Ementa para citação:
EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. AUSÊNCIA DE ERRO DE FATO. ANÁLISE DA PRETENSÃO POR FUNDAMENTO DIVERSO. VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. PREENCHIMENTO DO REQUISITO ETÁRIO E DA CARÊNCIA. COMPROVAÇÃO DO TRABALHO RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO DO BENEFÍCIO.
1. A decisão rescindenda não está fundada em erro de fato. A inicial não apresenta qualquer fundamentação a respeito do fato inexistente que teria sido admitido ou o fato efetivamente ocorrido que foi ignorado pelo acórdão rescindendo.
2. O alegado erro cometido na decisão decorre da má aplicação da lei, já que, segundo a inicial, o acórdão não considerou que os artigos 39 e 143 da Lei nº 8.213/1991 preveem a comprovação do exercício de atividade rural, por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência, ainda que de forma descontínua.
3. Conquanto a autora tenha indicado erroneamente o dispositivo de lei que embasa o pedido de rescisão, os fatos e os fundamentos jurídicos aptos a permitir a rescisão do julgado podem ser claramente compreendidos como violação a literal disposição de lei.
4. Os brocardos jurídicos jura novit curia e da mihi factum, dabo tibi jus são aplicáveis à ação rescisória, desde que as consequências jurídicas extraídas dos fatos narrados na inicial amoldem-se a uma das hipóteses previstas no art. 485 do CPC.
5. A ofensa a literal disposição de lei está imbricada ao fenômeno de incidência da norma jurídica. A violação pode ocorrer em decorrência da incorreta aplicação do dispositivo legal, quando o julgador identifica de modo errôneo a norma jurídica incidente sobre o caso concreto, ou da desconsideração de regra que deveria incidir. Também há violação quando a decisão rescindenda aplica a lei em desacordo com o seu suporte fático, ao qualificar equivocadamente os fatos jurídicos, ou confere interpretação evidentemente errada ou aberrante à norma. Dessa forma, se o julgado interpreta a norma razoavelmente, isto é, adota uma entre as interpretações possíveis, mesmo que não seja a melhor, não se configura a violação patente à norma jurídica.
6. O acórdão rescindendo considerou que o tempo de trabalho rural exercido até 1977 não poderia ser considerado para o atendimento do requisito da carência, pois não correspondia ao período imediatamente anterior ao implemento da idade.
7. Ainda que se admita a interrupção no exercício das atividades rurais durante o período de carência, o segurado especial deve ostentar essa qualidade no momento em que atingiu a idade e cumpriu o tempo de atividade rural equivalente à carência, não se permitindo a dissociação dos requisitos. Dessa forma, se o segurado especial deixa de exercer o trabalho rural quando implementa o requisito etário, sem ter preenchido o requisito da carência, não faz jus à aposentadoria rural por idade.
8. O entendimento expendido no julgado não contraria a literalidade e a interpretação sistemática dos artigos 39 e 143 da Lei nº 8.213/1991. O Superior Tribunal de Justiça apreciou, em julgamento submetido ao rito dos recursos repetitivos, a matéria relativa à comprovação do trabalho rural em número de meses correspondentes à carência, em período imediatamente anterior ao requerimento, para fins de concessão de aposentadoria por idade rural, firmando a seguinte tese no Tema nº 642: O segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade. (REsp 1.354.908-SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 9/9/2015, DJe 10/2/2016).
(TRF4, AR 0000632-18.2016.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator OSNI CARDOSO FILHO, D.E. 07/08/2018)
INTEIRO TEOR
D.E.
Publicado em 08/08/2018 |
AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0000632-18.2016.4.04.0000/RS
RELATOR | : | Des. Federal OSNI CARDOSO FILHO |
AUTOR | : | EROTIDES DOS SANTOS SCHMITT |
ADVOGADO | : | Marivone Hardt Betiollo e outro |
REU | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. AUSÊNCIA DE ERRO DE FATO. ANÁLISE DA PRETENSÃO POR FUNDAMENTO DIVERSO. VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. PREENCHIMENTO DO REQUISITO ETÁRIO E DA CARÊNCIA. COMPROVAÇÃO DO TRABALHO RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO DO BENEFÍCIO.
1. A decisão rescindenda não está fundada em erro de fato. A inicial não apresenta qualquer fundamentação a respeito do fato inexistente que teria sido admitido ou o fato efetivamente ocorrido que foi ignorado pelo acórdão rescindendo.
