/91. AÇÃO REGRESSIVA. CULPA DO EMPREGADOR. LEGITIMIDADE DO MUNICÍPIO CONTRATANTE. CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. Da leitura dos dispositivos de lei e da cláusula do contrato é possível concluir que o fato de sofrer fiscalização pelo Poder Público não exime a concessionária da responsabilização pelos danos causados ao longo da execução do serviço contratado, respondendo integralmente pela ocorrência de eventos danosos, o que a torna parte legítima para figurar no pólo passivo desta demanda. 2. Não obstante, é também imperioso que se ressalte que tal responsabilidade da concessionária não mitiga ou exclui a responsabilidade objetiva e subsidiária do Poder Público em relação a danos ocorridos ao longo da contratação mantida com a empresa concessionária do serviço público, a ser devidamente analisada em cada caso, razão pela qual também se evidencia a legitimidade passiva do Município contratante para o feito. 3. Procedente a alegação do apelante de desacolhimento do pedido de constituição de capital para o pagamento das parcelas vincendas. Segundo o art. 475-Q do CPC, a constituição de capital somente ocorre quando a dívida for de natureza alimentar. A aplicação do dispositivo legal para qualquer obrigação desvirtuaria a finalidade do instituto. No caso, a condenação da ré não se refere a um pensionamento, e sim a uma restituição, e o beneficiário não corre risco de ficar sem a verba alimentar, cujo pagamento é de responsabilidade da autarquia. 4. Recentemente a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça julgou o REsp 1.270.439/PR, sob a sistemática do art. 543-C do CPC, firmando compreensão no sentido de que, por força da declaração de inconstitucionalidade parcial do art. 5º da Lei 11.960/2009, deverá a correção monetária dos débitos da Fazenda Pública ser calculada com base no IPCA, índice que melhor reflete a inflação acumulada do período. E os juros de mora devem corresponder à taxa de juros simples de 6% ao ano. 5. Deve ser mantida a sentença que fixou os honorários em 10% sobre o valor da condenação, posto que em sintonia com a jurisprudência da Corte, e porque a sucumbência do INSS foi mínima. 6. Apelação parcialmente provida e recurso adesivo desprovido. (TRF4, APELREEX 5004623-09.2011.404.7107, Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, juntado aos autos em 22/05/2014)

Quanto à responsabilidade do Município de Joinville/SC decorre da sua obrigação de manter e implementar a sinalização necessária de controle viário, conforme dispõe o Código de Transito Brasileiro (Lei nº 9.503/97):

“Art. 21. Compete aos órgãos e entidades executivos rodoviários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, no âmbito de sua circunscrição:

III – implantar, manter e operar o sistema de sinalização, os dispositivos e os equipamentos de controle viário;”

Considerando que o acidente aconteceu em cruzamento de linha férrea com via municipal, caracterizada a responsabilidade de ambos.

Quanto à responsabilidade da União, afigura-se meramente subsidiária. Nesta linha:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. ACIDENTE DE TRÂNSITO EM FERROVIA. UNIÃO. LEGITIMIDADE PASSIVA. Descabe afastar a responsabilidade sobre os danos causados a terceiros do Poder concedente nesse momento processual, consoante preconiza o artigo 25 da Lei nº 8.987/95, devendo ser fixada a competência da Justiça Federal para processamento e julgamento da causa. (TRF4, EDAG 5009730-49.2010.404.0000, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão João Pedro Gebran Neto, juntado aos autos em 21/11/2012)

DIREITO CIVIL E ADMINISTRATIVO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE. RESPONSABILIDADE CIVIL. CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. 1. A legitimidade da parte diz respeito às condições da ação, sendo questão de ordem pública e passível de revisão a qualquer tempo, até mesmo de ofício. 2. Conforme artigo 25 da Lei nº 8987, de 13/02/1995, cabe à concessionária arcar com os prejuízos causados aos usuários ou a terceiros, sem que a fiscalização do poder concedente possa vir a excluir ou atenuar esta responsabilidade. Outrossim, a atividade do concessionário rege-se pela responsabilidade objetiva, como averba o artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, o qual determina que, assim como as pessoas jurídicas de direito público, as pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos sujeitam-se àquela modalidade de responsabilização, que se caracteriza pela desnecessidade de investigação sobre o elemento culposo na ação ou omissão. Hipótese de responsabilidade subsidiária da União. 3. Não comprovados os lucros cessantes – ônus de quem alega – não há falar em sua indenização. (TRF4, AC 0003050-11.2003.404.7201, Quarta Turma, Relator Sérgio Renato Tejada Garcia, D.E. 04/02/2011)

Do caso concreto

No caso dos autos, a controvérsia cinge-se à definição das causas do acidente que tirou a vida de Jackson: se o precário estado de sinalização do local do acidente ou a conduta imprudente do motorista da viatura em que se encontrava o de cujus.

Em que pese a tese das rés no sentido da culpa exclusiva da vítima, o conjunto probatório leva a conclusão de que houve deficiência na sinalização da via ferroviária.

Os depoimentos prestados confirmam a inexistência de cancela ou semáforo no local. Indicam, contudo, que havia sinalização no local, consistente nas placas ‘pare’ e ‘pare, olhe, escute’, na cruz de Santo André, e em linha de estímulo à redução de velocidade (sonorizador), e ainda confirmam que é fato notório a existência de passagem de nível na localidade.

Valho-me de trecho da sentença recorrida, a fim de prestar maior esclarecimento:

Como já referido na decisão do evento 101, o ponto controvertido consiste na (in)existência de nexo de causalidade entre ação ou omissão dos requeridos e o acidente acontecido em 04 de outubro de 2009.

Para a teoria da causalidade adequada, aplicável em sede de responsabilidade civil, ‘causa é o antecedente não só necessário, mas, também, adequado à produção do resultado’ (Sérgio Cavalieri Filho, in Programa de Responsabilidade Civil, Malheiros, 6ª edição, p. 73).

Para dirimir a questão fática, fundamentais os depoimentos das testemunhas:

Rafael dos Santos (evento 336):

Juíza: Iniciando o depoimento da testemunha Rafael dos Santos.

