Com o julgamento do Tema 999 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a revisão previdenciária “do momento” é a Revisão da Vida Toda, também conhecida por revisão da vida inteira.
Como é uma demanda crescente para todos nós Previdenciaristas, não poderíamos deixar de esclarecer a tese e também adaptar nosso sistema para realizar os cálculos dos benefícios conforme o entendimento fixado pelo STJ.
Sumário:
1. O que é a Revisão da Vida Toda ou da Vida Inteira?
2. Quem tem direito à Revisão da Vida Toda?
3. Quais os fundamentos da Revisão da Vida Toda?
4. Existe precedente vinculante para a Revisão da Vida Toda?
5. Recursos Repetitivos: precedentes de observância obrigatória
6. É necessário Prévio Requerimento administrativo? Quais os documentos para o ajuizamento?
7. Ocorre decadência na Revisão da vida toda?
8. Como calcular Revisão da Vida Toda no Prev
9. Por que os salários de contribuição são atualizados somente a partir de 10/1964?
10. Por que os primeiros salários de contribuição não aparecem no CNIS?
11. E se não aparece o cálculo da vida toda?
O que é a Revisão da Vida Toda ou da Vida Inteira?
A Revisão da Vida Toda ou da Vida Inteira é uma espécie de revisão que leva em conta todo período contributivo do segurado, ou seja, visa ignorar o marco inicial do PBC em julho de 1994, pois a regra prevista no art. 3º, caput e § 2º, da Lei 9.876/99 se trata de regra de transição, motivo pelo qual deve ser oportunizado ao segurado optar pela forma de cálculo permanente se esta for mais favorável.
Embora a Lei nº 9.7876/99 não tenha previsto expressamente, há que ser entendido que o segurado poderá optar pela regra nova na sua integralidade, ou seja, a média dos 80% maiores salários de contribuição de todo o período em que contribuiu ao sistema e não apenas a partir de julho de 1994.
Quem tem direito à Revisão da Vida Toda?
Tem direito à Revisão da Vida Toda os segurados que recebam ou tenham recebido benefícios previdenciários calculados com base na lei 9.876/99 e que tenham contribuições previdenciárias anteriores a julho de 1994.
O foco deve estar naqueles segurados que tenham as maiores contribuições anteriores a este marco, pois rompendo a barreira inicial do Período Básico de Cálculo (PBC) em julho de 1994 teriam a média da contribuições (salário-de-benefício) maiores do que se apurados conforme a regra geral vigente.
Basicamente:
- Apenas benefícios “pré-reforma” são aptos de serem calculados pela vida toda, uma vez que a EC 103/2019 alterou as regras de cálculo anteriores.
- A data de início do benefício precisa ser igual ou superior a 29/11/1999, data da entrada em vigor da Lei 9.876/99.
- Apenas cálculos que possuam salários de contribuição antes de julho de 1994 podem ser calculados pela vida toda.
É importante ressaltar que os cálculos demonstram que a menor parte dos segurados terá vantagem financeira com o cálculo da revisão da vida toda, isso porque normalmente os trabalhadores vão evoluindo financeiramente com o desenvolvimento de sua carreira, e a revisão da vida toda visa exatamente trazer para o cálculo os salários de contribuição dos primeiros anos da vida profissional, o que contraria a lógica da evolução profissional e remuneratória.
Ainda assim são muitos os casos de vantagem com a revisão, como os exemplos de segurados com expressivas contribuições anteriores a julho de 1994 e de aposentadorias programadas que tiveram aplicação do divisor mínimo no cálculo, sendo que na revisão da vida toda não será aplicado o divisor mínimo.
Quais os fundamentos da Revisão da Vida Toda?
Ao calcular o benefício de aposentadoria, tendo em vista que o segurado filiou-se ao RGPS antes de 29/11/1999, o INSS efetuou o cálculo do benefício de aposentadoria na forma do art. 3º, caput e § 2º, da Lei 9.876/99, considerando no cálculo apenas os salários de contribuição posteriores a julho de 1994 e aplicando o mínimo divisor.