2. O alegado erro cometido na decisão decorre da má aplicação da lei, já que, segundo a inicial, o acórdão não considerou que os artigos 39 e 143 da Lei nº 8.213/1991 preveem a comprovação do exercício de atividade rural, por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência, ainda que de forma descontínua.
3. Conquanto a autora tenha indicado erroneamente o dispositivo de lei que embasa o pedido de rescisão, os fatos e os fundamentos jurídicos aptos a permitir a rescisão do julgado podem ser claramente compreendidos como violação a literal disposição de lei.
4. Os brocardos jurídicos jura novit curia e da mihi factum, dabo tibi jus são aplicáveis à ação rescisória, desde que as consequências jurídicas extraídas dos fatos narrados na inicial amoldem-se a uma das hipóteses previstas no art. 485 do CPC.
5. A ofensa a literal disposição de lei está imbricada ao fenômeno de incidência da norma jurídica. A violação pode ocorrer em decorrência da incorreta aplicação do dispositivo legal, quando o julgador identifica de modo errôneo a norma jurídica incidente sobre o caso concreto, ou da desconsideração de regra que deveria incidir. Também há violação quando a decisão rescindenda aplica a lei em desacordo com o seu suporte fático, ao qualificar equivocadamente os fatos jurídicos, ou confere interpretação evidentemente errada ou aberrante à norma. Dessa forma, se o julgado interpreta a norma razoavelmente, isto é, adota uma entre as interpretações possíveis, mesmo que não seja a melhor, não se configura a violação patente à norma jurídica.
6. O acórdão rescindendo considerou que o tempo de trabalho rural exercido até 1977 não poderia ser considerado para o atendimento do requisito da carência, pois não correspondia ao período imediatamente anterior ao implemento da idade.
7. Ainda que se admita a interrupção no exercício das atividades rurais durante o período de carência, o segurado especial deve ostentar essa qualidade no momento em que atingiu a idade e cumpriu o tempo de atividade rural equivalente à carência, não se permitindo a dissociação dos requisitos. Dessa forma, se o segurado especial deixa de exercer o trabalho rural quando implementa o requisito etário, sem ter preenchido o requisito da carência, não faz jus à aposentadoria rural por idade.
8. O entendimento expendido no julgado não contraria a literalidade e a interpretação sistemática dos artigos 39 e 143 da Lei nº 8.213/1991. O Superior Tribunal de Justiça apreciou, em julgamento submetido ao rito dos recursos repetitivos, a matéria relativa à comprovação do trabalho rural em número de meses correspondentes à carência, em período imediatamente anterior ao requerimento, para fins de concessão de aposentadoria por idade rural, firmando a seguinte tese no Tema nº 642: O segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade. (REsp 1.354.908-SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 9/9/2015, DJe 10/2/2016).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, julgar improcedente a ação rescisória, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 25 de julho de 2018.
Des. Federal OSNI CARDOSO FILHO
Relator
Documento eletrônico assinado por Des. Federal OSNI CARDOSO FILHO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9433336v8 e, se solicitado, do código CRC A8FAB2A8. | |
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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0000632-18.2016.4.04.0000/RS
RELATOR | : | Des. Federal OSNI CARDOSO FILHO |
AUTOR | : | EROTIDES DOS SANTOS SCHMITT |
ADVOGADO | : | Marivone Hardt Betiollo e outro |
REU | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
RELATÓRIO
Erotides dos Santos Schmitt ajuizou ação rescisória contra o INSS, postulando a desconstituição parcial do acórdão proferido no processo nº 0023663-48.2013.404.9999, com fundamento no art. 966, inciso VIII e parágrafo 1º, do CPC (erro de fato), e a realização de novo julgamento da causa, para que seja julgado procedente o pedido de concessão de aposentadoria rural por idade desde o requerimento administrativo (24-01-2013) até a data do deferimento do benefício assistencial (13-05-2015).
