Ementa para citação:

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DE FILHA. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA NÃO COMPROVADA.

É devida a pensão por morte à mãe decorrente do falecimento da filha pois demonstrada a dependência econômica diante da prova documental trazida ao feito e pelos depoimentos colhidos ao longo da instrução.

(TRF4, EINF 5009102-36.2011.404.7110, TERCEIRA SEÇÃO, Relator ROGERIO FAVRETO, juntado aos autos em 05/07/2016)


INTEIRO TEOR

EMBARGOS INFRINGENTES Nº 5009102-36.2011.4.04.7110/RS

RELATOR:ROGERIO FAVRETO
EMBARGANTE:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
EMBARGADO:ONEIDA SOUZA DE SOUZA
ADVOGADO:ANA CRISTINA DOS SANTOS PORTO

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DE FILHA. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA NÃO COMPROVADA.

É devida a pensão por morte à mãe decorrente do falecimento da filha pois demonstrada a dependência econômica diante da prova documental trazida ao feito e pelos depoimentos colhidos ao longo da instrução.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento aos embargos infringentes, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 30 de junho de 2016.

Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO

Relator


Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8362683v1 e, se solicitado, do código CRC BE80D73.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): Rogerio Favreto
Data e Hora: 05/07/2016 11:14

EMBARGOS INFRINGENTES Nº 5009102-36.2011.4.04.7110/RS

RELATOR:ROGERIO FAVRETO
EMBARGANTE:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
EMBARGADO:ONEIDA SOUZA DE SOUZA
ADVOGADO:ANA CRISTINA DOS SANTOS PORTO

RELATÓRIO

Trata-se de embargos infringentes interpostos pelo INSS (evento 22) contra acórdão da 6ª Turma desta Corte que, por maioria de votos de seus membros, deu parcial provimento à apelação e determinou o seu cumprimento imediato. A divergência reside na existência ou não da união estável entre a autora e o falecido, mesmo em regime de concubinato.

A decisão restou ementada nestes termos (evento 17):

PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE DE COMPANHEIRO. COMPROVAÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. 1. Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte. 2. Comprovada a união estável, presume-se a dependência econômica (artigo 16, § 4º, da Lei 8.213/91), impondo-se à Previdência Social demonstrar que esta não existia. In casu, a autora comprovou a existência de união estável com o de cujus, fazendo jus, portanto, à pensão por morte do companheiro. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5009102-36.2011.404.7110, 6ª TURMA, Des. Federal CELSO KIPPER, POR MAIORIA, VENCIDO O RELATOR, JUNTADO AOS AUTOS EM 18/01/2016)

Em suas razões de recorrer, o INSS embargante requer a prevalência do voto vencido e a manutenção da sentença de improcedência.

É o breve relato.

VOTO

Preliminarmente, registro que embora o CPC/2015 não tenha previsão para o recurso de embargos infringentes, deve-se considerar que, no caso concreto, o mesmo foi interposto quando vigente o CPC/73. Assim, para que se preserve o devido processo legal, a impugnação deve ser conhecida segundo as regras então em vigor.

voto minoritário (evento 5), proferido pelo Juiz Federal Paulo Paim da Silva, analisou o caso nos seguintes termos:

“VOTO

Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte.

À época do falecimento de Hilário Bueno de Oliveira (15/10/2007 – evento 1, CERTOBT2), vigia o art. 74 da Lei n. 8.213/91, já na redação atual, dada pela Lei n. 9.528/97, que disciplinou a concessão de pensão por morte nos seguintes termos:

“Art. 74 – A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data:

I – do óbito, quando requerida até 30 dias depois deste;

II – do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior;

III – da decisão judicial, no caso de morte presumida.”

No presente processo, a autora relata que viveu em união estável com o de cujus por 40 (quarenta) anos, até o seu óbito.

Assim, a controvérsia restringe-se à comprovação da existência da união estável havida entre a autora e o de cujus, uma vez que a qualidade de segurado deste está comprovada, tendo em vista que era titular de aposentadoria por idade desde 13/08/2001 (NB 118.331.117-3 – evento 26, PROCADM1, p. 29), e a dependência econômica entre os companheiros é presumida por força de lei (art. 16, § 4º, da Lei 8.213/91).

No que pertine à qualidade de companheira, a Constituição de 1988 estendeu a proteção dada pelo Estado à família para as entidades familiares constituídas a partir da união estável entre homem e mulher nos seguintes termos:

“Art. 226, § 3º: Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.”

O legislador ordinário, por sua vez, regulamentou esse dispositivo constitucional na Lei 9.278/96:

“Art. 1º É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida como objetivo de constituição da família.”

 

A Lei 8.213/91, em sua redação original, assim definiu companheiro (a):

“Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

(…)

§3º Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o§ 3º do artigo 226 da Constituição Federal.”

