Ementa para citação:

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. COISA JULGADA. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ.

1. Ao propor uma segunda ação para a obtenção de benefício previdenciário após o trânsito em julgado da decisão do primeiro processo e depois de o INSS constatar irregularidades no benefício, sem fazer qualquer menção a tal fato,  a conduta da parte autora, por seu advogado, atenta contra o dever processual de proceder com lealdade e boa fé em todos os atos do processo e ofende o princípio da boa fé objetiva.

2. Impõe-se a condenação da parte autora ao pagamento de multa por litigância de má fé, fixada em 1% sobre o valor da causa.

3. Conquanto a parte litigue sob o amparo da AJG, a condenação ao pagamento das verbas extraordinárias, como a despesa acima referida, não está compreendida no benefício que assegura o acesso à Justiça. Precedentes.

(TRF4, AC 0023383-77.2013.404.9999, SEXTA TURMA, Relatora SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, D.E. 02/09/2016)


INTEIRO TEOR

D.E.

Publicado em 05/09/2016

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0023383-77.2013.4.04.9999/PR

RELATORA:Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
APELANTE:JOSE LOURENCO
ADVOGADO:Thais Takahashi
APELADO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
ADVOGADO:Procuradoria Regional da PFE-INSS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. COISA JULGADA. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ.

1. Ao propor uma segunda ação para a obtenção de benefício previdenciário após o trânsito em julgado da decisão do primeiro processo e depois de o INSS constatar irregularidades no benefício, sem fazer qualquer menção a tal fato,  a conduta da parte autora, por seu advogado, atenta contra o dever processual de proceder com lealdade e boa fé em todos os atos do processo e ofende o princípio da boa fé objetiva.

2. Impõe-se a condenação da parte autora ao pagamento de multa por litigância de má fé, fixada em 1% sobre o valor da causa.

3. Conquanto a parte litigue sob o amparo da AJG, a condenação ao pagamento das verbas extraordinárias, como a despesa acima referida, não está compreendida no benefício que assegura o acesso à Justiça. Precedentes.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao apelo e, de ofício, reduzir a multa por litigância de má-fé, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre (RS), 24 de agosto de 2016.

Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE

Relatora


Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8501045v15 e, se solicitado, do código CRC BDAC6553.
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0023383-77.2013.4.04.9999/PR

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RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por José Lourenço contra sentença que julgou extinto o processo sem resolução do mérito, em razão da coisa julgada, nos termos do art. 267, V, do CPC/1973, condenando a procuradora da parte ao pagamento de multa de 10% do valor da causa, por litigância de má-fé, de acordo com o art. 14, parágrafo único, também do antigo CPC.

Os patronos do autor alegam, em síntese, que desconheciam a ação anterior (autos nº 2002.04.01.048171-8), julgada pelo TRF4 e já transitada em julgado. Afirma que os pedidos e causa de pedir não são idênticos e, ainda, que o INSS não cumpriu o acórdão daquela ação. Pede a anulação da sentença e o retorno dos autos à origem para prosseguimento.

Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.

É o relatório.

Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE

Relatora


Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8501043v3 e, se solicitado, do código CRC 4AA6C649.
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VOTO

Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973.

Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.

A sentença deve ser mantida, pois entendo que se encontra configurada, no caso concreto, a litigância de má-fé.

Cuida-se de pedido de averbação de tempo rural e conversão de tempo especial, para restabelecimento de aposentadoria por tempo de contribuição.

A parte autora já intentara ação com mesmo pedido e causa de pedir na Justiça Estadual do Paraná, na qual foi interposta apelação (autos nº 2002.04.01.048171-8/PR) a que se deu parcial provimento para condenar o INSS a averbar apenas o período de 01-12-1965 a 31-12-1978, trabalhado pelo autor como empregado rural.

Em 2010, ante a apuração de irregularidades (fls. 54 e seguintes), o INSS cessou o benefício que havia concedido, excluindo o período de 1976 a 1978, o que, no entender da autarquia, tornou insuficiente o tempo para a concessão da aposentadoria.