A autora narra que o acórdão rescindendo deu parcial provimento à apelação interposta contra a sentença de improcedência, para determinar a averbação de parte do período de trabalho rural, porém entendeu que a carência para a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural deveria ser preenchida no período imediatamente ao implemento do requisito etário ou ao requerimento administrativo. Aduz que a decisão rescindenda cometeu erro, ao não somar a atividade rural recente à pretérita, visto que não há nenhum dispositivo legal que exija o preenchimento de toda a carência no período imediatamente anterior ao atendimento dos demais requisitos da aposentadoria rural por idade. Observa que a sentença tem fundamento diverso, não se controvertendo sobre a questão na ação originária. Sustenta que o erro do acórdão contraria o disposto nos artigos 39 e 143 da Lei nº 8.213/1991, porquanto completou a carência exigida, ainda que de forma descontínua. Salienta que cumpriu um terço da carência (cinco anos) no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício (24-01-2013), mencionando acórdãos que reconheceram o direito à aposentadoria rural por idade, com base no art. 48, § 2º, e no art. 143, ambos da Lei nº 8.213/1991.
O pedido de concessão do benefício da justiça gratuita foi deferido.
O INSS apresentou contestação, alegando que não está configurado o erro de fato. Afirma que a carência para a aposentadoria deve ser completada no período imediatamente anterior ao preenchimento do requisito etário ou ao requerimento administrativo, conforme dispõe o art. 143 da Lei nº 8.213/1991. Refere que o Superior Tribunal de Justiça analisou a matéria, em sede de recurso repetitivo, no REsp nº 1.354.908/SP, firmando tese no sentido de que “o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer o benefício”. Argumenta que a carência pode ser preenchida com atividade não estritamente contínua, mas sem grandes interrupções, como no caso da autora, que interrompeu a atividade rural em 1977 e retomou-a apenas em 2006. Esgrime que a rescisória não é remédio processual para corrigir a injustiça das decisões, nem substitutivo recursal. Por fim, aduz que a rescisória encontra óbice na Súmula nº 343 do STF, porque a matéria era controvertida nos tribunais na época da decisão rescindenda.
A autora não se manifestou sobre a contestação.
O Ministério Público Federal apenas requereu o prosseguimento do feito.
VOTO
Observância do prazo decadencial
A sentença transitou em julgado em 23 de maio de 2014 (fl. 160) e a propositura da ação rescisória ocorreu em 17 de maio de 2016. Portanto, a ação foi ajuizada antes do escoamento do prazo decadencial de dois anos.
Legislação aplicável
Uma vez que o trânsito em julgado da sentença ocorreu durante a vigência da Lei nº 5.869/1973, são aplicáveis, no que diz respeito à ação rescisória, as normas do antigo Código de Processo Civil.
Erro de fato
Segundo o artigo 485, inciso IX, do Código de Processo Civil de 1973, a sentença de mérito transitada em julgado pode ser rescindida, quando fundada em erro de fato, resultante de atos ou de documentos da causa. No primeiro e segundo parágrafos desse dispositivo, explicita-se a compreensão do motivo para a rescisão: há erro, quando a decisão rescindenda admitir um fato inexistente, ou quando considerar inexistente um fato efetivamente ocorrido. Indispensável, num como noutro caso, que não tenha havido controvérsia, nem pronunciamento judicial sobre o fato.
No caso dos autos, a decisão rescindenda não está fundada em erro de fato. A inicial não apresenta qualquer fundamentação a respeito do fato inexistente que teria sido admitido ou o fato efetivamente ocorrido que foi ignorado pelo acórdão rescindendo. Depreende-se que o alegado erro cometido na decisão decorre da má aplicação da lei, já que, segundo a inicial, o acórdão não considerou que os artigos 39 e 143 da Lei nº 8.213/1991 preveem a comprovação do exercício de atividade rural, por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência, ainda que de forma descontínua. Portanto, a questão a ser dirimida nesta ação não versa sobre a hipótese de rescisão prevista no inciso IX do art. 485 do CPC, mas sobre a prevista no inciso V.