 

Já o Decreto 3.048/99 conceituou a união estável deste modo:

“Art.16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

(…)

§ 6º Considera-se união estável aquela verificada entre o homem e a mulher como entidade familiar, quando forem solteiros, separados judicialmente, divorciados ou viúvos, ou tenham prole em comum, enquanto não se separarem.”

Ressalto, ainda, que o novo Código Civil disciplinou a matéria consoante dispõem o caput e o §1º do seu art. 1.723:

“Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.

§ 1º. A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente.”

Em qualquer caso, para o reconhecimento da união estável, essencial que haja aparência de casamento, não sendo a coabitação, entretanto, requisito indispensável, consoante demonstra o julgado do STJ abaixo ementado:

“DIREITOS PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. UNIÃO ESTÁVEL. REQUISITOS. CONVIVÊNCIA SOB O MESMO TETO. DISPENSA. CASO CONCRETO. LEI N. 9.728/96. ENUNCIADO N. 382 DA SÚMULA/STF. ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA/STJ. DOUTRINA. PRECEDENTES. RECONVENÇÃO. CAPÍTULO DA SENTENÇA. TANTUM DEVOLUTUM QUANTUM APELLATUM. HONORÁRIOS. INCIDÊNCIA SOBRE A CONDENAÇÃO. ART. 20, § 3º, CPC. RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE.

I – Não exige a lei específica (Lei n. 9.728/96) a coabitação como requisito essencial para caracterizar a união estável. Na realidade, a convivência sob o mesmo teto pode ser um dos fundamentos a demonstrar a relação comum, mas a sua ausência não afasta, de imediato, a existência da união estável.

II – Diante da alteração dos costumes, além das profundas mudanças pelas quais tem passado a sociedade, não é raro encontrar cônjuges ou companheiros residindo em locais diferentes.

III – O que se mostra indispensável é que a união se revista de estabilidade, ou seja, que haja aparência de casamento, como no caso entendeu o acórdão impugnado. (…)”

(STJ, Quarta Turma, REsp 474962, Processo: 200200952476/SP, DJ 01-03-2004, Relator Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA) (Grifei)

 

De mais a mais, comprovada a relação concubinária com intuitu familiae, isto é, aquela que apresenta convivência duradoura, pública, contínua e reconhecida como tal pela comunidade na qual convivem os companheiros, presume-se a dependência econômica, como referi alhures, impondo-se à Previdência Social demonstrar que esta não existia. Nesse sentido:

“PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE DE COMPANHEIRO. UNIÃO ESTÁVEL QUANDO DO ÓBITO.

1. A prova material demonstra a convivência “more uxório”, sendo presumida a dependência econômica, entre companheiros. (…)”

(Sexta Turma, AC 533327, Processo: 199971000160532/RS, DJU 23-07-2003, Relator Des. Fed. NÉFI CORDEIRO)

 

“PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. CONDIÇÃO DE SEGURADO ESPECIAL DO DE CUJUS. COMPROVAÇÃO. UNIÃO ESTÁVEL. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. (…)

2. A dependência econômica da companheira é presumida (art. 16, I e § 4º e art. 74 da Lei nº 8.213/91). (…)”

(Sexta Turma, AC 572909, Processo: 2001.70.07.002419-0/PR, DJU 23-06-2004, Rel. Des. Fed. NYLSON PAIM DE ABREU)

 

No presente caso, entendo que essas questões foram devidamente analisadas na sentença, que merece confirmação: 

A autora pretende a concessão de pensão por morte, alegando que conviveu maritalmente com o segurado Hilário Bruno de Oliveira, instituidor da pensão, pelo período aproximado de quarenta anos, até o falecimento do mesmo, em 15/10/2007. Requereu o benefício ora pleiteado em 22/03/2011, o qual foi indeferido pelo INSS, por falta de provas da qualidade de dependente.

Destaque-se que, para ter direito a tal benefício, deve a autora comprovar que houve o preenchimento dos pressupostos previstos na legislação previdenciária, vigente à época do evento morte, que instituiria a pensão requerida, tendo em vista que o benefício é devido ao conjunto de dependentes do segurado que falecer (art. 74, da Lei n° 8.213/91).

No tocante ao evento morte, encontra-se documentado pela certidão de óbito apresentada juntamente com a inicial (CERTOBT2, evento nº 1).

O requisito da qualidade de segurado do instituidor à época do falecimento sequer foi impugnado pela Autarquia, eis que o de cujus era aposentado por i

dade quando do óbito (NB 118.331.117-3, com DIB em 13/08/2001).

Quanto ao amparo legal a eventual direito da autora à pensão por morte, enquanto companheira e dependente, o artigo 16 da Lei nº 8.213/91, vigente à época do requerimento administrativo, assim dispõe:

‘Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

I – o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;

(…)

§ 4º. A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.’

