A conversão da MP 871/2019 na Lei 13.846/2019 confirmou inúmeras alterações em dispositivos da Lei de Benefícios da Previdência Social (LBPS – Lei nº 8.213/91), com vistas, principalmente, a combater fraudes e irregularidades na concessão de benefícios previdenciários, em especial, o auxílio-reclusão, pensão por morte e aposentadoria rural.

Uma modificação no benefício de auxílio-acidente, porém, chama especial atenção na medida em que altera substancialmente uma hipótese de manutenção da qualidade de segurado. Antigamente, conforme a redação original do art. 15 da Lei 8.213/91, mantinha a qualidade de segurado, independentemente de contribuições e sem limite de prazo, quem estivesse em gozo de benefício.

Com a publicação da Lei 13.846/2019, em 18 de junho de 2019, os beneficiários de auxílio-acidente passaram a ser excluídos dessa regra. A nova redação passou a constar da seguinte forma:

Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:

I – sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício, exceto do auxílio-acidente; (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)

Assim, desde 18/06/2019, quem está em gozo de auxílio-acidente, mas não verteu mais contribuições para o RGPS, não tem mais assegurada a sua qualidade de segurado perante o INSS, restando desabrigado da proteção da Previdência Social. De fato, somente com a efetivação de recolhimentos mês a mês é que o segurado poderá garantir a manutenção desta condição.

Todavia, a dúvida que surge é a seguinte: o que acontece com aqueles segurados que já estavam percebendo auxílio-acidente antes da aprovação da nova Lei? Aos benefícios já concedidos, há direito adquirido ou aplica-se a regra do tempus regit actum?

A manutenção da qualidade de segurado por auxílio-acidente após a Lei 13.846/2019

Conforme já referimos no nosso Blog, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal já asseverou que inexiste direito adquirido a regime jurídico previdenciário, sendo aplicável o princípio do tempus regit actum nas relações previdenciárias. Para a Suprema Corte, portanto, só há que se falar em direito adquirido nas hipóteses em que seu titular preenche todos requisitos previsto no ordenamento jurídico, capaz de habilitá-lo ao seu exercício. Mas o que isso significa no caso concreto?

A nosso ver, nos parece muito difícil que seja aplicada a tese do direito adquirido ao caso do auxílio-acidente. Nessa situação, isso significaria que para aqueles benefícios concedidos antes da vigência da Lei 13.846, isto é, antes de 18/06/2019, nada seria alterado – a qualidade de segurado seria mantida independentemente do recolhimento de contribuições e até o momento em que o benefício eventualmente fosse cessado, entretanto, essa não parece ter sido a intenção do legislador.

Por outro lado, o extremo oposto também é pouco provável que aconteça, isto é, de que a partir do dia 18/06/2019, os segurados em gozo de auxílio-acidente e sem recolher contribuições percam imediatamente a sua qualidade de segurado. Isso significaria deixar o beneficiário sem qualquer proteção social de forma súbita, sem que lhe fosse dado tempo hábil de voltar a contribuir e, assim, manter a sua qualidade de segurado.

Destarte, acreditamos que a resposta para o caso concreto seja o meio-termo. De acordo com a regra geral do art. 15, da Lei 8.213/91, que permaneceu como estava, “o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração” mantém a qualidade de segurado, no mínimo, por 12 meses após a cessação das contribuições. Conforme artigo disponível no nosso Blog, a manutenção da qualidade de segurado poderá se dar pelo prazo de até 36 meses.

Em razão disso, entendemos que aqueles que estiverem em gozo de auxílio-acidente concedido antes da mudança legislativa, sem verter contribuições ao RGPS, deixarão de manter a qualidade de segurado só pela percepção do benefício a partir da publicação da nova Lei, isto é, desde 18/06/2019. Todavia, entendemos também que, a partir desta data, deverão ser contados pelo menos 12 meses para que haja a derradeira perda da qualidade de segurado. Em verdade, isso significa não somente a aplicação do que já é previsto na LBPS, em seu art. 15, inciso I, como também uma garantia mínima ao beneficiário, que poderá se organizar financeiramente para voltar a efetuar recolhimentos.

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