A Proposta de Emenda à Constituição n. 23/2021, chamada de PEC dos Precatórios, ou ainda de “PEC do calote”, tem tido grande repercussão na mídia nacional. O texto tem os seguintes objetivos principais:
- Limitar as despesas anuais com Precatórios;
- Alterar a forma de correção dos Precatórios;
- Possibilitar o parcelamento de Precatórios.
O nosso interesse no assunto reside no fato de que é por meio de expedição de Precatórios que o INSS paga suas dívidas judiciais – os chamados “atrasados”.
Então, será que estamos diante de um possível “calote” nos segurados da Previdência Social? É sobre isso que falo a seguir.
O que são precatórios no Direito Previdenciário?
Quando um segurado da Previdência Social ganha uma ação judicial contra o INSS, os valores devidos são pagos mediante a expedição de uma Requisição de Pequeno Valor (RPV) ou de um Precatório.
O pagamento será por meio de RPV quando o valor não ultrapassar 60 salários mínimos (R$ 66.000,00). Em regra, o prazo de pagamento é rápido: 2 meses a partir da autuação no Tribunal.
Ao que tudo indica, o pagamento de RPV’s não sofrerá nenhuma alteração com a PEC dos Precatórios.
Por outro lado, quando o valor da condenação ultrapassa os 60 salários mínimos, o pagamento será efetivado apenas por meio de Precatório. Aqui o prazo é diferente: 31 de dezembro do ano para o qual o Precatório foi orçado.
A proposta orçamentária do ano seguinte abrange Precatórios inscritos até 1º de julho de cada ano. Portanto, atualmente, todos os precatórios inscritos até 1º de julho de um ano são pagos até 31 de dezembro do ano subsequente.
Exatamente essa lógica de pagamento que o governo está querendo quebrar com a PEC dos Precatórios. Para isso, o texto da PEC prevê a limitação das despesas anuais com Precatórios e a possibilidade de parcelamento destes créditos.
Só segurados de maior poder aquisitivo recebem Precatórios?
Definitivamente, não! Infelizmente, é de conhecimento comum que tanto o INSS quanto a Justiça não possuem a estrutura necessária para a efetivação rápida de direitos previdenciários.
Isto é, a demora começa no INSS e continua no Judiciário, fazendo com que segurados aguardem por anos a concessão de um benefício previdenciário.
Diante deste cenário, é corriqueiro que até mesmo os beneficiários de benefício assistencial (BPC) recebam seus atrasados por meio de Precatório.
Assim, a verdade é que pessoas em situação de vulnerabilidade social também recebem Precatórios!
Há possibilidade de um “calote” do INSS?
Se interpretarmos a palavra “calote” como um atraso no pagamento dos Precatórios do INSS, sim, essa possibilidade existe!
Vejamos..
A PEC estipula o limite de aproximadamente R$ 45 bilhões de pagamento para o ano que vem, enquanto o montante total é de cerca de R$ 90 bilhões. Ou seja, a união quitará à vista somente metade dos Precatórios de 2022.
A ordem de prioridade de pagamento conforme a PEC aprovada no Congresso é a seguinte:
- Prioridade por doença, deficiência e idade
- Precatórios dos FUNDEF (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério)
- Precatórios alimentares
- Precatórios comuns
A entrada dos Precatórios do FUNDEF na ordem prioritária torna extremamente improvável a quitação de todos os precatórios alimentares no ano de 2022. Lembrando que Precatórios alimentares são justamente os previdenciários.
Dessa forma, segurados não idosos e não deficientes que deveriam receber Precatórios em 2022 podem vir a receber apenas em 2023, caso a PEC tenha vigência aprovada.
Isso pode gerar a tão falada “bola de neve”. Como existirá um limite anual para pagamento de Precatórios, o valor excedente ao limite pode passar a crescer/acumular ano após ano.
Lembrando ainda que o parcelamento previsto na PEC não é para os Precatórios previdenciários, pois abrange somente aqueles de valor superior a R$ 66.0000,00 (sessenta e seis milhões de reais).
A PEC ainda depende de aprovação do Senado Federal
Registro que os cenários levantados acima são hipotéticos, e podem acontecer somente se a PEC dos Precatórios entrar em vigor após aprovação no Senado Federal.
Nesse sentido, comentaristas políticos tem reiteradamente mencionado que a aprovação da PEC no Senado não será fácil.
Por fim, como Previdenciarista, é meu dever esclarecer a extrema importância de políticas sociais como o novo Auxílio Brasil, que buscam gerar o mínimo de dignidade a brasileiros em situação de vulnerabilidade social.
Mas, definitivamente, não há como olhar com bons olhos um “calote” de dívidas judiciais a segurados da Previdência Social, a fundos de educação e a outros muitos brasileiros.