Para fins de comprovação do vínculo ou dependência econômica, o artigo 22, § 3º, do Decreto nº 3.048, de 06/05/1999, disciplina:

‘Art. 22. (…)

§ 3º Para comprovação do vínculo e da dependência econômica, conforme o caso, podem ser apresentados os seguintes documentos, observado o disposto nos §§ 7º e 8º:

I – certidão de nascimento de filho havido em comum;

II – certidão de casamento religioso;

III – declaração do imposto de renda do segurado, em que conste o interessado como seu dependente;

IV – disposições testamentárias;

V – anotação constante na Carteira Profissional e/ou na Carteira de Trabalho e Previdência Social, feita pelo órgão competente;

VI – declaração especial feita perante tabelião;

VII – prova do mesmo domicílio;

VIII – prova de encargos domésticos evidentes e existência de sociedade ou comunhão nos atos da vida civil;

IX – procuração ou fiança reciprocamente outorgada;

X – conta bancária conjunta;

XI – registro em associação de qualquer natureza, onde conste o interessado como dependente do segurado;

XII – anotação constante de ficha ou livro de registro de empregados;

XIII- apólice de seguro da qual conste o segurado como instituidor do seguro e a pessoa interessada como sua beneficiária;

XIV – ficha de tratamento em instituição de assistência médica, da qual conste o segurado como responsável;

XV – escritura de compra e venda de imóvel pelo segurado em nome de dependente;

XVI – declaração de não emancipação do dependente menor de vinte e um anos; ou

XVII – quaisquer outros que possam levar à convicção do fato comprovar.

(…)’

Pode-se constatar, eis que há expressa disposição legal, de que assiste o direito ao benefício aos dependentes que comprovaram o vínculo ou dependência econômica com base nas inúmeras hipóteses elencadas no dispositivo. Cumpre, assim, examinar se a autora preenche os requisitos legais necessários à obtenção do benefício postulado, nos moldes da legislação em epígrafe, observando-se que, no caso dos beneficiários arrolados no primeiro inciso, a dependência é presumida, bastando a prova de seu ‘status de companheiro’ (vínculo).

Inicialmente, cumpre destacar, quanto à existência de filho em comum (cuja certidão de nascimento, diga-se de passagem, não foi anexada aos autos), que o nascimento deste ocorreu aproximadamente 37 anos antes do óbito do instituidor, de maneira que se faria necessária a apresentação de outros elementos probatórios, capazes de demonstrar que eventual relacionamento entre os pais da criança teria perdurado até o momento em que o de cujus faleceu. Tem-se, contudo, que isso não ocorreu.

No que se refere à prova material, foram acostados aos autos os seguintes documentos: a) fotografias do suposto casal; b) peças processuais extraídas de demanda ajuizada perante Vara de Família da Justiça Estadual, na qual restou homologado acordo firmado entre a autora e os sucessores do instituidor, no sentido do reconhecimento da existência de união estável entre ela e o de cujus.

Relativamente às fotografias apresentadas, cumpre observar que praticamente todas foram tiradas muitos anos antes do óbito do instituidor, basicamente na década de 1970, quando o filho dele com a autora ainda era uma criança (quando o segurado faleceu, o filho já tinha 37 anos de idade) e quando a própria requerente ainda era bastante jovem. Note-se que, segundo se depreende dos depoimentos colhidos em audiência, nessa época o extinto segurado ainda estava casado com a mãe de seus filhos mais velhos e mantinha com a postulante um relacionamento paralelo (como sua ‘amante’), situação que perdurou até o falecimento da esposa (o que, segundo o depoente Agripino Bueno, teria ocorrido aproximadamente 10 anos antes do óbito do de cujus, ou seja, em meados da década de 1990). Desse modo, tem-se que os referidos elementos não se prestam à comprovação do alegado convívio marital na época do falecimento do instituidor.

Quanto às duas fotos mais recentes, nas quais a autora e o instituidor aparecem (FOTO38 e FOTO39, evento nº 1), não se pode perder de vista que as mesmas retratam um grupo de pessoas em situação que não denota intimidade entre o suposto casal. Ora, levando-se em conta que a demandante e o extinto segurado possuíam um filho e uma neta em comum, é natural que aparecessem juntos em registros fotográficos feitos em determinadas ocasiões festivas (como aniversários, formaturas, comemorações etc.), o que é distinto de haver relacionamento similar a união estável entre eles. Portanto, as fotos em questão tampouco constituem elementos hábeis à demonstração da existência de união estável.

