Já estamos habituados com a postura omissa do INSS ao analisar e instruir os processos administrativos previdenciários.

Problema maior é quando a Justiça se apresenta como uma simples extensão desse parco procedimento administrativo, onde não se busca a verdade real, mas sim o “atalho” para a improcedência.

O tema desse post é justamente sobre isso: os obstáculos à produção de provas em processos judiciais previdenciários.

O direito à prova não é apenas uma questão de ônus

Antes de mais nada, é indispensável mencionar que o autor desse texto não desconhece a disposição processual acerca da distribuição do ônus da prova. Isto é, em momento algum defenderei que não é incumbência do próprio autor comprovar os fatos constitutivos do seu direito.

O ponto é que o ônus probatório não é óbice às garantias constitucionais do contraditório e do direito de defesa, e tampouco pode ser interpretado de forma a afastar a busca pela verdade real e pela efetividade da Justiça.

É isso que expressa a jurisprudência:

Nesse sentido, vale conferir a explanação do Des. Celso Kipper, ao citar trecho de autoria de José Roberto dos Santos Bedaque, em decisão proferida no âmbito do TRF da 4ª Região, veja:

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CONVERSÃO DO JULGAMENTO EM DILIGÊNCIA PARA A REALIZAÇÃO DE PROVA ORAL. POSSIBILIDADE. PODERES INSTRUTÓRIOS DO JUIZ. ART. 130 DO CPC. […].

2. “O direito à prova é componente inafastável do princípio do contraditório e do direito de defesa. O problema não pode ser tratado apenas pelo ângulo do ônus (CPC, art. 333). Necessário examiná-lo do ponto de vista da garantia constitucional ao instrumento adequado à solução das controvérsias, dotado de efetividade suficiente para assegurar ao titular de um interesse juridicamente protegido em sede material a tutela jurisdicional.” (Bedaque, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 5. Ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2011, pp. 26-27).

3. A complementação do conjunto probatório, corolário do poder do juiz de averiguar os fatos, sobre o qual as partes não podem dispor, visa, por meio da busca pela verdade real, à formação de um juízo de livre convicção motivado, atendendo, assim, ao interesse público de efetividade da Justiça, cujo escopo é o alcance da verdadeira paz social, que se eleva sobre os interesses individuais das partes. Precedentes do E. Superior Tribunal de Justiça. (TRF4, AC 5009583-38.2011.4.04.7000, SEXTA TURMA, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 11/06/2015)

Entretanto, é comum, tanto por parte do INSS quanto da Justiça, a argumentação de que “compete unicamente à parte autora comprovar o seu direito”, em contextos nos quais é imprescindível a produção de provas (testemunhal e/ou pericial) para a adequada solução do processo.

Direto fundamental à prova

Trazendo a questão ainda mais para a prática, cito o caso da comprovação da atividade especial em empresa fechada e com cargo genérico em CTPS. Nesta situação, é absolutamente necessário que se ouçam testemunhas para delimitar as atividades desempenhadas.

Aqui, restringir o direito fundamental à prova é automaticamente negar o direito fundamental à aposentação. Esse é o nível de atenção que o tema merece, pois podem ser dois direitos fundamentais cerceados por simples omissão jurisdicional.

Nesse contexto, tomo a permissão de citar o I. José Antonio Savaris quando menciona que o direito constitucional à produção de prova lícita é “um direito fundamental que somente pode ser restringido por lei e na medida em que essa restrição seja proporcional” (2019, p. 326).

Ademais, da negativa da produção de prova (nesse caso pericial) ocorre o que Diego Henrique Schuster criativamente chama de sentença “Kinder Ovo” (2019, p. 161).

O fenômeno ocorre quando o juiz indefere a produção de prova sob o fundamento de que a documentação juntada supre a instrução probatória. Mas aí, na hora da sentença, vem a surpresinha: o direito não é reconhecido em face da insuficiência de provas.

A lógica é: indefiro a produção de provas porque há provas suficientes, depois julgo que não está comprovado (?)

No início do texto mencionei a expressão “atalho para improcedência”. É exatamente o que sentenças desse tipo fazem. Isso é grave!

Por fim, indico modelo de apelação disponível no Prev, no qual há fundamentação e pedido de anulação da sentença que indeferiu a produção de provas: Apelação. Aposentadoria especial. Pedidos de prova testemunhal e pericial indeferidos.

Ficou com alguma dúvida ou tem algo a acrescentar? Deixe seu comentário.

Referências bibliográficas:

SAVARIS, José Antonio. Direito processual previdenciário. 8. ed. Curitiba: Alteridade, 2019.

SCHUSTER, Diego Henrique. Direito previdenciário para compreender com a prática colada na teoria e sem respostas prontas. Curitiba: Alteridade, 2019.

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