Ocorre que essa metodologia de cálculo não é adequada para alguns casos, pois a regra prevista no art. 3º, caput e § 2º, da Lei 9.876/99 se trata de regra de transição, motivo pelo qual deve ser oportunizado ao segurado optar pela forma de cálculo permanente se esta for mais favorável, com a aplicação da regra do art. 29, I e II da Lei 8.213/91.
Art. 29. O salário-de-benefício consiste:
I – para os benefícios de que tratam as alíneas b e c do inciso I do art. 18, na média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, multiplicada pelo fator previdenciário;
II – para os benefícios de que tratam as alíneas a, d, e e h do inciso I do art. 18, na média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo.
Simples assim, a tese é baseada na aplicação literal dos incisos I e II da lei dos benefícios!
Existe precedente vinculante para a Revisão da Vida Toda?
Sim, o Superior Tribunal de Justiça ao julgar REsp 1.554.596/SC (Tema 999), em julgamento realizado em 11/12/2019, fixou a seguinte tese:
Aplica-se a regra definitiva prevista no art. 29, I e II da Lei 8.213/1991, na apuração do salário de benefício, quando mais favorável do que a regra de transição contida no art. 3o. da Lei 9.876/1999, aos Segurado que ingressaram no Regime Geral da Previdência Social até o dia anterior à publicação da Lei 9.876/1999
Conforme já havíamos antecipado no nosso Blog, a questão submetida a julgamento questionava a possibilidade de aplicação da regra definitiva prevista no art. 29, I e II da Lei 8.213/1991, na apuração do salário de benefício, quando mais favorável do que a regra de transição contida no art. 3º da Lei 9.876/1999, aos Segurados que ingressaram no sistema antes de 26.11.1999 (data de edição da Lei 9.876/1999).
O voto do relator, ministro Napoleão Nunes Maia Filho, foi seguido por unanimidade e é uma verdadeira aula de Direito Previdenciário. Sugiro que reservem alguns minutos para lerem o voto do ministro Napoleão, até mesmo para compreender mais a fundo a matéria.
Recursos Repetitivos: precedentes de observância obrigatória
A revisão da vida toda foi julgada pelo rito dos recursos repetitivos. Isso significa dizer que a mesma terá de ser seguida por todas as instâncias judiciária do país.
A previsão é do art. 927, III do CPC, que estabelece que os juízes e tribunais observarão os acórdão proferidos em recursos extraordinário e especial repetitivos.
Caso um juiz ou tribunal não siga a orientação do precedente vinculante, o recurso contra a decisão poderá inclusive ser provido de forma monocrática na instância superior, ou no caso de Recursos Especiais e Extraordinários, sequer subir para os tribunais superiores.
Portanto, a decisão do STJ no Tema 999 deverá ser seguida por todos os órgãos do Poder Judiciário.
É necessário Prévio Requerimento administrativo? Quais os documentos para o ajuizamento?
Muitos estão preocupados em relação a necessidade de prévio requerimento administrativo para fins de comprovação do interesse processual através da pretensão resistida do INSS antes de ingressar com a demanda judicial de revisão da vida toda.
Mas podemos tranquilizar os colegas que não há necessidade de requerimento administrativo, isso porque se está diante de pedido de revisão de benefício, hipótese em que o prévio requerimento administrativo é dispensado, nos termos do elucidativo julgamento do Tema 350 pelo Supremo Tribunal Federal:
I – A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas; II – A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado; III – Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo – salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração –, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão; […] (grifado)
Assim, resta claro que nas Ação de Revisão da Vida Toda não é necessário o prévio requerimento administrativo para configurar interesse processual, já que era dever do INSS conceder o melhor benefício ao segurado.
Por fim, os documentos básicos para ajuizamento da demanda são os seguintes:
- Cópia do processo administrativo do benefício;
- Carta de concessão com memória de cálculo;
- Identidade e CPF;
- Comprovante de residência;
- Procuração;
- Relatório de cálculo de RMI obtido no sistema.
Ocorre decadência na Revisão da vida toda?
Conforme texto exclusivo sobre o tema, escrito pelo Dr. Yoshiaki Yamamoto, até decisão em contrário, tudo indica que ocorre prescrição e decadência na Revisão da Vida Toda.