No que tange às peças extraídas da ‘Ação de Reconhecimento e Desconstituição de Sociedade de Fato’ ajuizada pela autora, merece destaque o fato de que não houve apreciação do mérito da aludida demanda, eis que a postulante e os filhos do suposto companheiro firmaram acordo, posteriormente homologado através de sentença, por meio do qual vê-se que negociaram o ‘reconhecimento’ da convivência marital e a condição de sucessora da requerente (limitada a aproximadamente 10% do patrimônio), em troca da liberação, em contrapartida, de determinados bens imóveis (de maior valor) do inventário do de cujus. No caso, não se pode perder de vista que, como os filhos do extinto segurado não fariam jus à percepção de pensão por morte em razão do falecimento do pai, não se opusessem ao reconhecimento da união estável para fins de recebimento do benefício por parte da demandante, especialmente tendo em vista que, para tanto, esta abriu mão de pleitear, a título de herança, uma parcela considerável dos bens que pertenceriam ao instituidor. Tem-se, pois, que a avença pactuada perante a Vara de Família não pode ser considerada como prova, uma vez que as circunstâncias que levaram ao acerto não têm o condão de produzir efeitos na esfera previdenciária, já que aqui se trata de direito que não se encontra na esfera de disponibilidade dos sucessores, ao contrário do direito patrimonial transacionado.

Além disso, não se pode perder de vista que a decisão proferida pela Vara de Família não comunica efeitos para a ação previdenciária, incumbindo ao Juízo Federal, ao examinar a presente demanda, analisar incidentalmente e com independência funcional as questões pertinentes à relação de família que tenham reflexos sobre as condições de gozo de benefícios previdenciários. De fato, a decisão proferida na Justiça Estadual prescinde da análise do preenchimento dos requisitos indispensáveis à concessão de pensão por morte, razão pela qual o reconhecimento da união estável naquela seara não torna superada a discussão, no âmbito da Justiça Federal.

Observe-se, ainda, que se afigura no mínimo curioso que a autora e o de cujus tivessem se relacionado, como companheiros, por mais de quatro décadas e, no entanto, não existam documentos em comum, ao longo de todo este período, a

ptos a demonstrar, ao menos, a residência compartilhada.

Aliás, é forçoso reconhecer que os elementos coligidos aos autos indicam justamente o contrário, ou seja, que a pleiteante e o suposto companheiro não viviam sob o mesmo teto. Nesse sentido, observe-se que constou da certidão de óbito que o extinto segurado residia na Rua General Osório, nº 1259, apto. 101, em Pelotas, ao passo que no cadastro mantido junto aos bancos de dados da Previdência (PLENUS) constou que ele morou na Rua Princesa Isabel, nº 280, bairro Navegantes, em São Lourenço do Sul, sendo que tal dado teria sido atualizado quando da realização do CENSO, pouco tempo antes do óbito. Por outro lado, verifica-se que a requerente informou, tanto no processo administrativo, quanto nos feitos que tramitaram nos Juízos Estadual e Federal, que seu endereço seria na Rua Tiradentes, nº 1.304, em Pelotas.

A propósito dessa residência em endereços distintos, cabe registrar que o depoente Agripino Bueno asseverou que o instituidor doou um imóvel residencial à autora, mas mantinha residencia ‘oficial’ na Rua General Osório, para receber os filhos e amigos e para realizar reuniões de negócios, sendo que a autora não residia ali com ele, nem participava da vida familiar dele. A testemunha reconheceu que, nos últimos anos de vida do de cujus, frequentava quase que diariamente esse último endereço para tomar chimarrão com ele (do que, repita-se, a autora não participava), e raramente se dirigia à casa da autora, o que afasta a alegação de coabitação com o segurado. O ex-segurado frequentava assiduamente a casa da autora, mas ela não participava da vida dele.

Por sua vez, o sobrinho da autora informou que a família desta considerava-a ‘amante’ do ex-segurado, tratando-se de relacionamento paralelo que durou décadas, na mesma condição: em que pese o filho em comum, não havia intuito de constituir família ou equiparar o relacionamento com ela ao casamento.

Note-se que não se está, aqui, negando a existência de um relacionamento amoroso entre a autora e o de cujus em determinado momento de suas vidas. O que se questiona, em realidade, é possibilidade de enquadramento dessa relação como união estável, pois houve a manutenção do mesmo tipo de relacionamento (paralelo) até a época do óbito, ou seja, alheio ao grupo social e familiar dele.

De fato, embora se possa admitir que a demandante tivesse um convívio frequente com o segurado, ela não logrou êxito em comprovar que era mais do que uma ‘amante’ (como define o sobrinho dela), incumbência essa que lhe cabia fazer de forma robusta. Nesse contexto, percebe-se que não restou caracterizada a união com objetivo de constituir família, similar ao casamento.

Desta forma, tem-se que, ante a fragilidade do conjunto probatório carreado aos autos, não restou devidamente comprovada a natureza do vínculo estabelecido entre a autora e o de cujus, nos termos dos artigos 226, § 3º da Constituição Federal, ou seja, não restou demonstrado que a autora e o segurado mantinham uma relação como o objetivo de constituição de família, de acordo com a interpretação sistemática das Leis 9.278/96 e 8.213/91 (artigo 16). Do mesmo modo, ainda que se considerasse a existência de união entre o casal, não ficou demonstrado que tal relação perdurava até a época do óbito.

