Tema de intensa discussão, a possibilidade de revisão da forma de remuneração e atualização das contas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) é um assunto que, constantemente, tem apresentado novidades. Antes de passar à jurisprudência, porém, é necessário ter em mente que o FGTS é matéria disciplinada no art. 13 da Lei 8.036/90 e no art. 17 da Lei 8.177/91, que assim preconizam:

Lei Federal nº 8.036/1990:

Art. 13. Os depósitos efetuados nas contas vinculadas serão corrigidos monetariamente com base nos parâmetros fixados para atualização dos saldos dos depósitos de poupança e capitalização juros de (três) por cento ao ano.

(…)

Lei Federal nº 8.177/1991

Art. 17. A partir de fevereiro de 1991, os saldos das contas do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) passam a ser remunerados pela taxa aplicável à remuneração básica dos depósitos de poupança com data de aniversário no dia 1°, observada a periodicidade mensal para remuneração.

Parágrafo único. (…)

Em suma, os saldos das contas de FGTS são sujeito a dois índices:

a) O primeiro é o índice de 3% ao ano, referente a capitalização de juros, prevista no final do caput art. 13 da Lei 8.036/90; e

b) O segundo índice, que deveria ser o responsável pela atualização monetária, é aquele equivalente aos “parâmetros fixados para atualização dos saldos dos depósitos de poupança” (caput art. 13 da Lei 8.036/90), o qual, desde a edição do art. 17, caput, da Lei Federal nº 8.177/1991, é a Taxa Referencial (TR).

Nesse sentido, intensa discussão se desenvolveu sobre a aplicação da Taxa Referencial como índice de correção monetária ao Fundo, uma vez que não seria capaz de, atualmente, refletir idoneamente o fenômeno inflacionário. Um dos motivos se dá pela alteração que a própria TR foi sofrendo ao longo do tempo. Primeiramente, ela foi criada para remunerar as cadernetas de poupança com a expectativa de inflação futura no período de aplicação, no lugar da inflação passada. Desindexava-se, assim, a caderneta de poupança (principal ativo financeiro na época) dos índices de inflação passada.

Anteriormente à Lei nº 8.981/95, porém, o imposto de renda incidente sobre as aplicações financeiras tinha como base de cálculo apenas o “rendimento real”, isto é, acima da inflação, e diversos foram os índices de correção monetária utilizados pelo Fisco (OTN, BTN, BTN-fiscal e, por fim, UFIR) para identificar o “rendimento real”. Todavia, com a edição da referida lei, passou-se a incidir o imposto de renda sobre a remuneração total das aplicações.

Nesse sentido, a fim de evitar uma transferência em massa de capitais investidos em títulos públicos e privados para a caderneta de poupança, alterou-se a metodologia de cálculo da TR (Resolução CMN 2.604, de 23/04/1999), desvinculando-se inclusive da inflação futura, que era seu foco inicial.

No ponto, por ocasião do julgamento do Tema 810 (validade da correção monetária e dos juros moratórios incidentes sobre as condenações impostas à Fazenda Pública, conforme previstos no art. 1º-F da Lei 9.494/1997, com a redação dada pela Lei 11.960/2009), o Supremo Tribunal Federal reconheceu a inconstitucionalidade do uso da TR como índice de atualização monetária das condenações impostas à Fazenda pública.

Com manifestação do Ministro Luiz Fux no sentido de que “a remuneração da caderneta de poupança – diferentemente de qualquer outro índice oficial de inflação – é sempre prefixada”, razão pela qual é evidente “a desvinculação entre a evolução dos preços da economia e a remuneração da caderneta de poupança, o que a impede de caracterizar-se, quer sob o ângulo formal (lógico-conceitual) quer sob o ângulo material (técnico-metodológico), como termômetro da inflação”, a tese do Tema 810 restou assim ementada:

1. O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09;

2. O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina.

Em sentido contrário, porém, o Superior Tribunal de Justiça proferiu decisão mais recente acerca da possibilidade de utilização ou não da TR como índice de correção monetária. Por ocasião do julgamento do REsp nº 1614874, afetado como repetitivo, o Tribunal assim fixou a tese do caso:

A remuneração das contas vinculadas ao FGTS tem disciplina própria, ditada por lei, que estabelece a TR como forma de atualização monetária, sendo vedado, portanto, ao Poder Judiciário substituir o mencionado índice.

Nesse sentido, o relator, Ministro Benedito Gonçalves relembrou, ainda, a existência da Súmula 459, também do STJ, que já trazia entendimento semelhante da Corte: “a Taxa Referencial (TR) é o índice aplicável, a título de correção monetária, aos débitos com o FGTS recolhidos pelo empregador, mas não repassados ao fundo”. Da mesma forma, destacou o julgamento do RE 226.885/RS, em que o STF assentou que o FGTS possui natureza estatutária, e não contratual, como as cadernetas de poupança, por exemplo. Em razão disso, o caráter institucional do Fundo não geraria o direito, “aos fundistas, de eleger o índice de correção monetária que entendem ser mais vantajoso”.

Com efeito, denota-se que esse julgamento não apreciou questões como a inconstitucionalidade progressiva e a revogação parcial do art. 13, da Lei 8.036/90, no que concerne ao índice de atualização monetária previsto, bem como deixou de fazer a devida diferenciação entre remuneração e atualização do saldo da conta de FGTS.

Destaca-se, porém, a questão não resta definitivamente decidida. O Pretório Excelso ainda voltará a se manifestar sobre o tema, por ocasião do julgamento da ADI nº 5.090. Na ação, ajuizada pelo Partido Solidariedade, a parte Autora deixou bem claro que “a pretensão ora trazida de declaração de inconstitucionalidade não tem por escopo fazer substituir o Poder Executivo e o Poder Legislativo na definição do índice de correção que entende mais apropriado ao FGTS (INPC, IPCA ou qualquer outro). Tenciona-se aqui é deixar assente que o crédito do trabalhador na conta FGTS, como qualquer outro crédito, deve ser atualizado por índice  constitucionalmente idôneo, apurado posteriormente à desvalorização verificada“. (grifos do autor).

Nesse sentido, o objetivo da ADI é fazer com que seja declarada inconstitucional, com caráter vinculantes, erga omnes e efeitos ex tunc, a expressão “com base nos parâmetros fixados para atualização dos saldos dos depósitos de poupança”, do caput do art. 13 da Lei nº 8.036/90 e o caput do art. 17, da Lei 8.177/91 – dispositivos estes que impõe a correção dos depósitos nas contas vinculadas do FGTS pela Taxa Referencial, conforme mencionado anteriormente.

Destarte, apesar do recente “golpe” sofrido pela decisão do Superior Tribunal de Justiça, a batalha para a revisão do FGTS ainda não está perdida. Em que pese os Tribunais possam começar a proferir decisões improcedentes, com base no Tema 810/STJ, ainda é possível alegar a pendência de julgamento da ADI 5.090 que, então, julgará definitivamente a pauta (ou, ao menos, por um tempo).

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