Juíza: Senhor Rafael o senhor sabe alguma coisa do acidente que vitimou o Sr. Jackson dos Santos?

Testemunha: Sim.

Juíza: O quê que o senhor sabe? O senhor estava naquela guarnição.

Testemunha: Eu estava cinquenta metros atrás, em outra viatura.

Juíza: O senhor ia numa viatura atrás?

Testemunha: Logo atrás.

Juíza: E o senhor estava na parte da frente dessa viatura ou nos bancos traseiros?

Testemunha: Era motorista.

Juíza: O senhor era o motorista da viatura que vinha logo atrás.

Testemunha: Sim.

Juíza: E o quê que o senhor viu? O senhor viu então o acidente?

Testemunha: Sim?

Juíza: Como foi o acidente?

Testemunha: Nós nos deslocamos do Batalhão, por volta de oito e trinta da manhã, em deslocamento pela Av. Getúlio Vargas, quando chegamos na altura da linha férrea houve o acidente.

Juíza: O senhor sabe me dizer se o Sr. Wagner, né, que era o motorista que ia a frente?

Testemunha: Sim.

Juíza: Ele parou antes da linha férrea?

Testemunha: Não.

Juíza: Não parou?

Testemunha: Não.

Juíza: Os senhores ouviram a buzina do trem?

Testemunha: Não.

Juíza: Não ouviram?

Testemunha: Não.

Juíza: Os senhores estavam com as sirenes ligadas no momento?

Testemunha: Sim.

Juíza: A sirene, ela impede que os senhores escutem os barulhos de, os barulhos externos?

Testemunha: Ela não impede que a gente ouça a nossa própria buzina. Então acredito que não seja tão ruim de ouvir assim de dentro da viatura, né? Porque com a sirene ligada você consegue ouvir a buzina da viatura. Que não é tão alta assim. Esse é o grau de comparação que eu faço.

Juíza: Certo. Então pelo que o senhor tá me dizendo o trem não buzinou?

Testemunha: Eu estou dizendo que nós não ouvimos.

Juíza: Não ouviram?

Testemunha: Não ouvimos.

Juíza: E o senhor falou que ele não parou?

Testemunha: Não parou.

Juíza: Não parou. E por quê que ele não parou? Não tem uma orientação pra… pra ele ir rápido mas com cautela?

Testemunha: Eu acho que pela calmaria da cidade. Num domingo, oito e trinta da manhã…

Juíza: Ah tá! Eram oito e trinta… Bem cedo então?

Testemunha: Bem cedo. Muito cedo pra um domingo.

Juíza: Pra um domingo, sim.

Testemunha: E a rua tava tranqüila, e a gente cruzou todas, onde poderia dar um acidente, em todas as transversais da Getúlio Vargas tranquilo, e por fatalidade a linha férrea foi dar o acidente. E quem parou fui eu, ele não parou, continuou tocando a linha férrea, né.

Juíza: Ah sim, o senhor parou antes da linha férrea?

Testemunha: É.

Juíza: E o senhor se recorda se os sinais luminosos tavam funcionando, os sinais?

Testemunha: Não.

Juíza: O senhor não se recorda ou não estavam funcionando?

Testemunha: Não. Não estavam funcionando.

Juíza: Não estavam funcionando. Havia algum outro tipo de sinalização no local?

Testemunha: Não, não há outro tipo de sinalização no local.

Juíza: Certo. Mas há a placa da passagem de nível?

Testemunha: A placa.

Juíza: O autor tem alguma pergunta?

Advogado do autor: Acerca da viatura do Wagner, não é? Se ela estava também com o giroflex ligado e farol aceso?

Testemunha: Olha, farol aceso, eu não posso dizer. Mas o giroflex ligado estava.

Advogado do autor: E no local há cancela?

Testemunha: Não. Não há cancela.

Advogado do autor: No local há sinal sonoro? Tipo aquele blém blém blém de passagem de nível?

Testemunha: Não. Não há.

Marinês de Souza

Juíza: Senhora Marinês, a senhora sabe alguma coisa a respeito do acidente que vitimou o Soldado PM Jackson dos Santos?

Testemunha: Sim. Eu presenciei.

Juíza: Certo. A senhora trabalhava ali perto?

Testemunha: Trabalhava. No Museu da Bicicleta. Ao lado onde tudo aconteceu.

Juíza: O Museu da Bicicleta é bem próximo do local onde houve o acidente?

Testemunha: Próximo.

Juíza: Bem próximo quanto, assim?

Testemunha: Aonde eu estava, questão de uns cinquenta metros.

Juíza: E como foi o acidente? O quê que a senhora se recorda?

Testemunha: Tá! Foi assim, então. Por em torno de umas oito e vinte, oito e quinze, oito e vinte pela manhã. Eu estava na parte detrás que dá acesso à linha do trem, né…

Juíza: As viaturas da Polícia estavam vindo de onde?

Testemunha: Isso, tava em direção Getúlio Vargas – Bairro. Centro-Bairro. E eu escutei… O trem já vinha vindo, escutei o apito ao passar na São Paulo. Ele tava subindo São Francisco rumo a São Bento e eu escutei ele apitar lá, aí tá ficou… Quando eu vi que ele se aproximou aos duzentos metros antes da Getúlio Vargas, eu escutei o apito. Escutei ele vir apitando. Ele apitou quatro ou cinco vezes.

Juíza: É do padrão do trem, da locomotiva, apitar quatro ou cinco vezes no cruzamento?

Testemunha: Sim.

Juíza: E o cruzamento da São Paulo é próximo também?

Testemunha: Próximo.

Juíza: Aí o trem vem apitando. Apita antes da São Paulo e apita na Getúlio…?