Assim sendo, entendo não estarem preenchidos todos os requisitos para a concessão do benefício de pensão por morte requerido pela autora, na forma do artigo 74 e seguintes da Lei nº 8.231/91.

Em razão disso, deve ser mantida a sentença de improcedência.

Honorários

Mantenho a condenação da parte autora ao pagamento dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% do valor atualizado da causa, restando suspensa a satisfação respectiva, por ser beneficiária da AJG, nos termos do art. 12 da Lei 1.060/50.

Prequestionamento

Para fins de possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores dou por prequestionadas as matérias constitucionais e legais alegadas em recurso pelas partes, nos termos das razões de decidir já externadas no voto, deixando de aplicar dispositivos constitucionais ou legais não expressamente mencionados e/ou tidos como aptos a fundamentar pronunciamento judicial em sentido diverso do declinado.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por negar provimento ao apelo.

(Digital) Juiz Federal Paulo Paim da Silva

Relator”

Por sua vez, o voto majoritário, proferido pelo Des. Federal  CELSO KIPPER, analisou o caso concreto e as provas no seguinte teor (evento 17):

VOTO-VISTA

Pedi vista dos autos para melhor exame e trago o processo a julgamento na forma regimental.

Trata-se de apelação da parte autora contra a sentença que julgou improcedente o pedido de concessão do benefício de pensão por morte de seu companheiro, Hilário Bueno de Oliveira, falecido em 15-10-2007, aos 91 anos de idade.

O e. Relator votou por negar provimento ao apelo.

Peço vênia para divergir.

Em que pese o processamento dos pedidos de concessão de pensão por morte de companheiro em face do INSS seja realizado na Justiça Federal, mediante reconhecimento incidenter tantum das relações de união estável, por força do art. 109, I, da Constituição Federal, registro que o Egrégio STJ pacificou o entendimento de que toca à Justiça Estadual operar o reconhecimento de relações de união estável, ainda que haja o escopo mediato de obter prestações ou benefícios junto a autarquias ou empresas públicas federais (AgRg no REsp 1226390/RS, CC 104.529/MG, CC 94.774/RJ, CC 86.553/DF, CC 51.173/PA).

Ainda que o INSS não tenha sido parte do processo em que foi reconhecida a existência de união estável entre a autora e o falecido segurado, o Órgão Ancilar fica vinculado ao decisum estadual, vale dizer, não em virtude da extensão dos efeitos da coisa julgada a ele, mas sim da própria eficácia declaratória da sentença lá proferida.

Não obstante, no caso concreto, cabe salientar que o reconhecimento da união estável entre a autora e o falecido segurado foi, em verdade, objeto de acordo firmado entre a primeira e os sucessores deste último, sendo apenas homologado judicialmente (evento1, SENT10), no bojo da ação n. 022/1.08.0018612-6, a qual tramitou na 2ª Vara de Família da Comarca de Pelotas-RS após o falecimento do de cujus.

Dados os termos do referido acerto, comungo do entendimento de que, diferentemente de uma sentença estadual meritória, tal documento não vincula a análise acerca da existência de união estável pela Justiça Federal, para fins de concessão de benefício previdenciário. No ponto, permito-me transcrever excerto da sentença que bem analisou a questão:

No que tange às peças extraídas da ‘Ação de Reconhecimento e Desconstituição de Sociedade de Fato’ ajuizada pela autora, merece destaque o fato de que não houve apreciação do mérito da aludida demanda, eis que a postulante e os filhos do suposto companheiro firmaram acordo, posteriormente homologado através de sentença, por meio do qual vê-se que negociaram o ‘reconhecimento’ da convivência marital e a condição de sucessora da requerente (limitada a aproximadamente 10% do patrimônio), em troca da liberação, em contrapartida, de determinados bens imóveis (de maior valor) do inventário do de cujus. No caso, não se pode perder de vista que, como os filhos do extinto segurado não fariam jus à percepção de pensão por morte em razão do falecimento do pai, não se opusessem ao reconhecimento da união estável para fins de recebimento do benefício por parte da demandante, especialmente tendo em vista que, para tanto, esta abriu mão de pleitear, a título de herança, uma parcela

considerável dos bens que pertenceriam ao instituidor. Tem-se, pois, que a avença pactuada perante a Vara de Família não pode ser considerada como prova, uma vez que as circunstâncias que levaram ao acerto não têm o condão de produzir efeitos na esfera previdenciária, já que aqui se trata de direito que não se encontra na esfera de disponibilidade dos sucessores, ao contrário do direito patrimonial transacionado.

 

Nesses termos, não restando esta Corte adstrita à aludida decisão judicial advinda da Justiça Estadual (pois meramente homologatória de acordo realizado entre as partes), torna-se necessária a análise dos demais elementos juntados ao feito para fins de comprovação da alegada união estável.