Conquanto a autora tenha indicado erroneamente o dispositivo de lei que embasa o pedido de rescisão, os fatos e os fundamentos jurídicos aptos a permitir a rescisão do julgado podem ser claramente compreendidos como violação a literal disposição de lei, tanto que o INSS, na contestação, invocou a Súmula nª 343 do Supremo Tribunal Federal. A especificação da norma jurídica da qual se extraem os efeitos pretendidos não é exigida pelo CPC, porque cabe ao juiz declarar o direito aplicável à espécie, diante do nexo lógico existente entre os fundamentos de fato e os efeitos jurídicos afirmados pelo autor. Os brocardos jurídicos jura novit curia e da mihi factum, dabo tibi jus são aplicáveis à ação rescisória, desde que as consequências jurídicas extraídas dos fatos narrados na inicial amoldem-se a uma das hipóteses previstas no art. 485 do CPC. Neste sentido, já decidiu este Tribunal:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. PROCEDÊNCIA DA RESCISÓRIA POR FUNDAMENTOS DIVERSOS. VIOLAÇÃO AO ART. 128 DO CPC. INEXISTÊNCIA. APLICAÇÃO DOS BROCARDOS JURA NOVIT CURIA E DA MIHI FACTUM DABO TIBI JUS.
1. Os brocados jurídicos jura novit curia e da mihi factum dabo tibi jus são perfeitamente aplicáveis nas lides rescisórias, sendo irrelevante a circunstância de o demandante ter invocado outro fundamento jurídico. Cabe ao magistrado atribuir o correto enquadramento legal para a causa rescisória, de acordo com as circunstâncias integrantes da causa petendi.
2. Hipótese em que o pedido de rescisão do acórdão rescindendo, com o rejulgamento da causa originária e consequente determinação ao INSS, ora Embargante, de expedição de Certidão de Tempo de Serviço com a inclusão do acréscimo de tempo laborado em condições especiais foi apreciado em seus estritos limites e acolhido por duplo fundamento (violação ao inciso XXXVI do art. 5.º da CF/88 e art. 57, § 5.º, da Lei 8.213/91), não havendo falar em violação ao disposto no art. 128 do CPC.
3. Embargos parcialmente providos para suprir a omissão apontada, sem alteração do resultado do julgamento proferido.
(TRF4, AR 2004.04.01.005152-6, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 19/05/2010)
Assim, é possível apreciar a demanda com fulcro na violação literal de disposição de lei.
Violação a literal disposição de lei
Nos termos do inciso V do artigo 485 do CPC, a sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando violar literalmente disposição de lei.
A ofensa literal a dispositivo de lei está imbricada ao fenômeno de incidência da norma jurídica. A violação pode ocorrer em decorrência da incorreta aplicação do dispositivo legal, quando o julgador identifica erroneamente a norma jurídica incidente sobre o caso concreto, ou da desconsideração de regra que deveria incidir. Também envolve a interpretação do dispositivo legal e o exame da materialização do seu suporte fático. Há violação, assim, tanto na hipótese em que a decisão rescindenda aplica a lei em desacordo com o seu suporte fático, ao qualificar equivocadamente os fatos jurídicos, quanto no caso em que a decisão confere interpretação evidentemente errada ou aberrante à norma. Dessa forma, se o julgado interpreta a norma razoavelmente, isto é, adota uma entre as interpretações possíveis, mesmo que não seja a melhor, não se configura a violação patente à norma jurídica.
A controvérsia jurisprudencial é indicativa de que as decisões dos tribunais, mesmo dissonantes, oferecem interpretação razoável da lei. Não há manifesta violação de norma jurídica, se as decisões adotam um sentido possível, sem cometer um absurdo contra o texto da lei. Por isso, não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais (Súmula nº 343 do STF).
O acórdão rescindendo expendeu a seguinte fundamentação sobre o preenchimento do requisito da carência para a concessão de aposentadoria rural por idade, no caso concreto:
No entanto, no caso, não é possível a formação de uma convicção plena, após a análise do conjunto probatório, no sentido de que, efetivamente, houve o exercício da atividade laborativa rurícola, em regime de economia familiar, como parceira agrícola, em todo o período correspondente à carência.
A partir dos documentos acostados, dos depoimentos das testemunhas, verifica-se que a demandante logrou comprovar que trabalhou na agricultura, em regime de economia familiar, como parceira agrícola, apenas de 17-03-1959 a 31-12-1977 e de 04-04-2006 a 29-07-2012, totalizando 25 anos, 01 mês e 11 dias como segurada especial.
No entanto, como já explicado, será computado para fins de tempo de serviço o tempo rural, sem o recolhimento das contribuições previdenciárias, somente até 31-10-1991, inclusive, o que representa, no caso concreto, o acréscimo de 18 anos, 09 meses e 15 dias de tempo rural, os quais devem ser averbados pelo INSS.