Testemunha: Ele apita no cruzamento da São Paulo e depois, logo em seguida, na Getúlio Vargas. Há um ano e oito meses que eu trabalhava no local, sempre presenciei isso… Aí eu ouvi sirene da Pólicia e ao mesmo tempo o trem apitando… e a sirene da polícia, de viaturas. Foi tudo muito rápido quando eu já olhei… eu já vi…questão…foi muito rápido. Eu só vi o estouro, né?! Quando eu olhei o trem bateu jogando a viatura próximo, numa rua de chão que tem lá. E eu só ouvi gritos, né?! E aí o trem já passou logo em seguida freiando. Assim que deu a batida ele já freio… Eles soltam freio areia, que dá um barulho de areia nos trilhos… E logo em seguida, questão de cinquenta, oitenta metros o trem já parou.

Juíza: A senhora viu se o, a viatura chegou a parar antes da linha férrea?

Testemunha: Não. Ele fez rumo que ele queria desviar, mas não conseguindo.

Juíza: A senhora fala desviou… Que ele quis passar a frente do trem, mas mais pra frente, que ele quis desviar a lateral…?

Testemunha: (prejudicado) rumo ao Museu da Bicicleta. O museu, indo no Bairro-Centro ele fica ao lado direito. Ao lado esquerdo tem a CIPLA, ao lado direito era o Museu da Bicicleta.

Juíza: Tá. Do lado esquerdo a CIPLA…

Testemunha: Tipo como que o motorista meio que quis manobrar pra tentar desviar do trem, mas não conseguiu. Nesse momento o trem tava apitando. E daí logo em seguida o trem parou né… E daí, eu já não vi mais nada, porque o trem ficou na minha frente de onde que eu estava… Aí eu já vi… Na época eu não sei o quê que ele era, mas hoje eu sei que ele era o Major Zelindro, né… Já logo em seguida gritando pro trem abrir passagem pra eles irem socorrer os colegas que já tavam tudo no chão. Quando eu vi por baixo…

Juíza: Ah tá! O Major Zelindro estava numa outra viatura então?

Testemunha: Numa outra viatura que vinha logo atrás.

Juíza: Tá. E eles não conseguiam passar porque o trem tava no meio da via férrea?

Testemunha: Não. Só uma viatura passou que foi essa que bateu. Aí ficou as duas portas laterais da viatura da PPT ficou grudado na parte dianteira do trem.

Juíza: A ALL tem perguntas?

Advogada da ALL: Sabe dizer se a outra viatura chegou também a bater no trem?

Testemunha: Não, não bateu.

Advogada da ré: Sem mais perguntas, Excelência.

Juíza: A União.

Advogado da União: Eu gostaria de entender um pouco melhor o acidente. A testemunha disse que o motorista da viatura teria virado tal. Ela viu a viatura chegando próximo da linha? Ela presenciou isso?

Testemunha: Sim. Da onde eu estava dava pra visualizar somente a passagem de nível.

Advogado da União: E a viatura chegou, o motorista da viatura chegou a fazer alguma manobra tipo de virar à direita ou à esquerda pra tentar…?

Testemunha: Ele tentou virar pra desviar mas não conseguiu.

Advogado da União: Ele virou pra esquerda?

Testemunha: Pra direita.

Advogado da União: À direita? Pra passar a frente do trem?

Testemunha: Isso. E não conseguiu.

Advogado da União: Essa manobra aconteceu um pouco antes da linha ou muito em cima da linha, você sabe?

Testemunha: Não sei dizer, preciso. Porque da onde eu tava assim, não dava pra ver bem… Mas foi questão assim de minutos. Foi muito rápido… e em questão de minutos já tinha acontecido a tragédia.

……

Zelindo Ismael Farias(evento 390)

Juiz: Eu queria que o senhor como testemunha, senhor Zelindo Ismael Farias, nos dissesse qual é o seu vínculo com esses fatos aqui, ouvidos no dia 04/10/2009, em que levou a óbito o PM Jackson dos Santos?

Depoente: Naquela ocasião eu estava de serviço como comandante no policiamento na cidade de Joinville, lotado no 8º Batalhão de Polícia Militar, por volta das 08:20h pouco, 08:30h, tomamos conhecimento que havia uma rebelião no Presídio Regional de Joinville e com reféns. Imediatamente desloquei as viaturas em apoio para que eles pudessem providenciar a contensão daquele evento, onde foi deslocada a viatura do PPT, inclusive, eu também, me desloquei simultaneamente junto com eles pra aquele local.

Juiz: O senhor estava seguindo essa Blazer Advantage?

Depoente: Na verdade a minha viatura, inclusive vinha inicialmente a frente. Na Rua Getúlio Vargas. Logo depois que ele entrou na Avenida eu fui ultrapassado pela viatura deles em função de que a gente quase teve um abalroamento de um outro veículo contra a minha viatura, nos vínhamos com as sirenes ligadas, com as viaturas em sinal de alerta e aí eu fiquei um pouco para trás e eles passaram uns 100m a frente e eu pude presenciar o acidente, ocorrido o fato.

Juiz: E isso foi lá na Av. Getúlio Vargas?

Depoente: Na Av. Getúlio Vargas.

Juiz: Por volta de 08:30h.

Depoente: Certo. Sim, senhor.

Juiz: Como era a situação desses policiais? Eles estavam em turno contínuo de trabalho? Ou tinham sido acionados naquele momento?

Depoente: Eles tinham acabado de entrar de serviço e estavam entrando no serviço. Foram acionados naquele momento.

Juiz: Já eram profissionais acostumados a esse tipo de diligência?

Depoente: Sim, senhor. Profissionais altamente treinados, preparados, pelotão tático, né.

Juiz: Há quanto tempo o Jackson já estava, o Jackson não, o Wagner que era o motorista, né?

Depoente: É. Eu não saberia dizer para o senhor o período precisamente que ele se encontrava lotado nessa função, mas já há um tempo eu estava no batalhão e me recordo dele do PPT de longo tempo.

Juiz: O Wagner (prejudicado)?

Depoente: Sim, senhor. Todos eles.

Juiz: A função dele era dirigir as viaturas mesmo?

Depoente: Sim, senhor.

Juiz: Qual era o nível de habilitação dele? O senhor sabe dizer qual era a CNH dele?