A princípio, o julgamento do tema 999 do STJ deixou estabelecido na ementa do julgamento que a revisão seria possível “respeitados os prazos prescricionais e decadenciais“.
É claro que isto foi dito em obiter dictum, ou seja, não desempenhou papel fundamental na argumentação que conduziu o STJ ao entendimento final acerca do mérito da revisão da vida toda, e com base na doutrina dos precedentes poderia se dizer que não tem eficácia vinculante.
Prova disto é que no voto do relator (seguido por unanimidade), a questão não foi enfrentada em nenhum momento, apenas constando na ementa do julgamento.
Por outro lado, infelizmente a jurisprudência do STJ vem caminhando para erigir o equilíbrio financeiro e atuarial como argumento central no debate sobre prazos decadenciais aplicáveis aos benefícios previdenciários, conforme recentes julgamentos dos Temas Repetitivos 966 e 975, que tratavam, respectivamente, do direito ao melhor benefício e se a decadência incide sobre as questões não analisadas expressamente pelo INSS.
Portanto, com o atual panorama da jurisprudência do STJ, e os indícios deixados no julgamento da revisão da vida toda, o prazo decadencial de 10 anos se aplicaria nestes casos, de sorte que os colegas previdenciaristas devem ter cautela no momento da análise que antecede o ajuizamento de eventual ação revisional.
Dica do Prev: o prazo decadencial tem seu início a partir do momento que o segurado recebe a primeira parcela do benefício, data esta que não se confunde com a DIB (que é a data de início do benefício em si, e não do recebimento do benefício).
Como calcular Revisão da Vida Toda no Prev
Conforme ensina o texto do Cofundador do Prev, Dr. Renan Oliveira, mentor da programação geral e especialmente dos nossos programas de cálculo, veja como é simples e prático calcular a revisão da vida no Previdenciarista:
O início do cálculo é como qualquer outro. Você manda o CNIS, exibimos os vínculos, você altera os salários que deseja alterar e manda calcular.
Quando o cálculo está sendo realizado para revisão de um benefício já deferido, é sempre importantíssimo que a data do cálculo seja editada para a data de início do benefício (DIB) que está sendo revisado.
Além de ajustar a data do cálculo para a DIB, os vínculos e os salários de contribuição devem estar devidamente preenchidos, pois é importante que o usuário simule as mesmas condições que ensejaram a concessão do benefício a ser revisado, sendo que a diferença da tese da vida toda é o aproveitamento das contribuições anteriores a julho de 1994.
Nem sempre o extrato do CNIS estará perfeito, ao passo que algumas situações demandarão analise cuidadosa dos vínculos “importados” do CNIS, bem como a devida classificação dos vínculos com seu respectivo tipo de atividade (especial, professor, rural…).
Em boa parte dos casos será necessário estudar o processo administrativo de concessão, pois para simular os mesmos parâmetros de cálculo do benefício em revisão é necessário conhecer como os vínculos foram interpretados e reconhecidos no momento do deferimento administrativo, pois em muitos casos isso difere das informações registradas no CNIS.
Após o lançamento correto dos vínculos e contribuições, o sistema verifica sozinho em quais benefícios é possível o cálculo da vida toda e avisa ao advogado quando é mais vantajoso e quando é menos vantajoso. Você não precisa escolher se quer ou não calcular a vida toda.
Os resultados do cálculo são agrupados por tipo de benefício.
Agora é possível abrir os benefícios para exibir mais informações, quando há vida toda. Quando não há, nada muda.
No benefício fechado, atenção para a RMI correta. O sistema mostra “RMI Inicial” para o cálculo normal e “RMI revisão vida toda” para a RMI da revisão da vida toda.
Ao lado de cada valor, há uma seta mostrando qual é maior e qual é menor e quanto é a diferença de um para outro.
Clicando no benefício ou em “Ver detalhes”, o sistema exibirá maiores informações a respeito de cada cálculo.
Clicando no botão laranjado em cada um deles (“Ver cálculo”), você será apontado para a mesma tela de antes, com os detalhes de cada benefício, podendo gerar relatórios em PDF e petições.