Assim, conquanto a autora tenha preenchido o requisito etário (completou 55 anos em 17-03-2002, pois nascida em 17-03-1947: fl. 12), a carência legalmente exigida é de 126 meses (dez anos e seis meses), considerado o implemento do requisito etário ou de 180 meses (quinze anos), considerada a DER em 2013, nos termos da disposição contida no artigo 142 da Lei n.º 8.213/91, com a redação conferida pela Lei n.º 9.032, de 28-04-1995. No entanto, o preenchimento deste requisito não restou devidamente comprovado nos autos. Isso porque, consoante se vê dos autos, a atividade realizada pela autora na condição de segurada especial ocorreu somente no período de 17-03-1959 a 31-12-1977, durante 18 anos, 09 meses e 15 dias, ora reconhecido, o qual deve ser averbado pelo INSS, não fazendo jus, pois, à concessã
o do benefício de Aposentadoria por Idade Rural. Por tal razão, deve ser reformada em parte a sentença que não lhe concedeu o benefício, para que o INSS proceda à averbação do tempo de atividade rural, em regime de economia familiar, como parceira agrícola, no referido interregno.
Dessa forma, não restou comprovada nos autos a condição de segurada especial da parte autora durante boa parte do período correspondente ao da carência (durante 23 anos), razão pela qual a sentença deve ser mantida, não fazendo jus, portanto, à concessão de aposentadoria por idade rural.
O Superior Tribunal de Justiça apreciou, em julgamento submetido ao rito dos recursos repetitivos, a matéria relativa à comprovação do trabalho rural em número de meses correspondentes à carência, em período imediatamente anterior ao requerimento, para fins de concessão de aposentadoria por idade rural, conforme a regra de transição prevista no art. 143 da Lei nº 8.213/1991. O voto proferido pelo Ministro Mauro Campbell Marques, Relator do REsp 1.354.908/SP, expôs os seguintes fundamentos:
(…)
Constando dos autos início de prova material devidamente corroborado por idônea prova testemunhal, resta atendida a exigência legal de comprovação do labor rural. Neste aspecto, o Tribunal a quo foi enfático ao afirmar que, a segurada, ora recorrida, ao completar a idade mínima exigida, contida na tabela de transição, já havia implementado o requisito carência em virtude do exercício de atividade rural em número de meses superior ao que seria exigível.
Todavia, não é essa, data venia, a melhor interpretação a ser dada ao caso concreto. Isto porque, afastando-se da atividade campesina antes do implemento da idade mínima para a aposentadoria, o segurado especial deixa de fazer jus ao benefício previsto no art. 48 da Lei 8.213/1991.
Nesse tipo de benefício releva justamente a prestação do serviço agrícola às vésperas da aposentação ou, ao menos, em momento imediatamente anterior ao preenchimento do requisito etário, o que não aconteceu.
Em verdade, é relevante o fato de a parte autora ter parado de trabalhar no campo antes de preencher o requisito etário. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no art. 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade como rural, sem ter atendido a regra de carência, não fará jus à aposentadoria rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito.
O art. 143 da Lei 8.213/1991 contém comando de que a prova do labor rural deverá ser no período imediatamente anterior ao requerimento. O termo imediatamente pretende evitar que pessoas, que há muito tempo se afastaram das lides campesinas, obtenham a aposentadoria por idade rural. A norma visa agraciar exclusivamente aqueles que se encontram, verdadeiramente, sob a regra de transição, isto é, trabalhando em atividade rural, quando do preenchimento da idade.
No caso do segurado especial filiado à Previdência Social antes da Lei 8.213/1991, o acesso aos benefícios exige tão somente a comprovação do exercício da atividade rural, nos termos do art. 143. Esse art. 143 é regra transitória, portanto, contém regra de exceção, à qual deve ser dada interpretação restritiva.
Por outro lado, a regra prevista no art. 3º, § 1º, da Lei 10.666/2003 referente à desnecessidade do preenchimento dos requisitos da aposentadoria não se aplica à aposentadoria por idade rural prevista no art. 143 da Lei 8.213/1991.
Não se mostra possível conjugar de modo favorável ao segurado especial a norma do § 1º do art. 3º da Lei 10.666/2003, que permitiu a dissociação da comprovação dos requisitos para os benefícios que especificou: aposentadoria por tempo de contribuição, aposentadoria especial e aposentadoria por idade urbana, as quais pressupõem contribuição.