No caso dos autos, Oneida sustenta que viveu em união estável, por 40 (quarenta) anos, com HILÁRIO BUENO DE OLIVEIRA, falecido em 15/10/2007. Refere que o de cujus tinha uma esposa, mas ao mesmo tempo, tinha um relacionamento com a Apelante. No decorrer do relacionamento com a Apelante, a esposa do de cujus veio a falecer, ficando o mesmo viúvo. Ressalta-se que a Apelante e o de cujus viviam sob o mesmo teto. O de cujus era fazendeiro e estava sempre viajando, sendo que quando chegava em Pelotas ficava na casa da Apelante. Afirma que deste relacionamento nasceu, em 1968, o filho Alexandre Souza de Oliveira.

No que tange à qualidade de companheira, a Constituição de 1988 estendeu a proteção dada pelo Estado à família para as entidades familiares constituídas a partir da união estável entre homem e mulher nos seguintes termos:

‘Art. 226, § 3º: Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.’

 

O legislador ordinário, por sua vez, regulamentou esse dispositivo constitucional na Lei 9.278/96:

 

‘Art. 1º É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida como objetivo de constituição da família.’

 

A Lei 8.213/91, em sua redação original, assim definiu companheira:

‘Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

(…)

§3º Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o§ 3º do artigo 226 da Constituição Federal.’

 

Já o Decreto 3.048/99 conceituou a união estável deste modo:

‘Art.16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

(…)

§ 6º Considera-se união estável aquela verificada entre o homem e a mulher como entidade familiar, quando forem solteiros, separados judicialmente, divorciados ou viúvos, ou tenham prole em comum, enquanto não se separarem.’

Ressalto, ainda, que o Código Civil disciplinou a matéria consoante dispõem o caput e o §1º do seu art. 1.723:

‘Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.

§ 1º. A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente.’

 

Em qualquer caso, para o reconhecimento da união estável, essencial que haja aparência de casamento, não sendo a coabitação, entretanto, requisito indispensável, consoante demonstra o julgado do STJ abaixo ementado:

 

‘DIREITOS PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. UNIÃO ESTÁVEL. REQUISITOS. CONVIVÊNCIA SOB O MESMO TETO. DISPENSA. CASO CONCRETO. LEI N. 9.728/96. ENUNCIADO N. 382 DA SÚMULA/STF. ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA/STJ. DOUTRINA. PRECEDENTES. RECONVENÇÃO. CAPÍTULO DA SENTENÇA. TANTUM DEVOLUTUM QUANTUM APELLATUM. HONORÁRIOS. INCIDÊNCIA SOBRE A CONDENAÇÃO. ART. 20, § 3º, CPC. RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE.

I – Não exige a lei específica (Lei n. 9.728/96) a coabitação como requisito essencial para caracterizar a união estável. Na realidade, a convivência sob o mesmo teto pode ser um dos fundamentos a demonstrar a relação comum, mas a sua ausência não afasta, de imediato, a existência da união estável.

II – Diante da alteração dos costumes, além das profundas mudanças pelas quais tem passado a sociedade, não é raro encontrar cônjuges ou companheiros residindo em locais diferentes.

III – O que se mostra indispensável é que a união se revista de estabilidade, ou seja, que haja aparência de casamento, como no caso entendeu o acórdão impugnado. (…)’

(STJ, Quarta Turma, REsp 474962, Processo: 200200952476/SP, DJ 01-03-2004, Relator Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA) (Grifei)

 

De mais a mais, comprovada a relação concubinária com intuitu familiae, isto é, aquela que apresenta convivência duradoura, pública, contínua e reconhecida como tal pela comunidade na qual convivem os companheiros, presume-se a dependência econômica, impondo-se à Previdência Social demonstrar que esta não existia. Nesse sentido:

‘PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE DE COMPANHEIRO. UNIÃO ESTÁVEL QUANDO DO ÓBITO.

1. A prova material demonstra a convivência ‘more uxório’, sendo presumida a dependência econômica, entre companheiros. (…)’

(Sexta Turma, AC 533327, Processo: 199971000160532/RS, DJU 23-07-2003, Relator Des. Fed. NÉFI CORDEIRO)

 

‘PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. CONDIÇÃO DE SEGURADO ESPECIAL DO DE CUJUS. COMPROVAÇÃO. UNIÃO ESTÁVEL. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. (…)

2. A dependência econômica da companheira é presumida (art. 16, I e § 4º e art. 74 da Lei nº 8.213/91). (…)’

(Sexta Turma, AC 572909, Processo: 2001.70.07.002419-0/PR, DJU 23-06-2004, Rel. Des. Fed. NYLSON PAIM DE ABREU)

 

No caso concreto, a prova oral, colhida na audiência realizada em 05-06-2013, foi no seguinte sentido:

Oneida Souza de Souza (parte autora):

 