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Sou advogada, atuo na área previdenciária, em geral cobro, a título de honorários, 30%, sobre o valor do pagamento dos atrasados . Os advogados, nesses casos, ficarão em uma fila de espera, que sabe Deus quando irá receber…….
Diante disso, a OAB poderia nos ajudar, pleiteando uma alteração na referida PEC, para que os honorários advocaticios, no valor de até 60 salários minimos, fossem pagos separadamente, através RPV. Assim não ficaríamos tão prejudicados……
Neusa Maria Novaes de Almeida
Carlos Leite falou tudo! A essa altura já era para ter movimento no Brasil todo, inclusive dos Institutos de Previdência. Cadê uma campanha contra isso? Ninguém vê. Lamentável.
Excelente matéria! Explanda de forma simples e objetiva. Parabéns!
A equipe do Prev agradece o comentário!
Só espero que a OAB intervenha… é de extrema indignação pensar que um segurado do INSS que passa até décadas litigando por conta da morosidade do Judiciário e das tentativas de procrastinação do INSS, tenha êxito em uma ação e, ao final, não tenha certeza do momento em que será possível receber os frutos. Penso que os precatórios alimentares deveriam ser requisito de prioridade tanto quanto idade e deficiência.
Indignada….
Lembrando que os advogados que recebem pelo êxito da ação, também ficam prejudicados.
Prezado Dr. Lucas, parabéns pela coluna,
A sua explicação técnica sobre o assunto está perfeita, acrescento apenas o fator político eleitoral desta medida.
A primeira mentira do Governo era que ele foi surpreendido com o valor da despesa orçamentária de 2022. Pois bem, é de conhecimento geral que a Procuradoria da União recebe e encaminha todos os valores dos processo judiciais finalizados para o Ministério da Fazenda e que, em sua quase totalidade, envolvem créditos alimentares de trabalhadores que foram vitoriosos em suas demandas previdenciárias ou de outra natureza, muitos deles com mais de 5, 8 ou até 10 anos de processo judicial.
Por isso, o Governo usa a “PEC do Calote” como uma medida paliativa de distribuição de renda, que considero também fundamental para as pessoas mais necessitadas do país, contudo, apenas para dar uma roupagem mais aceitável para um projeto de manutenção do “PODER”, ou seja, obter a reeleição de 2022.
Veja que o atual Presidente condenou essa atitude de distribuição de renda nos governos do “PT”, considerando que estas políticas eram nítidas iniciativas para ganhar votos.
O que estarrece a todos é que a Câmara e o Senado já estão fechados com o Governo Federal neste calote, pois, parte do orçamento (25 bilhões) será destinado para um orçamento “secreto” para atender as bases políticas daqueles que apoiam a reeleição. O conchavo com o CENTRÃO, algo que o atual Presidente também condenava em sua campanha eleitoral, veja-se o discurso do General Heleno, tem um projeto de manutenção de Poder.
Além disso, agora se descobre que o Governo Federal irá utilizar ainda, parte do precatório, para reajustar os salários dos servidores federais, uma vergonha. Se era para cobrir despesas sociais, tirando de trabalhadores e aposentados que venceram suas ações, parte do dinheiro vai para orçamentos “secretos” e aumentos salariais de quem não precisa.
Não se pode perder de vista, ainda, que isso beneficia os bancos e fundos de investimento que estão adquirindo os precatórios com deságio dos pobres credores dos precatórios que, PRECISANDO DA GRANA, acabam por vender seu créditos. E o Governo, na outra ponta, recebe esses títulos como parte de pagamento dos tributos fiscais devidos pelas empresas. É uma grande jogada do Governo e dos bancos, únicos beneficiários e, de outro lado, quem perde é o trabalhador aposentado.
Portanto, tirar o dinheiro dos trabalhadores aposentados foi como tirar o doce da boca de criança e, infelizmente, OAB, STF, CÂMARA E SENADO não farão nada e deixarão esse Governo inepto, que tem um projeto nebuloso de Poder e que está destruindo o nosso país (dentro e fora), reeleger-se com condutas que sempre condenaram, com o uso indevido de dinheiro de pessoas trabalhadoras e honestas que venceram suas demandas judiciais e, agora, são vítimas de um “CALOTE” INÉDITO NA NOVA REPÚBLICA.
Parabéns Dr. Lucas!
Extremamente esclarecedor e me permita acrescentar que para nós, advogados a aprovação da PEC será danosa, uma vez que perderemos o mínimo de previsão ao obtermos uma decisão finalística em ações previdenciárias.
Estamos diante de um dilema, mas que creio que o governo encontrará alternativa para pagar o auxilio, caso não seja aprovada a PEC.
O que está acontecendo, os previdenciaristas todos conformados? Nenhuma insurgência nem mesmo da OAB em defesa da classe.?????
A OAB teria interesse, se a casta de Advogados que ela protege fosse atingida, não é o caso…