Ementa para citação:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA / APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADO. NÃO DEMONSTRADA. DOENÇA PREEXISTENTE. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. Quatro são os requisitos para a concessão do benefício em tela: (a) qualidade de segurado do requerente; (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de qualquer atividade que garanta a subsistência; e (d) caráter definitivo/temporário da incapacidade.
2. Tendo a parte autora iniciado suas contribuições ao sistema previdenciário quando já era portadora da deficiência incapacitante para o trabalho, não faz jus aos benefícios por incapacidade (arts. 42, § 2º e 59, parágrafo único da Lei 8.213/91).
3. Honorários advocatícios majorados, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do CPC.
(TRF4, AC 5010537-64.2018.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 08/08/2018)
INTEIRO TEOR
Apelação Cível Nº 5010537-64.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: EVA MARTINS
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
RELATÓRIO
A autora interpôs recurso de apelação contra sentença, publicada em 09 de novembro de 2017, que, em ação ordinária, julgou improcedente o pedido de concessão de aposentadoria por invalidez ou, alternativamente, auxílio-doença ou auxílio-acidente, uma vez que, embora constatada a incapacidade para o trabalho, não restou demonstrada a qualidade de segurado para a obtenção do benefício, condenando-a ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, arbitrados estes em 10% sobre o valor da causa, cuja exigibilidade permanece suspensa em razão de ser beneficiária da justiça gratuita (Ev. 3, SENT17).
Em suas razões de apelação, postulou a parte autora a reforma da sentença recorrida para que, reconhecida a sua qualidade de segurada, seja lhe concedido o benefício de auxílio-doença e, alternativamente, aposentadoria por invalidez, alegando estar acometida de doença grave, bem como não haver prova de que a incapacidade é anterior a sua filiação ao Regime Geral de Previdência Social – RGPS.
Sem contrarrazões e sem remessa necessária, vieram os autos a este Tribunal.
VOTO
Do benefício por incapacidade
Conforme o disposto no art. 59 da Lei n.º 8.213/91, o auxílio-doença é devido ao segurado que, havendo cumprido o período de carência, salvo as exceções legalmente previstas, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos. A aposentadoria por invalidez, por sua vez, será concedida ao segurado que, uma vez cumprido, quando for o caso, a carência exigida, for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, sendo-lhe pago enquanto permanecer nesta condição, nos termos do 42 da Lei de Benefícios da Previdência Social.
A lei de regência estabelece, ainda, que para a concessão dos benefícios em questão se exige o cumprimento da carência correspondente à 12 (doze) contribuições mensais (art. 25), salvo nos casos legalmente previstos.
Na eventualidade de ocorrer a cessação do recolhimento das contribuições exigidas, prevê o art. 15 da Lei nº 8.213/91 um período de graça, prorrogando-se, por assim dizer, a qualidade de segurado durante determinado período. Decorrido o período de graça, o que acarreta na perda da qualidade de segurado, as contribuições anteriores poderão ser computadas para efeito de carência. Exige-se, contudo, um mínimo de 1/3 do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido, conforme se extrai da leitura do art. 24 da Lei nº 8.213/91. Dessa forma, cessado o vínculo, eventuais contribuições anteriores à perda da condição de segurado somente poderão ser computadas se cumpridos mais quatro meses.
É importante destacar que o pressuposto para a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, é a existência de incapacidade (temporária ou total) para o trabalho. Isso quer dizer que não basta estar o segurado acometido de doença grave ou lesão, mas sim, demonstrar que sua incapacidade para o labor decorre delas.
De outra parte, tratando-se de doença ou lesão anterior à filiação ao Regime Geral de Previdência Social, não será conferido o direito à aposentadoria por invalidez/auxílio-doença, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou lesão (§ 2º do art. 42).
Em resumo, a concessão de benefícios por incapacidade pressupõe a demonstração dos seguintes requisitos: a) a qualidade de segurado; b) cumprimento do prazo de carência de 12 (doze) contribuições mensais (quando exigível); c) incapacidade para o trabalho de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporária (auxílio-doença).