‘(…) que conheceu o de cujus com 15 anos de idade; que tinham cerca de 40 anos de diferença de idade; que nunca romperam o relacionamento; que permaneceram juntos até o de cujus falecer; (…) que sempre dependeu dele; que ele nunca a deixou trabalhar; que tiveram um filho juntos; que tentaram se casar depois que o de cujus ficou viúvo, mas que no Cartório disseram que não poderiam em razão da idade do de cujus; (…) que entrou com ação na Justiça Estadual pois entendia que tinha direito aos bens e à pensão, pois não é aposentada e sempre sobreviveu através do de cujus (…)’

Agripino Bueno:

‘(…) que conheceu a autora quando o de cujus começou o namoro com ela; que ela deveria ter uns 14 ou 15 anos; (…) que, na época, o de cujus trabalhava em São Lourenço, mas sua moradia era em Pelotas; (…) que o de cujus e a autora tinham cerca de 40 anos de diferença de idade; que o de cujus era casado, que o relacionamento com a autora era paralelo; que a casa onde a autora mora hoje foi o de cujus quem lhe deu; (…) que não sabe se o de cujus tinha intenção de casar com a autora depois que ficou viúvo, mas vivia com ela; (…) que o relacionamento deles era concubinário; que o de cujus morava com as duas (autora e esposa); (…) que a autora cuidava do de cujus; (…) que por diversas vezes levou dinheiro para autora a pedido do falecido, que era ele quem a sustentava; que os filhos do de cujus não tinham um bom relacionamento com a autora; que por isso o falecido mantinha dois endereços

; mas os filhos sabiam que ele morava com a autora; (…) que o de cujus morreu nos braços da autora; que os filhos não visitavam ele, que era muito raro um filho ir lá, tanto que um deles foi embora para o Mato Grosso e ficou 6 anos sem ver o pai e os outros não davam a mínima bola para ele; quem cuidava do de cujus nos últimos anos era a autora; que tinha enfermeiras que ajudavam no cuidado; (…) que o de cujus nunca largou a autora, nem quando era casado; (…) que a autora nunca trabalhou, pois o falecido tinha muito ciúmes dela, não a deixava trabalhar; que o falecido era ‘milionário’; (…) que eles tiveram um filho juntos; que o nome do filho é Alexandre e possui, hoje, 40 anos; (…)’

Fernando Luis Sousa Rodrigues (ouvido como informante):

‘(…) que é sobrinho da autora; que sempre conviveu com a tia e o de cujus; que quem cuidou do de cujus nos últimos dias de vida foi a autora; (…) que o relacionamento que a tia mantinha com o de cujus era paralelo; que a família sabia e era ajudada pelo de cujus; (…) que o de cujus era muito rico, tinha engenhos, plantava arroz; (…) que, para a família, a tia era considerada amante, mas que não tinha nenhuma vergonha nisso; (…)’

 

Ainda, foram trazidos aos autos os seguintes documentos (evento 1):

a) cópias da petição inicial e da sentença homologatória relativas à ação de reconhecimento e desconstituição de sociedade de fato ajuizada perante a 2ª Vara de Família da Comarca de Pelotas-RS;

b) fotos do casal e do filho, sendo essas, em sua maioria, referentes à década de 70.

De acordo com a prova produzida nos autos, sobretudo do teor dos depoimentos das testemunhas, concluo que o de cujus manteve, durante muitos anos, paralela e simultaneamente, o casamento com a esposa (Maria Eugenia de Oliveira, já falecida) e a união estável com a autora Oneida.

Com efeito, a própria autora admitiu ter iniciado o relacionamento amoroso quando o de cujus ainda era casado (não ficando esclarecida a data em que este se tornou viúvo).

Entendo que a relação de concubinato mantida em concomitância com uma relação matrimonial não afasta, por si só, o direito da concubina à percepção do benefício de pensão por morte, desde que demonstrada a união estável com o de cujus, o que, in casu, ocorreu. Assim, deve ser reconhecido que a autora ostenta a condição de dependente previdenciária do falecido Hilário Bueno de Oliveira, fazendo jus à pensão em virtude do falecimento deste.

Tal entendimento, porém, destoa da interpretação conferida pelo Supremo Tribunal Federal ao § 3.º do art. 226 da Constituição Federal. Por ocasião do julgamento do RE 590779/ES, em 10-02-2009, Dje de 27-03-2009, a Primeira Turma da Excelsa Corte reiterou o entendimento firmado no RE 397762/BA, Dje de 12.09.2008, no sentido da impossibilidade de configuração de união estável quando um dos seus componentes é casado e vive matrimonialmente com o cônjuge. Ressaltou-se nesse julgamento que, apesar de o Código Civil versar a união estável como núcleo familiar, excepciona a proteção do Estado quando existente impedimento para o casamento relativamente aos integrantes da união, sendo que, se um deles é casado, esse estado civil apenas deixa de ser óbice quando verificada a separação de fato. Concluiu-se, dessa forma, estar-se diante de concubinato (CC, art. 1.727), e não de união estável.