Depoente: Não saberia dizer pro senhor.

Juiz: Foi aberto algum procedimento interno para apurar eventual falha por parte dele?

Depoente: Foi feito sim, senhor. Foi feito procedimento penal, inquérito policial militar e procedimento administrativo que eu me recordo.

Juiz: E o sabe dizer qual foi a conclusão que foi tirada?

Depoente: Não saberia dizer pro senhor. Não acompanhei.

Juiz: Há alguma orientação em situações como esta, há que se dizer em se respeitar a sinalização qualquer que seja?

Depoente: Na verdade não houve desrespeito à sinalização, né.

Juiz: Lá não tinha nenhum sinal vermelho dizendo que vinha o trem?

Depoente: Não, senhor. Nós vínhamos em deslocamento com sirene ligada conforme determina a legislação, inclusive faróis ligados, as viaturas… Nesse cruzamento da Av. Getúlio Vargas infelizmente, é lamentável, mas ali não existe cancela, não existe semáforo e tão pouco, eu vinha logo atrás, não pude sequer ouvir o sinal sonoro por parte da locomotiva.

Juiz: Então lá não havia nem sinal visual? Nada?

Depoente: Não, senhor. Tinha somente aquela cruz de santo André afixada na rodovia, mas não existia semáforo e nem cancela no local. E é uma avenida principal.

Juiz: Sim. E como é a visibilidade ali? A que distância pra quem se desloca pela Av. Getúlio Vargas, a que distância ele consegue avistar a vinda de uma locomotiva?

Depoente: É muito ruim porque na verdade existe edificações, prédios em ambos os lados da rodovia, ali próximo, somente quando já está em cima do trilho pra poder ver. Não existe qualquer recuo ou afastamento.

Juiz: E esses policiais eram acostumados a passar por aquele trajeto ali?

Depoente: Sim, senhor.

Juiz: E não sabiam que passava locomotiva por ali? Esqueceram?

Depoente: Não o que ocorre é que não se conseguia ver a locomotiva,né. Nós vínhamos numa situação de emergência e infelizmente aconteceu a fatalidade, né. Se o senhor me permite eu tenho imagens colhidas da câmera da Policia Militar nesse ‘pendrive’, posso passar pro senhor, onde nós temos imagens do socorro, imagens de como ficou a viatura no momento.

Juiz: O senhor sabe dizer se os vidros dessa Advantage estavam abertos ou fechados na hora do acidente?

Depoente: Eu não poderia dizer pro senhor com precisão, mas normalmente o deslocamento é feito com as vidraças abertas.

Juiz: Sabe dizer se no momento a locomotiva estava emitindo algum sinal sonoro?

Depoente: Não emitiu nenhum sinal sonoro.

Juiz: Não. Tem idéia qual era a velocidade dessa Blazer na hora do acidente? Chegou-se a periciar isso?

Depoente: Eu acredito que tenha sido periciado, mas eu não saberia dizer isso com precisão. Mas eu posso dizer pro senhor que a minha viatura que vinha logo atrás tava numa velocidade em torno de 80 a 90 km/h, talvez.

Juiz: E qual é o máximo permitido ali naquela rodovia?

Depoente: Eu não saberia dizer pro senhor no momento.

Juiz: Essa Blazer é a gasolina ou a diesel? Essa que bateu?

Depoente: Também não saberia dizer pro senhor.

Juiz: Tem outros pontos de passagem de nível que também em situação (prejudicado) que não tinha sinalização nenhuma?

Depoente: Sim, senhor.

Juiz: Nenhuma delas é com cancela ou sinal luminoso?

Depoente: Que eu me recorde, com sinal luminoso, só próximo ao PA 24 horas. Eu não saberia dizer se funcionava à época.

Juiz: Hoje já foi instalado sinais lá?

Depoente: Eu não saberia dizer pro senhor.

Juiz: Não sabe. Que mais que o senhor recorda antes da hora do ocorrido?

Depoente: Bom como eu falei pro senhor, era uma situação de emergência. Havia reféns no presídio, né. A gente fez o deslocamento emergencial e a viatura foi realmente colhida pelo trem e logo em seguida só foi possível fazer o resgate deles e providenciar a retirada do equipamento e material da viatura.

Juiz: Dr. Felipe tem perguntas para a testemunha?

Advogado Dr. Felipe: Senhor tem conhecimento de outro acidente ali naquele local?

Depoente: Sim senhor, tenho. Existem outros acidente ocorrendo naquele local.

Advogado Dr. Felipe: Poderia detalhar mais, assim?

Depoente: Eu não saberia dizer data, nome de pessoas, né. Mas acompanhei pela mídia ocasião onde recordo, inclusive da imagem de uma capa de jornal, onde aparecia um Fusca que havia sido colhido no mesmo ponto, local, onde houve o acidente com a Guarnição da Policia Militar. Graças a Deus a pessoa não teve dano maior, foi só o dano material, né.

Advogado Dr. Felipe: Se aquele local ele tem bastante movimento? Se ele é de auto fluxo de veículos?

Depoente: Sim, trata-se de uma avenida principal da cidade, uma ligação entre bairros né, com bastante movimento e fluxo de veículos.

Advogado Dr. Felipe: E só pra finalizar se ele conhece, é, claro ele conhecia o soldado Jackson, mas como era o comportamento dele no quartel e também do motorista, do Wagner?

Depoente: Dois excelentes profissionais, cautelosos, muito bons profissionais. Pro senhor ter uma idéia, o Jackson, as últimas palavras dele foram comigo, eu fui providenciar o resgate, quando eu retirei ele da viatura, ele me pediu, ainda, que eu lembrasse de cortar os cabos da bateria pra que não pegasse fogo e pegasse os demais colegas dele.

Advogado do autor: E esse Wagner, ele já havia se envolvido em outro acidente com viatura?

Depoente: Eu não saberia dizer pro senhor.

Advogado do autor: Satisfeito Excelência.

Juiz: Podemos começar pelo Município de Joinville, Dra. Simone, pois não.