O autor, no presente feito, nada mencionou acerca da ação anterior, já transitada em julgado. Alegou que a causa de pedir não é idêntica, requerendo conversão de tempo especial, mas silenciou sobre o fato de, no outro processo, o objeto ter sido justamente o tempo rural que ora se discute.

Ora, se o INSS excluiu indevidamente parte do tempo rural, em desconformidade com o acórdão deste Tribunal proferido no processo anterior, como alega o apelante, não lhe cabia intentar outra ação, discutindo novamente o período, e requerendo a conversão de tempo especial para supostamente alterar a causa de pedir. Quaisquer medidas relativas ao cumprimento daquele julgado deveriam ter sido feitas naqueles autos. O que importa para verificação da coisa julgada, além das partes, é que o objeto de ambos os processos é o mesmo, sobre o qual já houve decisão judicial transitada em julgado.

Ademais, ainda que houvesse novas provas, a ação ordinária não é a via adequada para alterar provimento judicial com trânsito em julgado, cujas hipóteses estão previstas no art. 485 do CPC/1973 e no art. 966 do novo Código Processual.

Inobstante o procurador da presente demanda não seja o mesmo que atuou no feito anterior, a parte autora, por seu advogado, omitiu nesta ação que tramitou outro processo em que pretendia a concessão do mesmo benefício. A omissão teve por objetivo beneficiar indevidamente a parte autora, demonstrando-se a utilização indevida do aparato Judiciário, omitindo qualquer informação sobre a demanda anterior.

 A conduta da parte autora, por seu advogado, viola o art. 14, inciso II, do CPC/1973, segundo o qual “São deveres das partes e de todos aqueles que de qualquer forma participam do processo: … proceder com lealdade e boa-fé”] e ofende o princípio da boa-fé objetiva, segundo o qual “a ninguém é lícito fazer valer seu direito em contradição com a sua conduta anterior ou posterior interpretada objetivamente, segundo a lei, os bons costumes e a boa-fé” (STJ, 3ª Turma, REsp. 1.192.678, rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino). Tal princípio, afirma a Min. Maria Thereza de Assis Moura, “ecoa por todo o ordenamento jurídico, não se esgotando no campo do Direito Privado, no qual, originariamente, deita raízes” (STJ, HC 137.549/RS, 6ª Turma, julgado em 07-02-2013). A mesma Ministra, em outro julgado (HC 177.234/MG, 6ª T., j. 21-02-2013), confirma que “a relação processual é pautada pelo princípio da boa-fé objetiva”.

 Os tribunais pátrios, notadamente o egrégio Superior Tribunal de Justiça, têm aplicado sistematicamente o princípio da boa-fé objetiva não só às relações contratuais, mas também às relações processuais, tanto no processo penal (de que são exemplos as duas últimas decisões acima citadas), quanto no processo cível, como se pode constatar da leitura dos seguintes acórdãos: REsp 1344678/RJ, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 23-10-2012, DJe 06-11-2012; AgRg no Ag 1337996/SP, Rel. Ministro Paulo De Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 28-02-2012, DJe 07-03-2012; REsp 1005727/RJ, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 24-04-2012, DJe 15-05-2012; AgRg no REsp 1280482/SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 07-02-2012, DJe 13-04-2012; REsp 1068271/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 24-04-2012, DJe 15-06-2012.

 Como bem afirma o Min. Paulo de Tarso Sanseverino (REsp. 901.548/RS) são consectários do princípio da boa-fé objetiva os deveres de lealdade e de informação. No presente caso, a parte autora tinha o dever de informar, por ocasião da segunda ação, que já ajuizara outra ação com as mesmas partes, pedido e causa de pedir, no juízo federal.

 Discorrendo sobre o dever de lealdade processual, ensina Márcio Louzada Carpena:

“A lealdade compreende postura ética, honesta, franca, de boa-fé, proba, que se exige em um estado de direito; ser leal é ser digno, proceder de forma correta, lisa, sem se valer de artimanhas, embustes ou artifícios.