Os precedentes do Supremo Tribunal Federal acima mencionados, ambos de relatoria do e. Min. Marco Aurélio, receberam idêntica ementa, verbis:

COMPANHEIRA E CONCUBINA – DISTINÇÃO. Sendo o Direito uma verdadeira ciência, impossível é confundir institutos, expressões e vocábulos, sob pena de prevalecer a babel.

 UNIÃO ESTÁVEL – PROTEÇÃO DO ESTADO. A proteção do Estado à união estável alcança apenas as situações legítimas e nestas não está incluído o concubinato.

 PENSÃO – SERVIDOR PÚBLICO – MULHER – CONCUBINA -M DIREITO. A titularidade da pensão decorrente do falecimento de servidor público pressupõe vínculo agasalhado pelo ordenamento jurídico, mostrando-se impróprio o implemento de divisão a beneficiar, em detrimento da família, a concubina.

 

Tal entendimento, ainda que de maneira indireta, também vem sendo adotado, em decisões monocráticas, por Ministros integrantes da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, como se pode ver, v.g., no RE n. 491039/RJ, Rel. Min. Cezar Peluso, Dje de 05-08-2009 e no MS n. 27.871-MC, Rel. Min. Elen Gracie, Dje de 17-03-2009.

Todavia, deve ser levado em consideração que o Supremo Tribunal Federal, em 09-03-2012, reconheceu a existência de repercussão geral em processo no qual se discute a possibilidade de o concubinato de longa duração gerar efeitos previdenciários (RE 669465). De acordo com a notícia divulgada no site do STF, em 27-03-2012, no referido processo, a concubina teria convivido com um segurado do INSS por mais de vinte anos, em união pública e notória, apesar de ele ser casado, e chegaram a ter um filho em comum, sendo que a decisão recorrida determinou que a pensão por morte fosse rateada entre a concubina e a viúva.

Portanto, tendo em vista que a questão pende de decisão definitiva no Supremo Tribunal Federal, face ao reconhecimento de repercussão geral sobre o tema – e sobretudo porque o Judiciário não pode ignorar a realidade dos fatos comprovados nos autos, qual seja: que Hilário manteve, durante muitos anos, paralela e simultaneamente, o casamento com a esposa e a união estável com Oneida, permanecendo com esta última até a data do seu falecimento – entendo que deve ser reconhecida a condição de dependente previdenciária da autora.

De mais a mais, registro que, ainda que se entendesse por ser descaracterizada a união estável no período de concomitância do casamento, esta foi comprovada no período posterior ao falecimento da esposa do de cujus.

Portanto, faz jus a demandante ao benefício de pensão por morte postulado.

Termo inicial

Tendo em vista que transcorreram mais de 30 dias entre o falecimento e o requerimento administrativo, o marco inicial do benefício deve ser fixado na data do protocolo administrativo (20-04-2011), nos termos do art. 74, II, da Lei 8.213/91.

(…)

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação e determinar o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora.

Des. Federal CELSO KIPPER

 

Peço vênia para divergir da posição minoritária e filio-me ao entendimento manifestado no voto majoritário que, ao meu sentir, soube extrair a solução mais justa ao caso concreto.

Consectários fixados conforme determinado no voto vencido.

Ante o exposto, voto por negar provimento aos embargos infringentes.

Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO

Relator


Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8362682v13 e, se solicitado, do código CRC 6BB7462F.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): Rogerio Favreto
Data e Hora: 05/07/2016 11:14

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 30/06/2016

EMBARGOS INFRINGENTES Nº 5009102-36.2011.4.04.7110/RS

ORIGEM: RS 50091023620114047110

RELATOR:Des. Federal ROGERIO FAVRETO
PRESIDENTE:Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz
PROCURADOR:Dr. Domingos Sávio Dresch da Silveira
EMBARGANTE:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
EMBARGADO:ONEIDA SOUZA DE SOUZA
ADVOGADO:ANA CRISTINA DOS SANTOS PORTO

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 30/06/2016, na seqüência 62, disponibilizada no DE de 09/06/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.

Certifico que o(a) 3ª SEÇÃO, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A SEÇÃO, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AOS EMBARGOS INFRINGENTES.

RELATOR ACÓRDÃO:Des. Federal ROGERIO FAVRETO
VOTANTE(S):Des. Federal ROGERIO FAVRETO
:Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
:Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
:Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
:Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
:Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

Jaqueline Paiva Nunes Goron

Diretora de Secretaria

MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES

Unânime – Processo Pautado

Voto em 29/06/2016 17:40:17 (Gab. Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ)

com o relator.

Voto em 30/06/2016 09:23:53 (Gab. Des. Federal ROGER RAUPP RIOS)

Com o relator.


Documento eletrônico assinado por Jaqueline Paiva Nunes Goron, Diretora de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8426351v1 e, se solicitado, do código CRC 2BDF9BDA.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): Jaqueline Paiva Nunes Goron
Data e Hora: 30/06/2016 18:19

Voltar para o topo