Na tela de Renda Mensal Inicial, você verá os detalhes do cálculo do valor da RMI e demais dados, inclusive os salários, índices e valores corrigidos antes de julho de 1994.
É tudo muito simples e fácil.
Na última tela (“Petições para o benefício”), também como você já sabe se já usa o nosso sistema há algum tempo, poderá ver petições que o nosso sistema indica para o caso concreto.
Abra a petição com os dados do seu cliente e cálculo já preenchidos.
Por que os salários de contribuição são atualizados somente a partir de 10/1964?
A partir da Lei 6.423/77, a correção monetária oriunda de qualquer disposição legal ou negócio jurídico deveria se dar pela ORTN (Obrigação Reajustável do Tesouro Nacional), sendo que esta lei previa que qualquer outro índice previsto em leis anteriores ficaria substituídos pela ORTN.
Ocorre que a ORTN, instituída pela Lei 4.357/64, teve seu primeiro índice divulgado em 10/1964, ocasionando uma ausência de índice aplicável no período anterior a esta data.
Portanto, em virtude desta disposição legal, os salários de contribuição anteriores a 10/1964 carecem de índice de correção monetária aplicável.
Por que os primeiros salários de contribuição não aparecem no CNIS?
Tendo em vista que a revisão da vida toda visa valorizar exatamente as contribuições anteriores a julho de 1994, pode ser que os primeiros vínculos contributivos dos segurados não apareçam.
Isso porque o CNIS do segurado pode conter erros ou falta de informações, que deverão ser sanadas em análise cuidadosa do processo administrativo que ensejou a concessão e demais documentos pertinentes.
Outa razão possível é que o CNIS possui dados dos vínculos empregatícios somente a partir de 1976, relação dos salários de contribuição a partir de 1982 e de contribuintes individuais, facultativos e domésticos somente a partir de 1985.
Antes disso, entre 1973 até 1984, para contribuintes individuais, facultativos e domésticos, caso não tenham em mãos os “carnês” de contribuições, precisarão pesquisar as respectivas “microfichas” para comprovar as contribuições do período.
Assim, quanto mais antiga for as contribuições ou complexo o processo de deferimento, poderá aumentar muito o trabalho “braçal” do advogado, muitas vezes tendo que lançar manualmente as contribuições que serão conhecidas somente após minuciosa pesquisa no processo administrativo de concessão do benefício a qual se está revisando.
E se não aparece o cálculo da vida toda?
Se você não está vendo o cálculo da vida toda em algum benefício, é porque provavelmente o cálculo não é viável.
Atente-se para as premissas da revisão da vida toda:
- Apenas benefícios “pré-reforma” são aptos de serem calculados pela vida toda, uma vez que a EC 103/2019 alterou as regras de cálculo anteriores. Então você não verá benefícios de “regra de transição” ou “pós-reforma” com cálculo da vida toda.
- A data do cálculo precisa ser igual ou superior a 29/11/1999, data da entrada em vigor da Lei 9.876/99.
- Apenas cálculos que possuam salários de contribuição anteriores a julho de 1994 podem ser calculados pela vida toda. Como o cálculo parte do pressuposto que é preciso calcular o benefício usando salários anteriores à julho de 1994, você precisa garantir que esses salários existem.
Conclusão
Para ter sucesso no cálculo, é importantíssimo que os vínculos contributivos lançados no sistema sejam os mesmos dos períodos reconhecidos ou que a demanda pretende reconhecer no processo. Não se pode simplesmente confiar em todas informações do CNIS para concluir o cálculo, até porque os dados dos salários de contribuição só passaram a compor o extrato a partir do ano de 1982.
Qualquer calculadora precisa dos dados certos para chegar ao resultado correto!
É importante lembrar que o Prev automatiza quase todo o processo de cálculos e petições previdenciárias, mas a máquina ainda precisa do olho atento do advogado. É importantíssimo verificar os dados que estão sendo informados antes de calcular. Isso porque a palavra final é sempre do advogado, que é quem conhece o direito do seu cliente.
Bom trabalho à todos e espero que nosso sistema possa ajudá-los também nesta verdadeira oportunidade chamada Revisão da Vida Toda!
Deixe um comentário