Em sede de direito processual, a lealdade, na concepção teleológica, significa a fidelidade à boa-fé e ao respeito à justiça, que, entre outras formas, se traduz não só pela veracidade do que se diz no processo, mas também pela forma geral como nele se atua, incluindo-se, aí, o que não se omite

(Da (Des)lealdade no Processo Civil, in Revista Jurídica 331, Maio/2005, pp. 27-48).

Obviamente, a afronta ao dever de informação, além de propiciar locupletamento indevido de uma parte em detrimento de outra, consistiu em vulneração da conduta leal dentro do processo, que fragilizou a segurança jurídica necessária para a entrega da prestação jurisdicional (REsp. 1.068.271/SP, 3ª Turma, Min. Nancy Andrighi, julgado em 24-04-2012).

 A conduta da parte autora, por seu advogado, em propor uma segunda ação para a obtenção de benefício previdenciário, já existindo decisão transitada em julgado, após a constatação de irregularidades pelo INSS, sem fazer qualquer menção a tais fatos, atenta contra o dever processual de proceder com lealdade e boa-fé em todos os atos do processo (CPC/1973, art. 14; CPC/2015, art. 77) e ofende o princípio da boa-fé objetiva.

Tal conduta, por afrontar o Direito, não pode ser chancelada por este Tribunal.

 A propósito do papel do magistrado em coibir condutas incompatíveis com o padrão ético adequado no curso da relação processual, transcrevo ensinamento de Humberto Theodoro Júnior:

“O quadro atual do direito processual, em todo o mundo ocidental, como retrata Morelo, vive “la nueva edad de las garantias jurisdiccionales”, no qual se reforçam a autonomia e a independência do juiz, e se lhe confia um papel mais ativo, tanto para comandar a marcha do processo e a instrução probatória como para zelar pela dignidade da justiça e pelo comportamento ético de todos quantos intervenham na atividade processual”

(Boa-fé e Processo – Princípios Éticos na Repressão à Litigância de Má-fé – Papel do Juiz, in Revista Jurídica 368, Junho/2008, pp. 12-29).

Portanto, ao ajuizar a presente ação, renovando pedido que já fora objeto de apreciação judicial, a parte autora procedeu de forma temerária, sem sequer mencionar a existência da primeira ação na petição inicial.

Assim, tenho que se impõe a condenação da parte autora ao pagamento de multa por litigâ

ncia de má-fé, nos termos dos arts. 17 e 18 do CPC. Porém, reduzo de ofício a multa para 1% sobre o valor da causa.

É importante ressaltar que, mesmo que a parte litigue sob o amparo da AJG, a condenação ao pagamento das verbas extraordinárias, como as despesas acima referidas, não estão compreendidas no benefício que assegura o acesso à Justiça. Colaciono precedente desta Corte nesse sentido:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. PENA DE LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. SUSPENSÃO. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. O pagamento de multa em face de condenação por litigância de má-fé (CPC, arts. 17, III e 18, caput) não está compreendida no rol de isenções enumerado pela lei que dispôs sobre a Assistência Judiciária Gratuita (AJG, Lei nº 1.060/50). Agravo improvido.

(TRF4, AG 2009.04.00.042712-6, Terceira Turma, Relator Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, D.E. 27-01-2010)

Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso e, de ofício, reduzir a multa por litigância de má-fé.

Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE

Relatora


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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 24/08/2016

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0023383-77.2013.4.04.9999/PR

ORIGEM: PR 00005071020118160145

RELATOR:Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
PRESIDENTE:Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PROCURADOR:Procuradora Regional da República Solange Mendes de Souza
APELANTE:JOSE LOURENCO
ADVOGADO:Thais Takahashi
APELADO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
ADVOGADO:Procuradoria Regional da PFE-INSS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 24/08/2016, na seqüência 17, disponibilizada no DE de 08/08/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.

Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E, DE OFÍCIO, REDUZIR A MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ.

RELATOR ACÓRDÃO:Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
VOTANTE(S):Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
:Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
:Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO

Gilberto Flores do Nascimento

Diretor de Secretaria


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