O Conselho Nacional de Justiça autorizou a realização de teleperícia nos processos de benefícios por incapacidade e assistenciais.
A medida encontra amparo na Resolução nº 317/2020 do CNJ e tem validade enquanto perdurar a pandemia do Coronavírus.
A perícia em formato eletrônico tem como objetivo evitar o contato físico entre perito e periciando. Visa também salvaguardar os direitos dos segurados, que, muitas vezes, são pessoas vulneráveis e hipossuficientes.
Os benefícios previdenciários possuem intrínseco caráter alimentar, demandando um quadro de urgência que exigência resposta do Judiciário.
Entretanto, o Conselho Federal de Medicina vedou a prática de teleperícia sem a realização de exame direto.
Nesse contexto, existe, atualmente, um ‘cabo de força’ entre os dois órgãos, o que compromete a efetividade deste procedimento.
Vejamos abaixo os principais pontos defendidos por cada órgão e possíveis soluções para o referido impasse:
Conselho Nacional de Justiça
A Resolução nº 317 foi editada em 30 de abril de 2020 pelo CNJ. Esta norma possibilita ao requerente de benefício previdenciário ou assistencial a realização de perícia médica judicial durante a pandemia.
A perícia virtual permite a continuidade do isolamento social, no intuito de conter a transmissibilidade do Covid-19.
Um dos motivos que levou o CNJ aprovar a teleperícia foi a edição da Lei 13.989/2020. A referida lei permitiu o uso da telemedicina enquanto durar a pandemia.
A teleperícia deverá ser requerida ou consentida pelo periciando, cabendo a este último as seguintes responsabilidades (art 1º, § 1º):
- Informar o endereço eletrônico e/ou nº de celular a serem utilizados na realização da perícia;
- Juntar aos autos os documentos necessários, inclusive médicos, a exemplo de laudos, relatórios e exames médicos, fundamentais para subsidiar o laudo pericial médico ou social.
Em contrapartida, o Perito poderá manifestar que a documentação médica e a entrevista por meio eletrônico foram insuficientes para conclusão. Nesse caso, o processo deverá aguardar até que seja viável a realização da perícia presencial.
Ao mesmo tempo em que busca prevenir o contágio, a teleperícia médica objetiva a continuidade dos processos judiciais. O prosseguimento destes é essencial para garantir o direitos dos cidadãos em situação vulnerabilidade.
Não se expeciona, é claro, situações complexas ou dúbias, em que o Perito poderá sugerir a realização de posterior exame presencial.
Conselho Federal de Medicina
Em que pese a regulamentação da teleperícia pelo CNJ, o CFM proibiu a prática de perícias virtuais sem exame direto. Veja-se a ementa do Parecer nº 3/2020:
O médico Perito Judicial que utiliza recurso tecnológico sem realizar o exame direto no periciando afronta o Código de Ética Médica e demais normativas emanadas do Conselho Federal de Medicina.
Esta vedação está prevista no Código de Ética Médica, que proíbe o médico assinar laudos que não tenha realizado pessoalmente o exame (art. 92).
Portanto, mesmo diante do estado de emergência de saúde pública decorrente da pandemia do Covid-19, o CFM entendeu que esta prática é proibida.
Em relação à lei que dispõe sobre a telemedicina, o órgão representativo defende que não engloba a perícia médica. Para o CFM, a aplicação da telemedicina ocorre para fins de assistência, pesquisa, prevenção de doenças/lesões e promoção de saúde.
Tendo em vista a possibilidade de infração ética e respectiva punição, muitos peritos têm apresentado resistência em realização teleperícia.
A fim de apaziguar as divergências entre o CFM e o CNJ, o Ministério Público Federal expediu a Recomendação nº 4/2020/PFDC/MPF. Neste documento, o MPF recomenda ao CFM que, em processos administrativos e judiciais relativos a benefícios assistenciais e previdenciários:
- não adote quaisquer medidas contrárias à realização de perícias eletrônicas e virtuais por médicos durante o período de pandemia da COVID-19 (coronavírus);
- se abstenha de instaurar procedimentos disciplinares contra médicos por elaboração de Parecer Técnico Simplificado em Prova Técnica Simplificada (arts. 464 e 472 do CPC; art. 35 da Lei 9.099; art. 12 da Lei 10.259) e perícia fracionada (onde é realizado um exame de documental – parecer simplificado –, posteriormente complementado com exame físico).
O MPF orienta o cumprimento da recomendação acima pelo CFM, sob pena das ações judiciais cabíveis.
Requisição e outros meios de provas
Após a recomendação expedida pelo MPF, o CPF não pode, em tese, adotar medidas contrárias à realização das perícias virtuais e tampouco punir o médico que executar este procedimento.
Dessa maneira, é importante que o colega advogado avalie a possibilidade de realização deste procedimento na sua região de atuação.
Para tanto, disponibilizo modelo para requerimento de teleperícia.
Ao mesmo tempo, devem ser levadas em conta outras possibilidades de comprovar o alegado (incapacidade laboral/deficiência/limitação).
Nesse sentido, pode-se citar a realização de prova técnica simplificada, com previsão na Nota Técnica nº 4 do Centro de Inteligência da Seção Judiciária do Paraná.
A prova técnica simplificada nada mais é que uma perícia indireta, realizada por meio da análise de documentação médica (atestados, exames, prontuários, receituários).
Trata-se de procedimento semelhante à perícia remota atualmente realizada pelo INSS e encontra amparo no art. 464, §§ 2º e 3º do CPC. A decisão cabe ao juiz, o qual poderá, posteriormente, determinar a complementação por exame físico.
Por meio da apresentação de prova documental, pode-se requerer a implantação imediata no benefício previdenciário. Nesse caso, a tutela provisória de urgência é instrumento hábil para que o periciando receba o benefício, até que seja submetido à perícia médica presencial (veja o modelo aqui).
O fundamental em relação a teleperícia é que exista diálogo entre os órgãos, com possibilidade de adequações dos procedimentos, no intuito de resguardar o bem maior que é proteção social dos cidadãos.
Deixe um comentário