(…)
A regra, hoje, é assim: no dia em que o segurado especial completar a idade legal deverá ter preenchido o tempo de carência contido na tabela do art. 142 conjugado com o art. 143 da Lei 8.213/1991, para se aposentar.
A despeito de a Constituição Federal de 1988 preconizar um sistema de seguridade social distributivo e de caráter universal, resguardando a uniformidade de direitos entre os trabalhadores urbanos e rurais, mercê da exigência de justiça social, não é possível reconhecer o direito do segurado especial à aposentadoria rural por idade, se afastado da atividade campestre no período imediatamente anterior ao requerimento.
Desse modo, o Tribunal a quo ao assentar 1) que o eventual fato de a parte autora haver parado de trabalhar antes de completar a idade não é óbice à percepção da pretendida aposentadoria, uma vez que não é necessário o preenchimento simultâneo dos requisitos legais e 2) que a perda da qualidade de segurado não mais possui relevância para a concessão do benefício pleiteado, nos termos do art. 3º, § 1º, da Lei 10.666/2003, dissentiu do entendimento do STJ, merecendo reforma.
A tese firmada no Tema nº 642 foi assim redigida:
O segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade. (REsp 1.354.908-SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 9/9/2015, DJe 10/2/2016).
O entendimento expendido no julgado em nada contraria a literalidade e a interpretação sistemática dos artigos 39 e 143 da Lei nº 8.213/1991. O acórdão considerou que o tempo de trabalho rural exercido entre 17-03-1959 a 31-12-1977 não poderia ser considerado para o atendimento do requisito da carência, pois não correspondia ao período imediatamente anterior ao implemento da idade, em 17-03-2002.
Ainda que se admita a interrupção no exercício das atividades rurais durante o período de carência, o segurado especial deve ostentar essa qualidade no momento em que atingiu a idade e cumpriu o tempo de atividade rural equivalente à carência, não se permitindo a dissociação dos requisitos. Dessa forma, se o segurado especial deixa de exercer o trabalho rural quando implementa o requisito etário, sem ter preenchido o requisito da carência, não faz jus à aposentadoria rural por idade.
Conclusão
A ação rescisória deve ser julgada improcedente.
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 10% sobre o valor da causa, com atualização monetária. Todavia, fica suspensa a exigibilidade das verbas de sucumbência, enquanto a autora fizer jus ao benefício da justiça gratuita, observado o disposto no art. 98, § 3º, do CPC.
Em face do que foi dito, voto no sentido de julgar improcedente a ação rescisória.
Des. Federal OSNI CARDOSO FILHO
Relator
Documento eletrônico assinado por Des. Federal OSNI CARDOSO FILHO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9433335v61 e, se solicitado, do código CRC 8F605DAD. | |
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Data e Hora: | 29/07/2018 09:45 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 25/07/2018
AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0000632-18.2016.4.04.0000/RS
ORIGEM: RS 00236634820134049999
RELATOR | : | Des. Federal OSNI CARDOSO FILHO |
PRESIDENTE | : | Desª. Federal Maria de Fátima Freitas Labarrère |
PROCURADOR | : | Dr. RICARDO LUÍS LENZ TATSCH |
AUTOR | : | EROTIDES DOS SANTOS SCHMITT |
ADVOGADO | : | Marivone Hardt Betiollo e outro |
REU | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 25/07/2018, na seqüência 379, disponibilizada no DE de 05/07/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 3ª Seção, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A SEÇÃO, POR UNANIMIDADE, DECIDIU JULGAR IMPROCEDENTE A AÇÃO RESCISÓRIA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal OSNI CARDOSO FILHO |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal OSNI CARDOSO FILHO |
: | Juiz Federal JOSÉ ANTONIO SAVARIS | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Juíza Federal GABRIELA PIETSCH SERAFIN | |
: | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA | |
: | Juiz Federal OSCAR VALENTE CARDOSO | |
: | Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE | |
AUSENTE(S) | : | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
Paulo André Sayão Lobato Ely
Diretor de Secretaria
Documento eletrônico assinado por Paulo André Sayão Lobato Ely, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9447660v1 e, se solicitado, do código CRC 5E21EB9D. | |
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Signatário (a): | Paulo André Sayão Lobato Ely |
Data e Hora: | 25/07/2018 19:06 |
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