Município de Joinville: No processo, imagino que na carta precatória tenha vindo, existe umas fotos do local do acidente, eu poderia mostrar para ele para ver se ele reconhece?

Juiz: Pode, pode mostrar.

Município de Joinville: Esse seria o lugar do acidente?

Depoente: Sim. É o local do acidente.

Município de Joinville: lembra se essa sinalização, se essas placas…

Depoente: Somente a cruz de santo André. As demais não estavam no local no dia. Nem a, o semáforo não existia.

Município de Joinville: E a pintura no chão.

Depoente: Essa faixa não tinha na ocasião, não me recordo. Até posso olhar nas imagens que eu trouxe aqui, mas a princípio não continha essa pintura no chão.

Município de Joinville: Se o senhor se recorda se havia alguma linha de estímulo no chão, aquelas lombadinhas que dão barulhinho?

Juiz: Sonorizador?

Município de Joinville: Chama linha de estímulo à redução de velocidade?

Depoente: Isso existia na via sim.

Município de Joinville: Existia?

Depoente: Sim.

Município de Joinville: Então tá certo.

Juiz: A que distância da passagem mais ou menos?

Depoente: Não saberia dizer com precisão, mas um pouco antes de estar próximo à Fábrica Ambalit, ali. Deve dar uns 80 a 100m antes.

Juiz: Da passagem?

Depoente: É.

Município de Joinville: E vocês tinham conhecimento que havia passagem de linha ali, passagem de trem?

Depoente: Sim, isso é de conhecimento público da sociedade local.

Município de Joinville: Só isso Excelência, obrigada.

Depoente: Só que, se me permite, é insuficiente pro fluxo de veículos que tem no local né. Cruzando o centro de uma cidade não tem um semáforo funcionando, não tem uma cancela.

Juiz: Dra Cristina.

Advogada Dra. Cristina: Só quanto às fotos eu pediria pra colega informar quanto às fls. dos autos.

Município de Joinville: Eu não sei porque ta no eletrônico, né.

Advogada Dra. Cristina: Ah ta, a senhora não tem registrado aí.

Município de Joinville: São documentos juntados na contestação do Município.

Advogada Dra. Cristina: Só uma outra questão. O trem trafegava com as luzes acesas?

Depoente: Eu não saberia dizer pra senhora porque a imagem que mais me vem à mente e o momento que a viatura foi colhida pelo trem, eu me recordo que pegou bem no meio da coluna e a viatura quase se desmanchou feito papel, abriu o teto e arremessou a viatura para o outro lado da via. Então eu não consigo visualizar se estava com farol ligado ou não.

Advogada Dra. Cristina: Nada mais.

Juiz: Nada mais?

Advogada Dra. Cristina: Não.

Juiz: Pela União?

Advogado da União: Qual foi o horário da colisão comandante?

Depoente: Era oito e pouco, um pouco antes das nove horas da manhã. Oito e cinqüenta e pouco, oito e quarenta e pouco…

Advogado da União: E quais são os horários que passam trem lá nessa ferrovia por dia? A comunidade ta sabendo?

Depoente: Não, não saberia dizer.

Advogado da União: E o que é transportado nesses trens? Eles vão pra onde?

Depoente: Também não saberia dizer. Porque ali tem linha que vem de Mafra, tem linha que vem de Rio Negrinho, tem outras que vem do Porto de São Francisco. Então os horários são muito alternados eu não saberia dizer…

Advogado da União: Há uma estação de trem ali próxima?

Depoente: Não.

Advogado da União: Não há uma estação?

Depoente: Não.

Advogado da União: Quanto tempo o motorista da viatura passava por ali?

Depoente: Quanto tempo…..????

Advogado da União: Quanto tempo ele servia em Joinville? Ele conhecia bem a rotina da locomotiva já que isso é notório na cidade como um todo?

Depoente: Isso é impossível de dizer. Com tanta preocupação. Um policial numa operação de risco, o controle do horário do trem?! ….. não teria como dizer.

Advogado da União: Só isso Excelência.

Juiz: Pelo Ministério Público?

Ministério Público: Major Zelindo, pela sua condição de comandante daquela operação e também pela sua experiência na instituição da Polícia Militar o senhor diria que daquelas circunstâncias, do fato especificamente, a conduta do motorista da viatura, a conduta do Wagner Sardo, ela foi a conduta adequada dentro dos padrões de ensinamento da Polícia Militar ou ela foi uma conduta negligente, precipitada ou imprudente? Como o senhor avaliaria em termos técnicos a postura do motorista da Blazer.

Depoente: Eu avalio que a conduta dele foi correta. Ele em momento algum se excedeu. Infelizmente foi uma fatalidade. O que eu vou dizer pro senhor, a existência de uma ferrovia atravessando uma avenida movimentada dentro do centro de uma cidade como Joinville, ou uma cidade do Estado, sem que exista a presença de uma cancela ou de um semáforo luminoso, é por si só, no meu entendimento, geram responsabilidade por parte da empresa ou de quem deixou de fiscalizar. Existe uma legislação pertinente que exista cancela, todos os cuidados e esses cuidados não existiam. O Policial Militar naquele momento da ocorrência, obviamente, estava com adrenalina em alta, ele estava indo pra uma ocorrência onde havia reféns, o deslocamento prioritário para unidade prisional e obviamente tem que ter todos os cuidados necessários no trânsito, só que ocorreu a fatalidade em virtude de que não havia a visibilidade suficiente entre a avenida e o transposição do trilho naquele local, bem como, não se percebeu qualquer som sonoro alertando, ou seja, o trem disparando aaaa como se chama…

Juiz: A buzina.

Depoente: A buzina dele o que normalmente ocorre. Normalmente o trem a gente consegue ouvir ele de longe na cidade quando ele vem com a buzina disparando e naquela ocasião a gente não escutou a buzina disparando. E além disso não existia cancela, então fica difícil eu dizer que ele colaborou para o evento, né.

Ministério Público: Major Zelindo a sua viatura, a viatura em que o senhor trafegava ela estava com os vidros abertos ou fechados?