No mais, deve ser ressaltado que, conforme jurisprudência dominante, nas ações em que se objetiva a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez o julgador firma seu convencimento, de regra, através da prova pericial. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE. AUSÊNCIA DE PERÍCIA MÉDICA. BAIXA DOS AUTOS À ORIGEM. REABERTURA DE INSTRUÇÃO. REALIZAÇÃO DE LAUDO. 1. Nas ações em que se objetiva a aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, o julgador firma seu convencimento, via de regra, com base na prova pericial. 2. Inexistindo prova pericial em caso no qual se faz necessária para a solução do litígio, reabre-se a instrução processual para que se realiza laudo judicial. 3. Sentença anulada para determinar a reabertura da instrução processual e a realização de perícia médica (TRF4ª, AC n.º 0009064-12.2010.404.9999/RS; Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira; DJ de 27/08/2010).
Quanto a isso, José Antônio Savaris, em sua obra “Direito Processual Previdenciário”, 03ª ed., Juruá, 2011, p. 239, leciona que “a prova decisiva nos processos em que se discute a existência ou persistência da incapacidade para o trabalho é, em regra, a prova pericial realizada em juízo compreendida, então, à luz da realidade de vida do segurado”.
Por fim, é importante ressaltar que, tratando-se de controvérsia cuja solução dependa de prova técnica, o juiz só poderá recusar a conclusão do laudo na eventualidade de motivo relevante constante dos autos, uma vez que o perito judicial encontra-se em posição equidistante das partes, mostrando-se, portanto imparcial e com mais credibilidade. Nesse sentido, os julgados desta Corte: APELAÇÃO CÍVEL Nº 5013417-82.2012.404.7107, 5ª TURMA, Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 05/04/2013 e APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5007389-38.2011.404.7009, 6ª TURMA, Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 04/02/2013.
CASO CONCRETO
Inicialmente, registro que não há dúvidas acerca da incapacidade total e permanente da autora para o exercício de qualquer tipo de labor que garanta a sua subsistência. Tal situação é consequência de transtorno esquizoafetivo não especificado – CID 10. F25-9.
Contudo, a controvérsia posta nos autos cinge-se a definir se, na data de início da incapacidade, a autora possuía qualidade de segurado.
Conforme as informações extraídas do Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS (Ev. 3, CONTES/IMPUG6), o histórico contributivo da autora demonstra que ela verteu contribuições no período compreendido entre julho de 1973 e fevereiro de 1985, de forma intercalada, e de setembro de 2014 a janeiro de 2015, na qualidade de contribuinte individual.
Outrossim, quanto à incapacidade da autora, o perito judicial, ao responder aos quesitos formulados, destacou o seguinte (Ev. 3, LAUDPERI12):
3) Esta condição clínica atual é geradora de incapacidade laborativa? Sim.
4) Caso exista incapacidade laborativa, qual data de início desta? Há documento(s) médico(s) que comprove(m) essa data? Familiar refere quadro há 08 anos, porém, sem comprovação por laudo médico ou exame daquela época. – grifei.
Nesse contexto, segundo o laudo médico realizado pelo INSS, a data de início da incapacidade da autora remonta a 24 de março de 2010, acrescentando, ainda, o médico perito as seguintes informações (Ev. 3, CONTES/IMPUG6, p. 23):
História: do lar, 59 anos refere que tem problema de esquecimento e problemas psiquiátricos há cerca de 5 anos. Refere que já teve internação psiquiátrica no Hospital de Caridade de Santiago. Em uso de mantidam, risperidona e biperideno. Traz atestado do Dr. Fernando CREMERS 26.280 de 17/03/2015 com CID F25 referindo incapacidade. Refere a sobrinha que não consegue trabalhar há cerca de 5 anos pelo problema. – grifei.
