A aposentadoria por idade híbrida, também chamada de aposentadoria mista, é um benefício previdenciário destinado a trabalhadores que exerceram atividades tanto no meio urbano quanto no meio rural ao longo de sua vida laboral.
Essa modalidade permite a soma de períodos de contribuição ou exercício de atividade rural e urbana para fins de aposentadoria por idade, sendo uma importante ferramenta de proteção social a trabalhadores que transitaram entre os dois regimes de forma alternada ou sucessiva.
Essa espécie de benefício está fundamentada nos artigos 11, inciso VII, caput, artigo 39, inciso I, artigo 48, § 1º e artigo 142, todos da Lei nº 8.213/1991. Os requisitos para a concessão de aposentadoria por idade híbrida estão dispostos no artigo 48, § 3º da Lei nº 8.213/91, sendo eles: contar com 60 anos de idade, se mulher e o preenchimento da carência previsto no art. 142 da Lei 8.213/91, considerando o exercício de atividade rural e urbana.
Após a promulgação da Emenda Constitucional nº 103/2019 (Reforma da Previdência), ocorreram alterações relevantes quanto aos requisitos e à forma de cálculo desse benefício, o que exige uma análise técnica e atualizada sobre o tema.
Histórico e criação da aposentadoria híbrida
A aposentadoria híbrida foi introduzida no ordenamento jurídico brasileiro por meio da Lei nº 11.718, de 20 de junho de 2008, que alterou o art. 48 da Lei nº 8.213/91. Antes dessa alteração, o INSS não permitia a soma de tempo de trabalho rural e urbano para fins de concessão de aposentadoria por idade, sob a justificativa de que se tratavam de regimes distintos com regras próprias.
No entanto, essa limitação causava prejuízos a uma parcela significativa da população, especialmente em zonas de transição rural-urbana.
Com a inclusão do §3º ao art. 48 da Lei 8.213/91, passou-se a admitir expressamente a possibilidade de soma dos períodos, permitindo ao segurado que tivesse exercido atividades no campo e na cidade alcançar os requisitos para a aposentadoria por idade, desde que atingida a idade mínima e comprovado o tempo mínimo exigido.
A redação original do dispositivo previa que o trabalhador urbano ou rural faria jus à aposentadoria por idade ao completar 65 anos de idade, se homem, e 60 anos, se mulher, com o mínimo de 180 meses de carência. Já o §3º autorizava a soma de períodos urbanos e rurais para fins de carência, desde que não concomitantes.
Requisitos da Aposentadoria por Idade Híbrida após a EC 103/2019
Com a promulgação da EC nº 103/2019, os requisitos da aposentadoria por idade foram alterados. A regra geral passou a exigir:
- Idade mínima: 65 anos para homens e 62 anos para mulheres;
- Tempo de contribuição mínimo (carência): 180 meses (15 anos), podendo ser somados os períodos de atividade urbana e rural, desde que não concomitantes.
É importante destacar que, apesar da Reforma da Previdência ter alterado as regras da aposentadoria por idade urbana, a possibilidade de soma dos tempos rural e urbano para fins de carência e contribuição foi mantida, preservando o direito à aposentadoria híbrida para novos requerimentos após 13 de novembro de 2019.
Existem algumas decisões monocráticas da jurisprudência que tem entendido de forma contrária, o que, felizmente, é um entendimento minoritário.
Natureza do Benefício e o Entendimento do INSS
Inicialmente, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) interpretava que a aposentadoria híbrida deveria ser tratada como um benefício de natureza rural, ainda que resultante da soma de tempos de trabalho urbano e rural. Com base nesse entendimento, o INSS exigia que o segurado comprovasse a condição de trabalhador rural na data em que completasse a idade mínima para a concessão do benefício.
Essa interpretação, no entanto, gerou controvérsias e exclusões indevidas, especialmente em casos em que o segurado havia retornado ao trabalho urbano após longo período no meio rural. A exigência da manutenção da qualidade de segurado rural na data do requerimento ou na data em que completou a idade mínima inviabilizava a aposentadoria para muitos trabalhadores.
Jurisprudência e o Tema 1007 do STJ
Outra controvérsia que obteve bastante discussão nos tribunais gravitava no sentido de saber quais os períodos que poderiam ser utilizados como tempo de carência para esta modalidade de aposentadoria. Diante da controvérsia, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) foi provocado a se manifestar e pacificou a questão no julgamento do Tema 1007, fixando a seguinte tese:
“O tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo.”
Esse entendimento foi cristalizado no julgamento do Recurso Especial n. 1.407.613/PR, com relatoria do Ministro Herman Benjamin, e teve grande impacto no reconhecimento de direitos previdenciários.
Essa orientação passou a ser observada tanto pelas instâncias inferiores quanto pelo próprio INSS, que, após resistências iniciais, acabou adaptando suas instruções normativas à jurisprudência consolidada.
Alterações Introduzidas pela Reforma da Previdência (EC 103/2019)
A EC 103/2019 promoveu uma série de mudanças nas regras gerais de aposentadoria, extinguindo a aposentadoria por tempo de contribuição sem idade mínima e estabelecendo novas fórmulas para cálculo do valor do benefício. No caso da aposentadoria híbrida, embora a possibilidade de soma de períodos urbanos e rurais tenha sido mantida, ocorreram alterações relevantes nos seguintes aspectos:
- Idade mínima para mulheres: passou de 60 para 62 anos;
- Regra de transição: para quem já era filiado ao RGPS antes da Reforma, a regra de transição prevê aumento progressivo da idade mínima para mulheres, começando em 60 anos em 2019 e aumentando seis meses por ano até atingir 62 anos em 2023;
- Cálculo do valor do benefício: passou a ser calculado com base na média de 100% das contribuições a partir de julho de 1994 (não se excluem os 20% menores salários, como ocorria anteriormente), com aplicação do coeficiente de 60% + 2% a cada ano que exceder 20 anos de contribuição para homens e 15 anos para mulheres.
Portanto, mesmo quando o segurado atinge o tempo mínimo de 15 anos com a soma de períodos urbanos e rurais, o valor do benefício poderá ser reduzido se o tempo total de contribuição não for muito superior ao mínimo exigido.
Considerações Finais
A aposentadoria por idade híbrida representa um importante avanço na proteção dos trabalhadores que exerceram atividades em diferentes ambientes e regimes de trabalho, sendo uma resposta legislativa ao perfil multifacetado da mão de obra brasileira, especialmente nas regiões interioranas.
As mudanças promovidas pela Reforma da Previdência exigem atenção redobrada dos operadores do direito e dos próprios segurados quanto à idade mínima e às regras de cálculo, que impactam diretamente o valor final da aposentadoria.
Assim, para o segurado que já tinha direito adquirido antes da EC 103/2019, aplica-se a regra anterior (60/65 anos e cálculo mais vantajoso). Para os que implementaram os requisitos após a Reforma, valem os novos parâmetros. Ainda assim, a soma de tempo urbano e rural continua sendo uma via possível e eficaz para alcançar a aposentadoria por idade, reafirmando a função social do sistema previdenciário brasileiro.
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