Depoente: Estavam com os vidros abertos.

Ministério Público: Mesmo assim o senhor não conseguiu ouvir?

Depoente: Não.

Ministério Público: Estava com o giroflex ligado?

Depoente: Sim.

Ministério Público: Ok. Sem mais.

Os depoimentos prestados confirmam a inexistência de cancela ou semáforo no local. Indicam, contudo, que havia sinalização no local, consistente nas placas ‘pare’ e ‘pare, olhe, escute’, na cruz de Santo André, e em linha de estímulo à redução de velocidade (sonorizador), o que pode ser verificado nos documentos out4 e out5 do evento 68, e ainda confirmam que é fato notório a existência de passagem de nível na localidade.

Do convincente depoimento de Marinês de Souza, que estava trabalhando nas proximidades e presenciou o acidente, é possível concluir que houve o acionamento da buzina da locomotiva; se o condutor da viatura acidentada e demais policiais não a ouviram, provavelmente isso se deve ao estresse da situação enfrentada então por eles, que se deslocavam rapidamente para o presídio que se encontrava rebelado. Pode-se, ainda, colher dos depoimentos o fato de que o motorista da viatura envolvida no acidente não parou o veículo antes da passagem de nível.

O Código de Trânsito Brasileiro dispõe em seu artigo 29, que:

‘Art. 29. o trânsito de veículos nas vias terrestres abertas à circulação obedecerá às seguintes normas:

VII – os veículos destinados a socorro de incêndio e salvamento, os de polícia, os de fiscalização e operação de trânsito e as ambulâncias, além de prioridade de trânsito, gozam de livre circulação, estacionamento e parada, quando em serviço de urgência e devidamente identificados por dispositivos regulamentares de alarme sonoro e iluminação vermelha intermitente, observadas as seguintes disposições:

d) a prioridade de passagem na via e no cruzamento deverá se dar com velocidade reduzida e com os devidos cuidados de segurança, obedecidas as demais normas deste Código;

XII – os veículos que se deslocam sobre trilhos terão preferência de passagem sobre os demais, respeitadas as normas de circulação.

É certo que o motivo que ensejou o deslocamento dos policiais para o presídio regional desta cidade foi grave, tratando-se de rebelião em que pessoas foram tomadas como reféns, o que justifica a urgência da chegada do reforço policial ao local do motim.

Entretanto, a prova testemunhal colhida é clara no sentido de que o veículo policial, que estava trafegando em alta velocidade para chegar mais prontamente ao estabelecimento prisional, não parou nem diminuiu a velocidade antes da passagem de nível, vindo a colidir com o trem.

A gravidade da situação não eximia o condutor da viatura de observar as regras de trânsito e as cautelas necessárias, conforme frisa a própria legislação que rege a matéria. Observo que a atividade exercida pelos policias pressupõe que eles estejam preparados para situações de emergência e perigo, de forma que os condutores das viaturas devem saber efetuar os deslocamentos com rapidez e segurança.

Além disso, é notório que determinadas vias desta cidade de Joinville, algumas delas com tráfego intenso de veículos, são atravessadas pela via férrea, o que deu ensejo a estudos para realização de contorno ferroviário que afaste a ferrovia das áreas urbanas, sendo de conhecimento público a inexistência de cancelas nas várias passagens de nível, o que é inclusive objeto de ação civil pública que tramita nesta Subseção.

Assim, resta comprovada a culpa do motorista do veículo policial, o qual sabia que o local do acidente era um cruzamento de via férrea, contudo, trafegando em alta velocidade para chegar mais prontamente ao estabelecimento prisional, não parou nem diminuiu a velocidade antes da passagem de nível, vindo a colidir com o trem. Frise-se que na via em que trafegava havia um sonorizador e placas ‘pare’ e ‘pare, olhe, escute’, na cruz de Santo André na passagem de nível, indicando atenção quanto à possibilidade de vir um trem. Ainda,  houve o acionamento da buzina da locomotiva, que não foi ouvida pelo condutor da viatura acidentada e demais policiais, provavelmente pelo som das sirenes ligadas e estresse pela situação enfrentada então por eles, que se deslocavam rapidamente para o presídio que se encontrava rebelado.

No entanto, entendo haver culpa concorrente das rés. Isto porque se depreende da prova produzida nos autos, que a sinalização no local do acidente era insuficiente. A inexistência de cancela e de sinal luminoso, mormente considerando o intenso tráfego de veículos naquele ponto, é, também, fator crucial na ocorrência do sinistro, pois, se houvesse uma cancela a impedir a passagem, o desfecho poderia ser outro. Há nos autos notícia veiculada na imprensa da ocorrência de outro acidente naquele local, no mesmo mês (em 31/10/2009), o que corrobora a tese da inadequação da sinalização.

A precariedade da sinalização dos cruzamentos naquele município gerou, inclusive, a Ação Civil Pública nº 2002.72.01.002244-5, cuja sentença condenou a ALL-AMÉRICA LATINA LOGÍSTICA MALHA SUL S.A., o MUNICÍPIO DE JOINVILLE/SC e a UNIÃO, esta de forma subsidiária, à promoção de adequada sinalização das passagens de nível da linha férrea existentes no território do Município de Joinville/SC, tendo sido reconhecido no dispositivo do mencionado decisum, com arrimo em exame pericial, a inadequação da sinalização nas passagens de nível ativas em Joinville/SC, que não observam os “elementos mínimos exigidos pela NE 4.702 da Rede Ferroviária Federal, sendo que nenhuma delas dispõe da completa sinalização, nos termos da legislação”.

Não por outro motivo, também fora determinada na sentença exarada a adoção de medidas mitigadoras apresentadas pelo expert, quais sejam: (a) instalação de indutores de redução de velocidade tipo tachão com olho de gato em todas as passagens de nível e faixas contínuas que as antecedem; (b) execução de pavimentação asfáltica junto às passagens de nível das vias não pavimentadas e substituição dos pavimentos em paralelepípedo por pavimentos asfáltico de modo a permitir a sinalização horizontal exigida pela norma NE 4 702; (c) execução de passeios para garantir a segurança de pedestres junto às passagens de nível, também conforme normativo da extinta Rede Ferroviária Federal; e (d) colocação de cancelas eletrônicas nas passagens de nível classificadas como ‘A’ nos autos da referida ação civil pública.