Assim, conforme se observa do conjunto probatório produzido nos autos, não restam dúvidas de que a incapacidade da autora remonta a momento anterior a sua refiliação ao Regime Geral de Previdência Social, não havendo notícia de que a mesma tenha decorrido de progressão ou agravamento da doença.
É certo que o exame realizado pela administração pública, no estrito cumprimento da ordem jurídica, possui presunção relativa de legitimidade, o que, em decorrência, transfere o ônus da prova da invalidade do ato para aquele que a alegar. Tal prova, contrariando o ato, deve ser robusta, plena, não sendo possível invalidar o ato administrativo com indícios de prova.
Além disso, cumpre ressaltar que o perito judicial é o profissional de confiança do juízo, cujo compromisso é examinar a parte com imparcialidade. Embora o juiz não fique adstrito às conclusões do perito, a prova em sentido contrário ao laudo judicial, para prevalecer, deve ser suficientemente robusta e convincente, o que não ocorreu no presente feito.
Na hipótese em análise, os documentos juntados pela autora não são aptos a demonstrar que o início da incapacidade é superveniente à sua refiliação ao RGPS, tampouco que esta tenha decorrido de progressão ou agravamento da doença.
Conforme se observa da documentação presente nos autos, a autora se limitou a juntar, tão somente, um único exame médico (Ev. 3, ANEXOS PET4, p. 2), o que se revela insuficiente para elidir a conclusão contida nos laudos médicos periciais realizados.
É de salientar, ainda, o fato de que a primeira contribuição da autora, na qualidade de contribuinte individual, tenha se dado apenas em setembro de 2014, sendo que a formalização do pedido do benefício, realizado em 25 de fevereiro de 2015, ocorreu imediatamente após o pagamento da quinta contribuição (01/2015). De fato, a parte autora reingressou no RGPS em setembro de 2014, na condição de contribuinte individual, após permanecer por quase 30 anos sem recolher contribuições (desde 1985, conforme CNIS no Ev. 3, CONTES/IMPUG6).
No que diz respeito ao benefício de auxílio-acidente, esse é devido ao filiado quando, após a consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas permanentes que impliquem a redução da capacidade de exercer a sua ocupação habitual (art. 86 da Lei nº 8.213/91). Assim, não se tratando o caso em análise de hipótese de acidente de qualquer natureza, conforme a prova produzida nos autos, inviável a concessão do benefício.
Dessa forma, não se tratando de hipótese em que, após o ingresso no RGPS, tenha ocorrido o agravamento da doença e, em decorrência disso, a incapacidade laborativa (art. 42, § 2º, e 59, parágrafo único, da LBPS), fica confirmado que a incapacidade é preexistente ao reingresso da parte autora no RGPS, não havendo direito a auxílio-doença/aposentadoria por invalidez.
Honorários advocatícios
Desprovido o apelo, majoro, por força do § 11, do artigo 85, do CPC, os honorários advocatícios para 15% sobre o valor da causa, a serem atualizados na forma prevista no Manual de Cálculos da Justiça Federal, suspensa a exigibilidade, contudo, em face da gratuidade da justiça.
Dispositivo
Em face do que foi dito, voto no sentido de negar provimento à apelação da parte autora.
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Apelação Cível Nº 5010537-64.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: EVA MARTINS
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA / APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADO. NÃO DEMONSTRADA. DOENÇA PREEXISTENTE. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. honorários advocatícios.
1. Quatro são os requisitos para a concessão do benefício em tela: (a) qualidade de segurado do requerente; (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de qualquer atividade que garanta a subsistência; e (d) caráter definitivo/temporário da incapacidade.
2. Tendo a parte autora iniciado suas contribuições ao sistema previdenciário quando já era portadora da deficiência incapacitante para o trabalho, não faz jus aos benefícios por incapacidade (arts. 42, § 2º e 59, parágrafo único da Lei 8.213/91).
3. Honorários advocatícios majorados, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do CPC.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 07 de agosto de 2018.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000580798v6 e do código CRC 110e588d.
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