Olá, Previdenciaristas! Como estão?

Recentemente, os colegas Lucas, Yoshiaki e Fernanda escreveram sobre algumas alterações regulamentares promovidas pelo Decreto nº 10.410/2020:

Na coluna de hoje, venho alertar os Previdenciaristas para mais uma mudança promovida pelo novo decreto.

Em sua redação original, o Decreto nº 3.048/99 previa expressamente a manutenção da qualidade de segurado por, no mínimo, doze meses após a cessação de benefício por incapacidade:

Art. 13. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:

[…]

II – até doze meses após a cessação de benefício por incapacidade ou após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela previdência social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;

Contudo, o Decreto nº 10.410/2020 alterou este dispositivo, extinguindo a previsão de manutenção da qualidade de segurado após a cessação do benefício por incapacidade. Vejam a atual redação:

Art. 13. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:

[…]

II – até doze meses após a cessação das contribuições, observado o disposto nos § 7º e § 8º e no art. 19-E      (Redação dada pelo Decreto nº 10.410, de 2020).

Esta nova previsão introduz uma incerteza preocupante.

Antes do Decreto nº 10.410/2020, o titular de benefício por incapacidade permanecia tranquilamente segurado da Previdência por 12, 24 ou 36 meses após a cessação dos benefícios por incapacidade, tendo em vista as prorrogações dos parágrafos 1.º e 2º do mesmo artigo 13 do Decreto 3.048/99 e art. 15 da lei 8.213/91.

No contexto atual, esta previsão foi suprimida pelo Decreto nº 10.410/2020.

Em minha opinião, simplesmente suprimir essa possibilidade seria uma regra extremamente prejudicial, acarretando na perda da qualidade de segurado daquele que não contribui imediatamente após a cessação do benefício por incapacidade caso já tivesse transcorrido mais do que 12 meses da última contribuição como segurado obrigatório ou 6 meses se facultativo.

Caso a omissão do dispositivo efetivamente levasse à perda da qualidade de segurado após a cessação do benefício, teríamos consequências lastimáveis, o que espero e lutarei para que não aconteça, mas vejam:

Reaquisição da carência

Se o segurado não contribuísse logo após a cessação do benefício por incapacidade, perderia sua condição de segurado.

Com a perda da condição de segurado, haveria grande prejuízo quanto à carência.

A Lei nº 8.213/91 dispõe que:

Art. 27-A  Na hipótese de perda da qualidade de segurado, para fins da concessão dos benefícios de auxílio-doença, de aposentadoria por invalidez, de salário-maternidade e de auxílio-reclusão, o segurado deverá contar, a partir da data da nova filiação à Previdência Social, com metade dos  períodos  previstos nos incisos I, III e IV do caput do art. 25 desta Lei.   (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)

Assim, com a perda da condição de segurado, deveria o contribuinte observar a regra de reaquisição de carência, a qual exige metade dos períodos previstos (art. 25, I, III e IV) para acesso aos benefícios de:

  • Auxílio-doença (12 contribuições);
  • Aposentadoria por invalidez (12 contribuições);
  • Salário-maternidade (10 contribuições);
  • Auxílio-reclusão (24 contribuições).

Pensão por morte

Não havendo contribuições logo após a cessação do benefício por incapacidade, ocorreria a perda da condição de segurado.

Na hipótese de óbito do segurado, seus eventuais dependentes ficariam desamparados, eis que a vinculação do falecido à Previdência Social no momento do óbito é requisito de acesso à pensão por morte.

Como visto, as implicações práticas deste possível cenário beiram o absurdo.

A situação é ainda pior se considerarmos o perfil da imensa maioria dos segurados da Previdência Social: pessoas humildes, trabalhadores de baixa renda e de pouca instrução.

Se a matéria é complexa até mesmo para os mais gabaritados em direito previdenciário, não há como exigir que os segurados tenham plena compreensão das regras às quais estão submetidos.

Mencionei “possível cenário” porque não sabemos como a regra será interpretada.

De qualquer sorte, a decisão final será dos tribunais, nos quais deposito forte confiança.

Acredito que a interpretação mais razoável, e espero que seja a dos futuros julgadores, é pela manutenção da regra geral da qualidade de segurado após a cessação do benefício por incapacidade, mesmo com a supressão normativa.

Para justificar minha esperança, cito a Instrução Normativa nº 77/2015, a qual, mesmo que anterior ao Decreto nº 10.410/2020, trouxe importantes previsões quanto à manutenção da qualidade de segurado após a cessação de benefício por incapacidade:

Art. 137. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuição:

[…]

II – até doze meses após a cessação de benefícios por incapacidade,salário maternidade ou após a cessação das contribuições,para o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração, observado que o salário maternidade deve ser considerado como período de contribuição;

[…]

§ 7º O segurado facultativo, após a cessação de benefícios por incapacidade e salário-maternidade, manterá a qualidade de segurado pelo prazo de doze meses.

Assim, penso que o artigo 15, II da Lei nº 8.213/91 continuará sendo aplicado como regra geral da manutenção da qualidade de segurado após a cessação de benefício por incapacidade, mesmo que o dispositivo do decreto não seja expresso.

Por último, vale destacar a Portaria nº 231/2020, a qual veio a regulamentar a manutenção da qualidade de segurado daquele que recebe auxílio-acidente e não vinha contribuindo para o sistema, tendo em vista a superveniência da Lei nº 13.846/2019, que excluiu o benefício de auxílio-acidente do rol de benefícios que garante a manutenção da qualidade de segurado, sem limite de prazo, para quem está em gozo de benefício.

Porém, é inegável que a situação exige certa prudência.

Caso você, Previdenciarista, esteja se perguntando “o que fazer?”, cordialmente peço licença para lhe dar uma dica:

O que fazer?

Não houve alteração normativa quanto ao segurado que recebe benefício.

Enquanto titular de benefício por incapacidade (exceto auxílio-acidente), será mantida a condição de segurado:

Art. 13. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:

I – sem limite de prazo, o segurado que estiver em gozo de benefício, exceto na hipótese de auxílio-acidente;       (Redação dada pelo Decreto nº 10.410, de 2020).

A perda da condição de segurado somente ocorreria após a cessação, e se não existisse contribuições imediatamente.

Então, meu conselho aos Previdenciaristas é que orientem seus clientes a contribuírem logo após a cessação do benefício.

Por exemplo: se o auxilio-doença é cessado no mês de Julho/2020, deverá ser realizado pelo menos um recolhimento para a competência de Agosto/2020.

Observo que, para os segurados contribuinte individual e facultativo, a  competência de Agosto/2020 deve ser paga até o dia 15 de Setembro/2020, conforme artigo 30, II da Lei nº 8.212/91:

Art. 30. A arrecadação e o recolhimento das contribuições ou de outras importâncias devidas à Seguridade Social obedecem às seguintes normas:            (Redação dada pela Lei n° 8.620, de 5.1.93)

[…]

II – os segurados contribuinte individual e facultativo estão obrigados a recolher sua contribuição por iniciativa própria, até o dia quinze do mês seguinte ao da competência;                  (Redação dada pela Lei nº 9.876, de 1999).

Com a realização de ao menos uma contribuição para a competência imediatamente após a cessação do benefício por incapacidade, não haveria nenhuma possibilidade de imediata perda da qualidade de segurado, prevenindo-se, assim, eventual prejuízo com interpretação mais restritiva em razão da mudança em razão do decreto 10.410.

Forte abraço!

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