Nesse contexto, resta evidenciada a negligência das rés pela inércia em resolver o problema, pois deveriam ter primado pela sinalização e segurança do local, mormente por ser um trecho utilizado diariamente por toda a comunidade.

Assim, tenho que deve ser acolhido parcialmente os apelos da parte autora e do MPF, para reconhecer a culpa concorrente das partes.

Dos danos morais

Saliente-se que o dano moral decorrente do abalo gerado pela perda de pai e marido é considerado in re ipsa, isto é, não se faz necessária a prova do prejuízo, que é presumido e decorre do próprio fato.

Neste sentido:

ADMINISTRATIVO E RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. ACIDENTE DE TRÂNSITO. ATROPELAMENTO DE PEDESTRE NA CONTRAMÃO DE VIA. FALECIMENTO DE ESPOSA/MÃE DOS AUTORES. CULPA CONCORRENTE AFASTADA. DANO MORAL PRESUMIDO. INDENIZAÇÃO. CRITÉRIOS DE ARBITRAMENTO. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. 1.- O art. 37, §6º, da CRFB/88 declara a responsabilidade objetiva da administração. A responsabilidade existe tenha o serviço funcionado bem ou mal, regular ou não, desde que presentes os pressupostos básicos que (a) ato estatal; (b) dano específico e anormal causado por este ato e (c) nexo de causalidade entre o ato e o dano. Inexistindo exceção na norma constitucional, o ato danoso de responsabilidade pública pode ser tanto comissivo quanto omissivo, admitindo as excludentes de culpa da vítima, caso fortuito ou força maior. 2.- Ainda que a vítima estivesse caminhando na via pública, o veículo da União trafegava na contramão, o que revela inclusive sua imperícia na direção. 3.- A dor que advém da perda drástica dos familiares é pacificamente entendida pelos Tribunais como fonte inequívoca de dano moral, sendo inclusive desnecessária a produção de provas neste sentido, bastando para tanto a prova do fato. 4.- O arbitramento do dano moral é ato complexo para o julgador que deve sopesar, dentre outras variantes, a extensão do dano, a condição sócio-econômica dos envolvidos, a razoabilidade, a proporcionalidade, a repercussão entre terceiros, o caráter pedagógico/punitivo da indenização e a impossibilidade de se constituir em fonte de enriquecimento indevido. 5.- Majorado o valor da indenização pelo dano moral para R$ 100.000,00 (cem mil reais), para cada um dos quatro autores. 6.- Afastado o reconhecimento da culpa concorrente da vítima, o valor da pensão mensal deverá ser integral, no importe de um salário mínimo mensal. 7.- Em se tratando de responsabilidade civil extracontratual, o termo inicial dos juros de mora é a data do fato ilícito. Súmula 54/STJ. (TRF4, APELREEX 5007131-15.2012.404.7002, Terceira Turma, Relatora p/ Acórdão Maria Lúcia Luz Leiria, D.E. 03/10/2012)

  

Concluindo-se pelo cabimento de indenização a título de danos morais, resta apreciar o valor cabível.

Da quantificação do dano moral

Acerca do valor indenizatório, a jurisprudência do STJ já firmou o entendimento de que “a indenização por dano moral deve se revestir de caráter indenizatório e sancionatório de modo a compensar o constrangimento suportado pelo correntista, sem que caracterize enriquecimento ilícito e adstrito ao princípio da razoabilidade.” (Resp 666698/RN)

Nesta linha tem se manifestado este Tribunal:

ADMINSTRATIVO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. VALOR. PARÂMETROS.

1. A manutenção da restrição cadastral, quando já comprovada a inexistência do débito, dá ensejo à indenização por dano moral.

2. Para fixação do quantum devido a título de reparação de dano moral, faz-se uso de critérios estabelecidos pela doutrina e jurisprudência, considerando: a) o bem jurídico atingido; b) a situação patrimonial do lesado e a da ofensora, assim como a repercussão da lesão sofrida; c) o elemento intencional do autor do dano, e d) o aspecto pedagógico-punitivo que a reparação em ações dessa natureza exigem.   (TRF4, AC 5000038-54.2010.404.7104, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão Jorge Antonio Maurique, D.E. 20/06/2012)

Assim, o valor compensatório deve obedecer aos padrões acima referidos, devendo ser revisto quando se mostrar irrisório ou excessivo.

Adequando tal entendimento aos contornos do caso concreto, sem olvidar da gravidade (perda do ente querido), tenho que o valor a título de danos morais deve se adequar às quantias que vem sendo fixadas em casos semelhantes pela Turma.

Nesse contexto, tenho que, considerando a culpa concorrente de terceiro, deve ser arbitrado, a título de danos morais, o valor de R$ 50.000,00 para cada autor, pois está de acordo com o que vem sendo fixado pela Turma em casos similares. Este montante deve ser atualizado a contar do acórdão (Súmula 362 do STJ), com juros de mora a partir do evento danoso (Súmula 54 do STJ e art. 398 do novo Código Civil).

A partir da vigência da Lei nº 11.960/09 (30-06-2009) sobre o quantum indenizatório incidem juros de mora nos índices oficiais de remuneração básica e juros da caderneta de poupança para fins de remuneração do capital e compensação da mora (ERESP 1.207.197/RS).

Logo, devem ser condenados os réus ALL e Município de Joinville a pagarem, em rateio, o valor acima fixado.

Da pensão

A função da indenização é tornar indene, ou seja, serve para reparar qualquer dano sofrido, visando-se a alcançar o ‘status quo ante’.

Registre-se que não mais existe dúvidas quanto à possibilidade da cumulação de indenizações por danos materiais e morais, por ser matéria já repetida e pacificada pelas Cortes Superiores encontrando-se sumulada pelo STJ/37:

“SÃO CUMULAVEIS AS INDENIZAÇÕES POR DANO MATERIAL E DANO MORAL ORIUNDOS DO MESMO FATO.”

Por outro lado, não é incompatível o recebimento de benefício previdenciário, no caso pensão por morte, com a fixação de pensão de natureza civil.

Considerando que a remuneração da vítima por certo destinava-se também às despesas próprias, como indica a jurisprudência, cabível a fixação do valor a ser pago ao autor em 2/3 da renda:

ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. PROVAS DO NEXO CAUSAL. […] Igualmente, o valor da pensão, no valor correspondente a 2/3 do valor bruto da remuneração mensal da vítima. (TRF4, APELREEX 2006.72.14.000872-7, Relatora Desembargadora Federal Marga Inge Barth Tessler, D.E. 18/01/2010).

Contudo, considerando a culpa concorrente da vítima, a pensão deve ser reduzida pela metade, ou seja, 1/3 da renda apurada (como policial militar do Estado de Santa Catarina).

O pagamento deve ser feito a partir do evento danoso, a cada trinta dias, rateado entre os autores. Para os autores filhos do falecido é devida a pensão até que completem 25 anos de idade, consoante iterativa jurisprudência; para a autora Marisol, esposa do falecido, até a data em que o finado completaria 70 anos de idade, considerando a idade média do homem no Brasil, pois ela dependia economicamente deste, não desempenhava atividade econômica remunerada e era com ele casada à época do fato. À medida que os autores já não fizerem mais jus ao recebimento da referida pensão, sejam suas frações acrescidas à parcela devida aos restantes.

Quanto às parcelas vencidas, deverão ser acrescidas de correção monetária e juros, aplicados os índices relativos às cadernetas de poupança.

O valor da pensão mensal deverá ser revisto e reajustado nas mesmas datas e segundo os mesmos índices aplicados ao salário-mínimo.

Destaco que não há ilegalidade na fixação da pensão atrelada ao valor do salário mínimo, pois o caso dos autos se insere em exceção específica (pensão em decorrência de ato ilícito) sobre a qual já se manifestou o Excelso Supremo Tribunal Federal. Leia-se:

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO DECORRENTE DE ACIDENTE DE VEÍCULO. REPARAÇÃO DE GANHOS QUE A VÍTIMA PODERIA AUFERIR. FIXAÇÃO DA PENSÃO COM BASE NO SALARIO MINIMO. ART. 7., INC. IV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.É inaplicável a proibição da vinculação ao salário mínimo, prevista na parte final do art. 7, inc. IV, da Constituição Federal, como base de cálculo e atualização de pensão em ação de indenização por ato ilicito.Recurso extraordinário não conhecido.(RE 140940, Relator(a): Min. ILMAR GALVÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 07/03/1995, DJ 15-09-1995 PP-29513 EMENT VOL-01800-04 PP-00683)

Pelo contrário, recomenda-se a conversão em salários mínimos, servindo como índice para sua correção, em consonância com o enunciado n° 490 da súmula do Supremo Tribunal Federal:

‘A pensão correspondente a indenização oriunda de responsabilidade civil deve ser calculada com base no salário-mínimo vigente ao tempo da sentença e ajustar-se-á as variações ulteriores.’

Logo, deve ser reformada a sentença para condenar os réus ALL e Município de Joinville a pagarem, em rateio, pensão em favor dos autores, nos moldes da fundamentação.

Dos honorários advocatícios

Ainda que tenha havido culpa concorrente, entendo que a parte autora foi vencida em menor grau, já que, embora não tenha sido atendida nos valores expressamente sugeridos, obteve a indenização por danos morais e materiais. Devem, portanto, os réus ALL e Município de Joinville responderem, em rateio, por 70% da verba honorária, que fixo em 10% do montante condenatório, valor que está dentro dos parâmetros usualmente utilizados por esta Turma em casos semelhantes.

Os 30% restantes são de responsabilidade da parte autora, suspensa a exigibilidade em face da AJG.

Conclusão

Merecem parcial provimento os apelos da parte autora e do MPF, para reconhecer a culpa concorrente das partes, e fixar indenização por danos morais e materiais (estes estipulados em 1/3 da renda da vítima), a serem arcados, em rateio, pelos réus ALL e pelo Município de Joinville, sendo subsidiária a responsabilidade da União. Readequação da distribuição sucumbencial.

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento às apelações da parte autora e do MPF.

Desembargador Federal Luís Alberto D’Azevedo Aurvalle

Relator



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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 02/12/2014

APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000077-51.2010.404.7201/SC

ORIGEM: SC 50000775120104047201

RELATOR:Des. Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
PRESIDENTE: CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR
PROCURADOR:Dr. Flávio Augusto de Andrade Strapason
SUSTENTAÇÃO ORAL:Dr. Guilherme Scharf Neto p/Marisol Aparecida Fernandes dos Santos E OUTROS – Video-conferência de Florianópolis/SC.
APELANTE:ELIEL FERNANDES DOS SANTOS
:JACKSON FERNANDES DOS SANTOS
:MARISOL APARECIDA FERNANDES DOS SANTOS
:SILAS FERNANDES DOS SANTOS
:VALÉRIA FERNANDES DOS SANTOS
:VANESSA FERNANDES DOS SANTOS
ADVOGADO:Filipe Ximenes de Melo Malinverni
:Claudio Avila da Silva Junior
:GUILHERME STINGHEN GOTTARDI
APELADO:ALL – AMÉRICA LATINA LOGÍSTICA S.A.
:MUNICÍPIO DE JOINVILLE
:UNIÃO – ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
INTERESSADO:MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 02/12/2014, na seqüência 510, disponibilizada no DE de 19/11/2014, da qual foi intimado(a) UNIÃO – ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.

Certifico que o(a) 4ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES DA PARTE AUTORA E DO MPF.

RELATOR ACÓRDÃO:Des. Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
VOTANTE(S):Des. Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
:Des. Federal CANDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR
:Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

Luiz Felipe Oliveira dos Santos

Diretor de Secretaria



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